sábado, 17 de outubro de 2020

Sepsis and the Obesity Paradox: Size Matters in More Than One Way

 

Nikhil Jagan, Lee E Morrow, Ryan W Walters, Robert W Plambeck, Tanner J Wallen, Tej M Patel, Mark A Malesker.

 

Crit Care Med 2020, 48(9):e776-e782.

https://journals.lww.com/ccmjournal/Abstract/2020/09000/Sepsis_and_the_Obesity_Paradox__Size_Matters_in.32.aspx

 

Embora pacientes obesos sejam portadores de maior número de comorbidades clínicas, há cenários em que, paradoxalmente, sua mortalidade é reduzida em comparação a pacientes não obesos. O racional é que a inflamação crônica em contexto de obesidade levaria a uma resposta do hospedeiro menos exacerbada em relação à infecção, cursando com menos dano endotelial e disfunção orgânica associada. Este estudo com desenho retrospectivo tinha o objetivo de avaliar se o paradoxo da obesidade realmente existe em pacientes internados por sepse e, caso ele exista, ajustar para a gravidade da doença. Foram incluídos pacientes de seis hospitais em Omaha, EUA, de 2015 a 2018. Do total de 11.859 pacientes identificados no recrutamento, foram incluídos na análise 7.967, sendo os principais motivos para exclusão dados faltantes (principalmente dosagem de lactato) e internação subsequente por sepse. O desfecho principal foi mortalidade avaliada de acordo com a categoria de IMC: abaixo do peso (IMC < 18,5), peso normal (IMC 18,5-24,9), sobrepeso (IMC 25-29,9) e obesidade (IMC > 30). Os pacientes obesos eram mais jovens (média de 64 vs. a 71 anos), tinham maior prevalência de diabetes mellitus (49% vs. 22%) e maior níveis séricos de creatinina.

A mortalidade geral do estudo foi de 12,1%, havendo menor mortalidade nos pacientes obesos (9% vs. 15%). Com relação à estratificação por gravidade, foram escolhidas dosagem de lactato e pressão arterial média (PAM) por serem metas de ressuscitação estabelecidas pelo Surviving Sepsis Campaign. O benefício de menor mortalidade entre os obesos se sustentou apenas nos grupos de pacientes com PAM acima de 65 mmHg, independentemente do nível de lactato (acima ou abaixo de 2). Além disso, quando comparados pacientes com obesidade e outras categorias de IMC, o ponto de corte de lactato acima de 5 mmol/L também mostra ausência de diferença de mortalidade. No subgrupo de pacientes que internou na UTI (63,2% da amostra), a mortalidade foi de 15,5% e o mesmo resultado de menor mortalidade em obesos foi encontrado. Outro critério para avaliação da gravidade foi o escore APACHE III. Esta análise foi possível em 844 pacientes, mostrando ausência de diferença quanto à redução de mortalidade entre as categorias de IMC. No Clube de Revista, foram discutidos os seguintes pontos:

        Entre os pontos fortes do estudo, destacam-se o grande tamanho amostral e estabelecimento de variáveis preditoras de desfecho (lactato, PAM, APACHE III e categorias de IMC) previamente ao início do recrutamento;

        Observa-se ausência de avaliação dos medicamentos em uso pelos pacientes, bem como variabilidade do peso e outros aspectos do estado nutricional prévio;

        A avaliação pelo escore APACHE III parece ser o mais fidedigno para ajuste pela gravidade, considerando que o mesmo inclui múltiplas variáveis. Embora com perda significativa de pacientes por falta de dados, o número de 844 pacientes parece adequado para tal análise, que não mostra redução da mortalidade em pacientes obesos;

        Outro ponto considerado foi o lactato como variável isolada da admissão. Dependendo da agressividade do tratamento da infecção, sabe-se que os valores de lactato nas primeiras 6 horas do manejo são importantes em caráter evolutivo, e não apenas uma medida isolada. Da mesma forma, a medida pontual da PAM na admissão parece não ser adequada para estabelecer de forma tão decisiva o prognóstico. 

 

Pílula do Clube: Embora o IMC seja um preditor de mortalidade em pacientes sépticos, o ajuste pela gravidade da doença faz com que esse efeito de menor mortalidade em obesos desapareça. Nota-se, portanto, que, se o paradoxo da obesidade realmente existe neste cenário, as interações com fatores confundidores são complexas e devem ser consideradas, não sendo possível apenas assumir a existência de simples associação entre IMC e mortalidade.

 

Discutido no Clube de Revista de 14/09/2020.

Effect of Diet versus Gastric Bypass on Metabolic Function in Diabetes

Mihoko Yoshino, Brandon D. Kayser, Jun Yoshino, Richard I. Stein, Dominic Reeds, J. Christopher Eagon, Shaina R. Eckhouse, Jeramie D. Watrous, Mohit Jain, Rob Knight, Kenneth Schechtman, Bruce W. Patterson, and Samuel Klein.

 

N Engl J Med 2020; 383:721:32.

https://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMoa2003697

 

O tratamento cirúrgico da obesidade e seus efeitos metabólicos tem sido alvo da investigação científica nas últimas décadas. Considerando o bom controle glicêmico e a expressiva remissão que pacientes com diabetes tipo 2 (DM2) apresentam após serem submetidos à cirurgia bariátrica, muitos estudos sugerem que procedimentos que alteram o trânsito gastrointestinal, como o bypass gástrico em Y-de-Roux, tem vantagens terapêuticas únicas quando comparado ao tratamento clínico e farmacológico do diabetes. Porém, até hoje não há evidências de boa qualidade que confirmem se os efeitos do bypass gástrico nos principais fatores metabólico envolvidos na fisiopatologia do DM2  se devem ao procedimento cirúrgico independentemente da perda de peso observada nessa população de pacientes. Assim, o presente estudo foi delineado com o objetivo de comparar os efeitos da perda de peso acentuada induzido pelo bypass gástrico com os efeitos da mesma perda de peso induzida por dieta hipocalórica na sensibilidade insulínica hepática (desfecho primário) e na sensibilidade insulínica do tecido adiposo e muscular, resposta metabólica ao teste de refeição mista, função de células beta, e parâmetros laboratoriais de 24 horas (glicemia, insulina e ácidos graxos livre) e composição corporal (desfechos secundários).

