sexta-feira, 29 de março de 2024

Semaglutide in Patients with Heart Failure with Preserved Ejection Fraction and Obesity

 M.N. Kosiborod, S.Z. Abildstrøm, B.A. Borlaug, J. Butler, S. Rasmussen, M. Davies, G.K. Hovingh, D.W. Kitzman, M.L. Lindegaard, D.V. Møller, S.J. Shah, M.B. Treppendahl, S. Verma, W. Abhayaratna, F.Z. Ahmed, V. Chopra, J. Ezekowitz, M. Fu, H. Ito, M. Lelonek, V. Melenovsky, B. Merkely, J. Núñez, E. Perna, M. Schou, M. Senni, K. Sharma, P. Van der Meer, D. von Lewinski, D. Wolf, and M.C Petrie, for the STEP-HFpEF Trial Committees and Investigators*


N Engl J Med 2023, 389(12):1069-1084.

https://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMoa2306963 


A prevalência de insuficiência cardíaca com fração de ejeção preservada está aumentando e a grande maioria das pessoas com a doença em questão apresentam sobrepeso ou obesidade, sendo que ambas não parecem ser apenas condições coexistentes e sim desempenhar um papel no desenvolvimento e na progressão. A presença de adiposidade visceral aumenta a inflamação, hipertrofia ventricular esquerda, gera maior resistência à insulina e disfunção diastólica e sistólica do ventrículo esquerdo, bem como impacto negativo na pressão arterial, músculo esquelético e na disfunção física. Tais alterações fazem com que os pacientes com obesidade e ICFEp apresentem um quadro clínico diferente quando comparado aos pacientes sem obesidade, ou seja, maior carga de sintomas, pior capacidade funcional e qualidade de vida.  As reduções nos sintomas e as melhorias na função física são, portanto, consideradas fundamentais no manejo da doença. 

Por sua vez, a semaglutida tem sido associada a perda de peso significativa em pessoas com sobrepeso ou obesidade e parece ter efeitos favoráveis sobre fatores de risco cardiometabólicos. Portanto, questiona-se se a semaglutida 2.4mg/semana, em pacientes com icfep e obesidade, além da perda de peso, é capaz de reduzir sintomas, limitações físicas e melhora da função de exercício. foi conduzido um estudo randomizado, duplo-cego e controlado por placebo em 96 locais em 13 países na ásia, europa, e américa do norte e do sul para responder tal questionamento. 

Eram elegíveis pacientes com > 18 anos,  FE > 45%, IMC > 30, NYHA classe II-IV, uma pontuação de resumo clínico do Questionário de Cardiomiopatia de Kansas City (KCCQ-CSS) de menos de 90 pontos (as pontuações variam de 0 a 100, com pontuações mais altas indicando menos sintomas e limitações físicas), distância de caminhada de 6 minutos de pelo menos 100 m e pelo menos um dos seguintes achados: pressões de enchimento ventricular esquerda elevadas, níveis elevados de peptídeo natriurético (com limiares estratificados de acordo com o IMC basal) mais alterações ecocardiográficas ou hospitalização por insuficiência cardíaca nos 12 meses antes da triagem mais tratamento contínuo com diuréticos ou alterações ecocardiográficas. Os principais critérios de exclusão foram relatos do paciente mudança no peso corporal de mais de 5 kg dentro 90 dias antes do rastreio e história de diabetes. 

A randomização foi estratificada entre Semaglutida 2.4mg vs placebo, de acordo com o IMC basal (<35 e ≥35). O tratamento com semaglutida foi iniciado na dose de 0,25 mg uma vez semanalmente durante as primeiras 4 semanas, e a dose foi escalado a cada 4 semanas com o objetivo de alcançar a dose de manutenção de 2,4 mg na semana 16. A duração do estudo foi de 52 semanas, além do follow-up de 5 semanas. Amostra de 516 participantes foi calculada por fornecer poder de 90% para detectar uma diferença entre grupos de 4.1 pontos na mudança no KCCQ-CSS e 99% para detectar uma diferença entre grupos de 9.9% em peso corporal em um nível alfa de 4% e 1%, respectivamente. Os desfechos de eficácia foram analisados com o princípio de intenção de tratar e os desfechos de segurança foram em todos participantes randomizados e que receberam pelo menos uma dose de semaglutida ou placebo.

De março de 2021 até março de 2022, foram randomizados 529 participantes, sendo 263 para grupo da Semaglutida e 266 para grupo placebo. A descontinuação prematura do tratamento ocorreu em 42 participantes em cada um dos grupos e 256 participantes (97,3%) no grupo semaglutida e 254 (95,5%) no grupo placebo completaram o ensaio. A maioria dos participantes eram mulheres (56,1%) e brancos (95,8%), e a mediana de idade era de 69 anos. A mediana do peso corporal e o IMC foram 105,1kg e 37,0, respectivamente, sendo que 349 participantes (66,0%) tinham IMC > 35.  A mediana do KCCQ-CSS foi de 58,9 pontos e a mediana da distância percorrida no teste de caminhada de seis minutos foi de 320,0 m. 

Os dois desfechos primários foram a mudança no KCCQ-CSS e a variação percentual em peso corporal desde o início até a semana 52. A mudança média no KCCQ-CSS observada foi de 16.6 pontos no grupo semaglutida e 8.7 pontos no grupo placebo (IC 95% 4.8 a 10.9; p <0,001), enquanto a variação percentual média no peso corporal foi de -13,3% para semaglutida e -2,6% para placebo (IC 95% -11.9 a -9.4; p<0,001). O aumento médio no KCCQ-CSS de quase 8 pontos a favor da semaglutida foi significativo, considerando que outras terapias medicamentosas não apresentaram redução nos sintomas e na limitação física dessa forma. 

Já os desfechos secundários incluíram: mudança na distância no teste de caminhada de 6 minutos, mudança na proteína C reativa e um desfecho composto hierárquico (morte por qualquer causa, número e