Os pacientes foram recrutados entre novembro de 2014 e outubro de 2018 em um único centro em St Louis, Louisiana, Estados Unidos. Dos 33 pacientes considerados elegíveis, um total de 11 pacientes foi submetido a dieta hipocalórica e 11 pacientes submetidos ao bypass gástrico. Previamente às intervenções e após alcançarem a estabilidade de uma média de 18% de perda de peso corporal após a intervenção, os pacientes foram submetidos a diversos testes padronizados: análise de composição corporal (por densitometria de corpo total e espectroscopia por ressonância magnética), estimativa de gasto energético basal, clamp euglicêmico hiperinsulinêmico de três fases, teste metabólico de refeição mista, coleta de 24h de parâmetros laboratoriais (dosagens séricas de glicemia, insulina, peptídeo C, ácidos graxos livres) e amostra de fezes para análise de microbiota.

Analisando os resultados, a perda de peso foi associada a um aumento na supressão da produção de glicose endógena comparada ao baseline de 7,04 µmol por quilo de massa magra por minuto (IC95% 4,74 a 9,33) no grupo dieta e de 7,02 µmol por quilo de massa magra por minuto (IC95% 3,21 a 10,84) no grupo bypass durante a primeira fase do clamp e de 5,39 e 5,37 nos dois grupos, respectivamente, durante a segunda fase do clamp – não houve diferença significativa entre os grupos. Já em relação à variação de sensibilidade insulínica no tecido muscular, a perda de peso foi associada a um aumento de eliminação de glicose estimulada por insulina de 30,5 ± 15,9 para 61,6 ± 13,0 µmol por quilo de massa magra por minuto no grupo dieta e de 29,4 ± 12,6 para 54,5 ± 10,4 µmol por quilo de massa magra por minuto no grupo bypass – sem diferença estatisticamente relevante entre os grupos. A perda de peso aumentou a função de célula-beta (avaliada pela secreção insulínica em relação a sensibilidade insulínica) em 1,83 unidades (IC95% 1,22 a 2,44) no grupo dieta e em 1,11 unidades (IC95% 0,08 a 2,15) no grupo bypass – também sem diferença entre os grupos. Também houve a diminuição das áreas sob a curva para medidas de glicemia e níveis de insulina em 24 horas em ambos os grupos, sem diferença significativa. Não ocorrem complicações graves em nenhum dos grupos ao longo do estudo. Os seguintes pontos foram discutidos no Clube:

       Apesar do estudo ser bem elaborado e dispendioso quanto aos métodos utilizados para aferir os desfechos metabólicos, não houve randomização e o estudo não alcançou o n de 18 participantes em cada grupo segundo o cálculo de tamanho amostral;

       Estudo apresentou altas taxas de perda e apresenta número de participantes faltantes no grupo bypass nas tabelas e gráfico de resultado apresentadas, não deixando claro quantos e porque participantes foram excluídos das análises;

       Diversos detalhes em relação ao delineamento e à condução do estudo só estão claros quando acessado o material suplementar, deixando o artigo original de certa forma incompleto;

       Apesar da cirurgia não ter se mostrado superior ao grupo dieta quando controlada a perda de peso, o tratamento cirúrgico ainda é uma opção importante a ser considerada quando pensamos em perda ponderal a longo prazo.

 

Pílula do Clube: Apesar de não ter alcançado o tamanho amostral previsto, o estudo avaliou rigorosamente desfechos metabólicos envolvidos na patogênese do DM2 e encontrou benefícios quase idênticos na melhora de sensibilidade insulínica após perda de peso induzida por bypass gástrico quando comparada à mesma perda ponderal induzida por dieta hipocalórica.

 

Discutido no Clube de Revista de 31/08/2020. 

Effect of Ascorbic Acid, Corticosteroids, and Thiamine on Organ Injury in Septic Shock - The ACTS Randomized Clinical Trial

 Ari Moskowitz, David T. Huang, Peter C. Hou, Jonathan Gong, Pratik B. Doshi, Anne V. Grossestreuer, Lars W. Andersen, Long Ngo, Robert L. Sherwin, Katherine M. Berg, Maureen Chase, Michael N. Cocchi, Jessica B. McCannon, Mark Hershey, Ayelet Hilewitz, Maksim Korotun, Lance B Becker, Ronny M Otero, Junior Uduman, Ayan Sen, Michael W. Donnino, for the ACTS Clinical Trial Investigators

 

JAMA 2020, 324(7):642-650.

https://jamanetwork.com/journals/jama/article-abstract/2769467

 

A sepse é importante causa de morte em doentes hospitalizados. Tratamentos alternativos são investigados com o intuito de redução de mortalidade. Trata-se de um ensaio clínico randomizado, cego, multicêntrico e controlado por placebo que tinha como objetivo principal avaliar o impacto da administração combinada de hidrocortisona, tiamina e vitamina C (combo) na evolução de disfunções multiorgânicas (avaliado pelo acompanhamento do escore SOFA – Sequential Organ Failure Assessment) e como desfecho secundário mortalidade em 30 dias. Foram incluídos pacientes com idade superior a 18 anos, com infecção e sepse presumida e necessidade de vasopressor (tempo médio de administração do combo foi de 13,5 horas após início do vasopressor). O cálculo amostral foi feito com a expectativa de variação em dois pontos do escore SOFA, poder de 99% e erro de 5%, o que determinou uma amostra de 200 indivíduos. Este poder do estudo era drasticamente reduzido para desfechos secundários. Pacientes que recebiam previamente corticoide foram excluídos.

Após a randomização, 99 pacientes receberam o combo (por 4 dias) e 96 pacientes receberam placebo. Pacientes que receberam apenas uma dose do combo foram incluídos. Os autores não foram capazes de demonstrar uma diferença significativa na evolução do escore SOFA e nem da mortalidade em 30 dias na população estudada. Não ocorreram significantes efeitos adversos atribuíveis ao combo. Os autores concluem por ausência de benefício na utilização do combo em doentes com sepse grave em termos de disfunção orgânica e mortalidade. Durante Clube de Revista, os seguintes pontos foram discutidos:

       Este estudo é o segundo estudo neste ano que demonstra ausência de benefício na utilização deste combo em sepse grave, e está alinhado com a maioria dos estudos com desenhos adequados publicados mais recentemente e que estudam esta terapia;

       Algumas limitações do estudo foram apontadas: a exclusão de doentes com uso prévio de corticoide pode ter determinado um viés, pois estes doentes poderiam ter maior potencial para benefício para esta terapia; um grande número de pacientes foi selecionado, mas não randomizados, o que potencialmente reduz a generalização; o tempo para administração do combo foi em média 13,5 horas após do vasopressor e um tempo mais curto poderia determinar melhor desfecho; alguns pacientes do grupo intervenção não receberam as 4 doses do combo; o estudo não teve poder para detectar pequenas variações na mortalidade.

 

Pílula do Clube: apesar das limitações este é melhor estudo que avaliou se adição de reposição de vitaminas associadas a corticoide no tratamento da sepse muda desfechos clínicos, não demonstrando benefício.

 

Discutido no Clube de Revista de 24/08/2020.

Effect of High-Dose vs Standard-Dose Vitamin D Supplementation in Pregnancy on Bone Mineralization in Offspring Until Age 6 Years A Prespecified Secondary Analysis of a Double-Blinded, Randomized Clinical Trial

 

Nicklas Brustad, Juri Garland, Jonathan Thorsen, Astrid Sevelsted, Martin Krakauer, Rebecca K. Vinding, Jakob Stokholm, Klaus Bønnelykke, Hans Bisgaard, Bo L. Chawes.

 

JAMA Pediatrics 2020, published online February 24.

https://jamanetwork.com/journals/jamapediatrics/article-abstract/2761808

 

            A deficiência de vitamina D vem aumentado nos últimos tempos devido a mudanças no estilo de vida e hábitos alimentares. Sabe-se da sua importância na mineralização óssea, a qual se inicia no período fetal e atinge seu pico de massa óssea na vida adulta, sendo o status mineral ósseo relacionado com risco de fraturas na infância, além de determinar risco futuro de osteoporose. Vários estudos vêm tentando correlacionar o impacto do status de vitamina D em gestantes com a antropometria e mineralização óssea de sua prole, porém os resultados apresentados são contraditórios. Sendo assim, o presente estudo teve como objetivo investigar se há correlação entre suplementação de vitamina D em altas doses (2800 ui/dia vs. 400 ui/dia)  em gestantes com antropometria e densidade mineral óssea de sua prole.

            O estudo é um ensaio clínico randomizado, duplo-cego, no qual a suplementação foi feita entre 24a semanas de idade gestacional até 1a semana pós-parto e a amostra selecionada foi obtida da coorte Dinamarquesa COPSAC2010 (Copenhagen Prospective Studies on Asthma in Childhood 2010). Além disso, foi realizado um ensaio de desenho fatorial 2x2 com 2,4 g/dia de LCPUFAS (ácidos graxos poli-insaturados de cadeia longa). O desfecho primário inicial do estudo foi a incidência de asma na prole. A análise de mineralização óssea foi um desfecho secundário pré-especificado. Os dados de peso e nascimento ao nascer foram obtidos através de relato dos pais e validado pelo registro de nascimento. No período fetal foram analisadas as ecografias gestacionais e após o nascimento os dados antropométricos foram colocados nas curvas da OMS. Estas avaliações foram realizadas com 1 semana, 1 mês, 3 meses, 6 meses, semestral até os 3 anos e depois anual até os 6 anos de idade. A densitometria óssea (DXA) foi realizada aos 3 e 6 anos e forneceu dados sobre massa magra, massa gorda e óssea, sendo esta feita de corpo total, cabeça e corpo total exceto cabeça (TBLH). As imagens das DXA foram validadas por radiologista experiente. Em relação às fraturas os dados foram obtidos pela informação dos pais e revisão de prontuário, sendo o risco de fraturas adicionado como análise post hoc.

            As gestantes foram randomizadas na razão 1:1. No grupo intervenção houve um n total de 294 mães com 297 crianças, sendo que todas estas tinham pelo menos 1 avaliação de antropometria e 262 tinham avaliação aos 6 anos; deste total de crianças 119 tinham DXA qualificáveis aos 3 anos e 187 aos 6 anos. No grupo placebo houve um n total de 286 mães com 287 crianças e todas estas também tinham pelo menos 1 avaliação antropométrica e 255 tinham avaliação aos 6 anos; deste total de crianças 125 tinham DXA aos 3 anos e 196 aos 6 anos.

            Ao serem analisados os dados, não se observou diferença estatisticamente significativa entre o grupo intervenção e o placebo em relação aos dados antropométricos ao nascimento e até os 6 anos de idade, nem mesmo houve correlação com o uso de LCPUFAS. Em relação à avaliação com DXA aos 3 anos de idade, o grupo intervenção apresentou maior conteúdo mineral ósseo (BMC) de TBLH (P=0,05) e de corpo total (P=0,04), sendo a maior diferença observada entre crianças nascidas de mães com níveis insuficientes de 25-OH-vitamina D pré-intervenção vs suficientes (P=0,03). Na avaliação de DXA aos 6 anos de idade, as crianças do grupo intervenção tiveram maior BMC de TBLH (P=0,03), de corpo total (P=0,01) e de cabeça (P=0,03); além de maior densidade mineral óssea (BMD) de corpo total (P=0,04) e de cabeça (P=0,01); assim como na avaliação aos 3 anos de idade, os efeitos foram maiores naquelas crianças filhas de mães com deficiência de 25-OH-vitamina D pré-intervenção (BMC total - P=0,02 e BMD total P=0,04). Também foi investigada a possibilidade de interferência da estação do ano na data do nascimento dessas crianças e foi visto que as crianças que nasciam no inverno tinham um maior efeito na BMD da cabeça. Em relação às fraturas, se observou uma menor tendência nas crianças do grupo intervenção vs placebo (7% vs 11% - P=0,08), mas não houve diferença entre os filhos de mães com deficiência prévia de 25-OH-vitamina D. No Clube foram discutidos os seguintes pontos:

                   O estudo tem como principal limitação o fato de ter sido desenhado inicialmente para outro desfecho (influência da suplementação de vitamina D em gestantes no risco de asma da prole) ao invés da influência da vitamina D na mineralização óssea;

                   Outro fator importante levantado foi o pequeno número de DXA com imagem de qualidade a serem analisados;

                   O estudo foi feito com a população dinamarquesa, em que a incidência de sol é menor, por isso deve-se ter cautela em sua interpretação em outros países como o nosso;

                   Apesar de ter sido feito acompanhamento com DXA até os 6 anos de idade, não sabemos o verdadeiro impacto do pico de massa óssea que é na vida adulta.

 

Pílula do Clube: apesar das limitações e falhas do estudo, o estudo mostrou que a suplementação de vitamina D em altas doses nas gestantes no terceiro trimestre (período de maior desenvolvimento ósseo do feto) mostrou uma melhora no BMC e BMD de sua prole, porém sem nenhum impacto na antropometria dessas crianças. No entanto, é preciso ter cautela ao extrapolar esses resultados para outros países e populações.

 

Discutido no Clube de Revista de 17/08/2020

Dexamethasone in Hospitalized Patients with COVID-19 – Preliminary Report

RECOVERY Collaborative Group, Peter Horby, Wei Shen Lim, Jonathan R Emberson, Marion Mafham, Jennifer L Bell, Louise Linsell, Natalie Staplin, Christopher Brightling, Andrew Ustianowski, Einas Elmahi, Benjamin Prudon, Christopher Green, Timothy Felton, David Chadwick, Kanchan Rege, Christopher Fegan, Lucy C Chappell, Saul N Faust, Thomas Jaki, Katie Jeffery, Alan Montgomery, Kathryn Rowan, Edmund Juszczak, J Kenneth Baillie, Richard Haynes, Martin J Landray

 

N Engl J Med 2020 Jul 17;NEJMoa2021436.

https://www.nejm.org/doi/10.1056/NEJMoa2021436?url_ver=Z39.88-2003&rfr_id=ori:rid:crossref.org&rfr_dat=cr_pub%20%200pubmed

 

Trata-se de ensaio clínico randomizado (ECR) em 176 centros do Reino Unido, que incluiu pacientes hospitalizados com suspeita ou confirmação de COVID-19, que foram randomizados numa proporção 2:1 para controle (tratamento padrão) ou intervenção (tratamento padrão + dexametasona 6mg/dia EV ou VO por 10 dias ou até a alta hospitalar). Para um poder de 90% para detectar diferença absoluta de mortalidade de 4% e redução proporcional da mortalidade de 20% eram necessários 2.000 pacientes no grupo da dexametasona e 4.000 no grupo controle. Foram estabelecidas análises de subgrupo previamente à análise estatística, que foi realizada por intenção de tratar. Dos 11.303 pacientes recrutados, 6.425 foram randomizados: 2.104 para intervenção e 4.321 para controle. Sua idade era de 66,1±15,7 anos. Pacientes que receberam apenas oxigenioterapia eram aproximadamente 60% em cada grupo e os que foram submetidos à ventilação mecânica em torno de 15%. Do grupo intervenção, 95% receberam dexametasona e do grupo controle 8% também receberam o corticoide. O desfecho primário foi mortalidade por qualquer causa em 28 dias, sendo que 99,9% dos pacientes completaram seguimento para tal análise.

O estudo mostrou redução geral da mortalidade (HR 0,83; IC95% 0,75 a 0,93; P<0,001) com NNT (número necessário para tratar) de 33. Não houve redução de mortalidade nos pacientes que não precisaram de oxigenioterapia; naqueles que utilizaram oxigênio, houve redução absoluta de mortalidade de 4,2% (HR 0,82; IC95% 0,72 a 0,94; NNT de 20). Os pacientes submetidos à ventilação mecânica invasiva tiveram redução absoluta de mortalidade de 12,3% com NNT de 8 (HR 0,64; IC95% 0,51 a 0,81). Pacientes que utilizaram dexametasona e que necessitaram de oxigênio tiveram mais alta hospitalar em 28 dias: 72% no grupo dexametasona vs. 67,4% no controle para aqueles em oxigenioterapia (HR 1,15; IC95% 1,06 a 1,24) e 33% no grupo dexametasona vs. 23,3% no controle para aqueles em ventilação mecânica invasiva (HR 1,48; IC95% 1,16 a 1,9). O desfecho composto necessidade de intubação e/ou mortalidade entre aqueles que não estavam em ventilação mecânica no momento da randomização também foi menor no grupo dexametasona (HR 0,87; IC95% 0,79 a 0,96) nos pacientes que receberam oxigenioterapia, ao passo que não houve diferença para os pacientes que não fizeram uso de oxigênio. No Clube de Revista, foram discutidos os seguintes pontos:

·         Entre os pontos fortes do estudo, destacam-se o fato de ser um ECR com grande tamanho amostral e uma intervenção relativamente simples e reprodutível;

·         Em termos de crítica, nota-se a ausência de controle por placebo, embora tal fato possa ser explicado pela factibilidade da execução em contexto de pandemia global. Além disso, os pacientes e os pesquisadores não eram cegados, justamente devido à ausência de placebo;

·         Outra crítica se refere à ausência da análise de efeitos colaterais importantes;

·         Uma observação também pode ser feita a respeito de mais pacientes jovens serem submetidos à ventilação mecânica. Tal fato pode ser explicado especulativamente como pacientes mais jovens sendo selecionados para internação na UTI em contexto de recursos limitados, bem como maior perspectiva desses pacientes se recuperarem em comparação a pacientes mais idosos.

 

Pílula do Clube: O benefício da dexametasona em redução da mortalidade em pacientes hospitalizados com COVID-19 parece ser sustentado para os que estão em uso de oxigenioterapia, especialmente aqueles em ventilação mecânica invasiva e com mais de 7 dias do início dos sintomas.

 

Discutido no Clube de Revista de 10/08/2020.


sexta-feira, 16 de outubro de 2020

Serial Bone Density Measurement and Incident Fracture Risk Discrimination in Postmenopausal Women

 Carolyn J. Crandall, Joseph Larson, Nicole C.Wright, Deepika Laddu, Marcia L. Stefanick, Andrew M. Kaunitz, Nelson B.Watts, JeanWactawski-Wende, Catherine R.Womack, Karen C. Johnson, Laura D. Carbone,MD, Rebecca D. Jackson, Kristine E. Ensrud.

 

JAMA Intern Med 2017, published online July 27.

https://jamanetwork.com/journals/jamainternalmedicine/article-abstract/2768888

 

A avaliação da densidade mineral óssea (DMO) é indicada em todas as mulheres com mais de 65 anos. No entanto, não existem recomendações quanto ao intervalo para a repetição do exame e, além disso, questiona-se se essa reavaliação permite estimar o risco de fratura osteoporótica. Este estudo visa avaliar se repetir a DMO três anos depois de uma avaliação basal melhora a chance de predizer risco de fratura em mulheres pós menopáusicas. Para este estudo observacional, foram usados os dados do Women’s Health Initiative (WHI) Study, um estudo de coorte prospectivo com mulheres pós menopáusicas entre 50-79 anos. O WHI Bonedensity Substudy contava com 7.419 participantes de 3 centros dos Estados Unidos acompanhadas de 1993 a 2010. Os desfechos primários eram fratura de quadril e fraturas osteoporóticas maiores (MOF - quadril, coluna vertebral, radio, ulna, punho, braço ou ombro). As fraturas eram autorrelatadas através de questionários. Foram avaliados também a densidade mineral óssea (BMD) basal e sua mudança absoluta, sendo calculada AU-ROC para BMD basal, mudança absoluta e associação de ambos para discriminar o risco de fratura durante o seguimento.

A idade média dos participantes foi de 66 anos, sendo 77% raça branca com uma média de IMC 28,7. Durante o seguimento (média 9,0 ± DP 3,5 anos), 139 mulheres (1,9%) apresentaram fratura de quadril e 732 (9,9%) apresentaram MOF. Na discriminação de mulheres que fraturaram o quadril das que não fraturaram os valores AU-ROC foram de 0,71 (IC95% 0,67-0,75) para BMD basal no fêmur total; 0,61 (IC95% 0,56-0,65) para mudança BMD fêmur total; e 0,73 (IC95% 0,69-0,77) para combinação de ambos. Para MOF, os valores AU-ROC foram de 0,61 (IC95% 0,59-0,63) para BMD basal no fêmur total; 0,53 (IC95% 0,51-0,55) para mudança BMD fêmur total; e 0,61 (IC95% 0,59-0,63) para combinação de ambos. A massa óssea da cabeça do fêmur e da coluna lombar teve resultados semelhantes. Associação entre alterações na BMD e risco de fratura não diferiu por subgrupos de diferentes idades, raça, IMC, T score basal ou presença de diabetes. Durante o Clube de Revista foram discutidos os pontos a seguir:

·         No presente estudo havia poucas mulheres tabagistas e com T score basal mais prejudicado. Apesar de não podermos generalizar os resultados para toda a população, podemos utilizá-los como guia para grande parte dos pacientes;

·         Estudos anteriores já haviam demonstrado esta falta de benefício na repetição da DMO a curto prazo. Porém, na prática clínica, ainda nos deparamos com exames sendo repetidos desnecessariamente, sendo importante a conscientização médica quanto a isso.

 

Pílula do Clube: repetir a densitometria óssea 3 anos após uma avaliação inicial não parece melhorar a predição do risco de fraturas em mulheres pós menopáusicas. Dessa forma, os recursos financeiros devem ser utilizados para priorizar avaliação densitométrica basal.

 

Discutido no Clube de Revista de 03/08/2020.

Efficacy and safety of corticosteroids in COVID-19 based on evidence for COVID-19, other coronavirus infections, influenza, community-acquired pneumonia and acute respiratory distress syndrome: a systematic review and meta-analysis

 Zhikang Ye, Ying Wang, Luis Enrique Colunga-Lozano, Manya Prasad, Wimonchat Tangamornsuksan, Bram Rochwerg, Liang Yao, Shahrzad Motaghi, Rachel J. Couban, Maryam Ghadimi, Malgorzata M. Bala, Huda Gomaa, Fang Fang, Yingqi Xiao, Gordon H. Guyatt

 

CMAJ 2020, 192(27):E756-E767

https://www.cmaj.ca/content/192/27/E756.long

 

Uma nova pandemia global que surgiu na China em 2019, causada por uma espécie de coronavírus (SARS-CoV-2) se caracteriza como uma síndrome gripal que pode cursar com insuficiência respiratória grave e causar morte, COVID-19. Uma vez caracterizada a necessidade de admissão na UTI, um conjunto de terapias essencialmente de suporte é adotado para oferecer suporte multiorgânico. Entretanto, a utilização de corticoide parece ser associada a melhor desfecho em doentes que demonstram hipoxemia. Esta revisão sistemática com metanálise tem por objetivo avaliar o efeito da utilização de corticosteroide em COVID-19. É importante frisar que este estudo foi conduzido antes do “Recovery Study”, que sugeriu benefício do uso de dexametasona em subgrupo de pacientes. Os autores conduziram esta revisão sistemática com estudos que avaliaram o impacto do uso de corticoide em síndromes respiratórias graves, independentemente de serem ou não secundárias ao SARS-CoV-2. Definiram síndrome da angústia respiratória aguda (SARA) de acordo com a definição de Berlin e COVID-19 de acordo com a definição da organização mundial da saúde (OMS). Dentre os cenários determinantes de SARA os autores incluíram COVID-19, MERS (Middle East respiratory syndrome), SARS (Severe Acute Respiratory Syndrome), influenza e pneumonia comunitária grave. A estratégia de busca incluiu as bases MEDLINE, Embase, Pubmed, Cochrane, medRxiv, além de base de dados chinesas (CNKI, CQVIP, ChinaXiv). Foram incluídos estudos randomizados e controlados, coortes observacionais e estudos de caso-controle. Para cada um dos cenários clínicos determinantes de SARA foi apresentado o resultado da busca, o forest plot e o GRADE.

Nesta revisão, estudos especificamente conduzidos para estudar o impacto de corticoide em COVID-19 foram escassos (três estudos). As conclusões referentes ao impacto da utilização de corticoide eram então chamadas diretas (minoria) e indiretas (maioria). A administração deste medicamento foi associada a redução de mortalidade em SARA causada por situações não relacionadas a infecção viral (SARS, MERS e COVID) e pior em casos de influenza. Durante o Clube de Revista, os seguintes pontos foram discutidos:

       A qualidade dos estudos incluídos na revisão sistemática foi classificada como baixa ou muito baixa, logo estes dados não permitem uma conclusão definitiva sobre efeito de corticoide em COVID-19 com SARA;

       Apesar dos autores terem feito uma busca ampla, o fato de haver estudos em andamento que irão avaliar esta pergunta deixam uma dúvida da necessidade de fazer uma revisão sistemática neste momento.

 

Pílula do Clube: Embora esta revisão sistemática com metanálise tenha sido metodologicamente bem conduzida, apresenta cenários de grande heterogeneidade que esvaziam qualquer conclusão deste estudo.

 

Discutido no Clube de Revista de 27/07/2020.

sábado, 8 de agosto de 2020

Ultrasonographic and clinical parameters for early differentiation between precocious puberty and premature thelarche

Liat de Vries, Gadi Horev, Michael Schwartz, and Moshe Phillip


European Journal of Endocrinology 2006, 154:891–898

https://eje.bioscientifica.com/view/journals/eje/154/6/1540891.xml

 

A puberdade precoce muitas vezes confunde-se com a telarca prematura (TP), uma variante pubertal da normalidade, que não está associada com aceleração do crescimento ou maturação óssea, não requerendo, portanto, tratamento. A distinção entre estas entidades é baseada no exame físico, idade óssea, velocidade de crescimento, e resultados do teste de estímulo com GnRH. Entretanto, em muitos casos o diagnóstico diferencial é difícil, principalmente em crianças obesas, pela possibilidade de pseudotelarca, bem como nos estágios iniciais da puberdade precoce central (PPC) , em que o teste de estímulo com GnRH pode resultar negativo. O objetivo deste estudo diagnóstico foi identificar parâmetros clínicos e ultrassonográficos que auxiliem na distinção entre PPC e TP, além de determinar se as medidas dos ovários e útero por ultrassom têm valor diagnóstico, especialmente quando o teste de estímulo com GnRH for negativo.

Trata-se de estudo prospectivo, que recrutou consecutivamente meninas entre 4 a 8 anos, referenciadas por telarca, incluídas as com estágios de Tanner 2 e 3. Dentre os critérios de exclusão constavam doenças crônicas e status pós-quimio e/ou radioterapia. Todas as pacientes passaram por avaliação clínica, laboratorial (FSH e LH basais e pós-teste de estímulo com GnRH, estradiol, androstenediona e 17-hidroxiprogesterona, 17OHP) e radiológica (radiografia para idade óssea). O padrão-ouro diagnóstico baseou-se em juízo clínico, conforme os critérios descritos a seguir: 

  • Puberdade precoce (PP) foi diagnosticada quando havia broto mamário e pelo menos um dos critérios: menstruação, pelos pubianos, velocidade de crescimento acelerada e avanço de idade óssea acima de 2 desvio-padrão;

  • TP foi diagnosticada quando havia broto mamário, na ausência de pelos pubianos e / ou axilares.

Casos equívocos na primeira avaliação passaram por seguimento de pelo menos 6 meses, com médico experiente cegado para os resultados da ultrassonografia. Foram excluídas outras formas de PP conforme juízo clínico. Todos os diagnósticos foram confirmados após pelo menos 3 anos de seguimento. 

O ultrassom pélvico foi realizado em todos as pacientes pelo mesmo examinador, com bexiga cheia, utilizando transdutor convexo de baixa frequência. Para análise de reprodutibilidade, 15 pacientes foram examinadas duas vezes, por 2 operadores cegados para os diagnósticos, obtendo correlação entre operadores para todos os parâmetros de 0,93 a 0,99 (P<0,001). Os parâmetros de ultrassom avaliados incluíram medidas uterinas (comprimento, diâmetro transverso, espessura endometrial, diâmetro ântero-posterior do fundo e do colo, volume, razão fundo-cervical e área seccional do útero) e ovarianas (altura, largura, número de folículos, diâmetro máximo do maior folículo observado, circunferência e volume).

Avaliou-se também grupo controle com 83 meninas saudáveis, cujos dados ultrassonográficos foram comparados com as médias de meninas saudáveis constando na literatura, bem como com os grupos PP e TP.

Utilizou-se teste ANOVA para comparação entre grupos. Os parâmetros de ultrassom foram comparados entre meninas com PP e TP. Além disso, foi criado subgrupo de pacientes com resposta negativa ao teste de estímulo com GnRH, conforme três diferentes critérios de resposta pré-pubertal (pico LH 5 mIU/ml, pico LH 8 mIU/ml e razão pico LH / pico FSH 1), e realizada comparação entre grupos PP e TP. As variáveis com resultados significativos foram incluídas em um modelo univariado com regressão logística, para identificar quais eram capazes de predizer PP. Foram desenhadas curvas ROC para selecionar pontos de corte ótimos para os parâmetros ultrassonográficos e níveis de androstenediona, calculando para cada variável, através da área sob a curva (ASC) sensibilidade, especificidade, valor preditivo positivo (VPP) e valor preditivo negativo (VPN). P < 0.05 foi considerado significativo.

O n total do estudo foi de 103 pacientes, das quais 66 foram diagnosticadas  com PP na primeira avaliação clínica. Ao fim do acompanhamento, foram diagnosticadas 22 pacientes com TP e 81 pacientes com PP (dentre as quais, 72 receberam tratamento com análogo de GnRH). Esses grupos apresentaram diferenças referentes ao teste de estímulo com GnRH: pico de LH > 5  com sensibilidade de 62% e especificidade de 93,7%; razão entre pico LH / pico FSH > 1 com sensibilidade de 35,8% e especificidade de 100%.

Também se observaram diferenças entre os grupos PP e TP para todos os parâmetros ultrassonográficos uterinos e alguns dos parâmetros ovarianos. No subgrupo de pacientes com resposta pré-pubertal ao teste de estímulo com GnRH, essas diferenças se mantiveram, exceto para a razão fundo-cervical.

Na análise univariada com regressão logística, as variáveis que melhor predisseram PP foram o diâmetro transverso do útero e o volume uterino, com odds ratio (OR), respectivamente, de 1,87 e 1,43, para aumento em cada em 1 mm e 0,1 cm³ nestas variáveis. Dentre os parâmetros ultrassonográficos, o volume uterino > 2 mL foi o que apresentou maiores sensibilidade e especificidade, respectivamente de 88,8% e 89,4%, com VPP de 97,2% e VPN de 65%. Os seguintes pontos foram discutidos no Clube da Revista:

  • O ultrassom pélvico, principalmente referente aos parâmetros uterinos, demonstrou eficiência em diferenciar PP de TP, inclusive quando os testes de estímulo de GnRH eram negativos;

  • O pico de LH (dados não divulgados) não foi tão bom preditor de PP quanto o volume uterino e o diâmetro transverso do útero (OR de 1,87 e 1,43, respectivamente);

  • O volume uterino > 2 mL foi o parâmetro com melhor eficácia diagnóstica, com sensibilidade de 88,8 %, especificidade de 89,4%, VPP de 97,2% e VPN de 65%. As curvas ROC utilizadas para estas estimativas não foram divulgadas;

  • O estudo não detalhou diversas informações relevantes, sem seguir as recomendações da ferramenta STARD. Destacam-se a falta de descrição de cálculo de tamanho amostral e a ausência de imagens ultrassonográficas que permitam compreensão da técnica de aferição destes parâmetros;

 

Pílula do Clube: apesar das falhas acima referidas, este estudo demonstrou que o ultrassom tem eficácia diagnóstica na distinção entre puberdade precoce e telarca prematura. Trata-se de um método de baixo custo e não-invasivo, porém seus resultados são operador-dependente. Novos estudos com maior detalhamento da técnica ultrassonográfica e maior número de participantes poderão definir a validade do método na rotina diagnóstica de pacientes com puberdade precoce.

 

Discutido no Clube de Revista de 20/07/2020.

Remission of Type 2 Diabetes Following a Short-term Intervention with Insulin Glargine, Metformin, and Dapagliflozin

Natalia McInnes, Stephanie Hall, Farah Sultan, Ronnie Aronson, Irene Hramiak, Stewart Harris, Ronald J. Sigal, Vincent Woo, Yan Yun Liu,  and Hertzel C. Gerstein


J Clin Endocrinol Metab 2020, 105(8):dgaa248.

https://academic.oup.com/jcem/article-abstract/105/8/dgaa248/5836895?redirectedFrom=fulltext


Trata-se de um ensaio clínico randomizado aberto realizado em seis centros canadenses, com objetivo de avaliar remissão de diabete mellitus tipo 2 (DM2) após curto período de intervenção metabólica intensa. Foram incluídos pacientes com 30-80 anos, com DM2 com diagnóstico há menos de 8 anos, IMC> 23, HbA1c de 6,5 a 9,5% (sem tratamento) ou ≤ 8% (com até 2 hipoglicemiantes). Foram excluídos pacientes com uso de insulina, perda de função renal (TFG<60), ALT 2x acima do limite superior da normalidade, cirurgia bariátrica prévia ou em planejamento, doença cardiovascular impeditiva de exercício moderado. Todos os pacientes foram orientados quanto à dieta saudável e atividade física moderada. Os pacientes que foram randomizados para grupo intervenção receberam 12 semanas de tratamento intensivo com mudanças de estilo de vida (dieta e atividade física por pelo menos 15min/semana), insulina glargina, metformina e dapagliflozina.  O grupo controle manteve as medicações de uso prévio ao estudo. Na visita da 12ª semana, os pacientes com HbA1c <7,3% foram orientados a suspender os medicamentos hipoglicemiantes e manter controle de glicemia capilar 5x por semana. Aqueles com HbA1c >7,3% deveriam contatar seu médico. Foram realizadas visitas nas semanas 16, 24, 36, 48 e 64. As visitas a partir da 24ª semana contavam com dosagem de HbA1c.

O desfecho primário era remissão completa ou parcial de DM2 em 24 semanas, caracterizada por HbA1c <6% ou <6,5%, respectivamente. Outros desfechos incluíam remissão completa ou parcial após 24 semanas, recaída com ou sem hiperglicemia evidente. Recaída com hiperglicemia evidente era caracterizada como: recusa ou incapacidade para interromper hipoglicemiantes (ex.: Hba1c >7,3) em 12 semanas, reinício de hipoglicemiantes, glicemia de jejum >180 em metade dos testes em 1 semana, HbA1c >7% a partir da semana 24. Já a recaída sem hiperglicemia evidente foi definida como HbA1C entre 6,5% e 6,9% sem necessidade de medicamentos por pelo menos 12 semanas. 

Foram randomizados 154 pacientes, sendo 77 em cada grupo, avaliados por intenção de tratar. A duração média do diabetes era 36,8 meses, HbA1c mediana era 6,7%; IMC 32,9 e a TFG 95,9. O uso de medicamentos para tratar diabetes no início do estudo era similar em ambos os grupos, com 92,9% dos pacientes utilizando metformina. O desfecho primário foi atingido em 19 (24,7%) dos pacientes do grupo intervenção e 13 (16,9%) dos pacientes do grupo controle em 24 semanas (RR 1,5 IC95% 0,8-2,7). O risco relativo para remissão em 36,48 e 64 semanas foi de 2,4 (IC95%, 1,2-5,0); 2,1 (IC95%, 1,0-4,4) e 1,8 (IC95%, 0,7-4,7), respectivamente. O risco de recaída com hiperglicemia evidente foi reduzido em 43% no grupo intervenção (HR 0,57 IC95% 0,39-0,81), já o risco de qualquer recaída foi reduzido em 34% (HR 0,66 IC95% 0,47-0,92). A duração da remissão foi de 122,1 dias em média no grupo intervenção, com desvio padrão de 107,5 dias; já no grupo controle a remissão durou em média 78,1 dias, com desvio padrão de 108,6 dias. No Clube foram discutidos os seguintes pontos:

  • DM2 é uma doença crônica e uma remissão por curto período pode ter pouco impacto em longo prazo;

  • O tempo de duração da intervenção foi curto, talvez um período mais longo trouxesse resultados melhores. Da mesma forma, um estudo com pacientes com menor duração de doença (como o estudo piloto) poderia ser mais efetivo;

  • Os pacientes em ambos os grupos tinham um bom controle prévio ao estudo (HbA1c média era <7%);

  • O grupo intervenção aderiu melhor à atividade física, o que pode explicar, pelo menos em parte, a remissão nestes pacientes;

  • Os pontos positivos do estudo incluem o regime generalizável, randomização individual, análise por intenção de tratar, pacientes de centros comunitários e acadêmicos e oportunidade de suspensão dos medicamentos nos pacientes com hba1c <7,3 no grupo controle. Pontos negativos incluem o tamanho de amostra pequena, o estudo ser aberto e o fato de 8 pacientes do grupo controle não terem coletado hba1c em 12 semanas.


Pílula do Clube: intervenção metabólica intensa com dieta, atividade física, insulina glargina, metformina e dapaglifozina por 12 semanas não resultou em maior remissão de DM2 em relação ao tratamento usual 12 semanas após a suspensão da intervenção.


Discutido no Clube de Revista de 13/07/2020.

Semaglutide and Cardiovascular Outcomes in Obesity without Diabetes

  A. Michael Lincoff, Kirstine Brown‐Frandsen, Helen M. Colhoun, John Deanfield, Scott S. Emerson, Sille Esbjerg, Søren Hardt‐Lindberg, G. K...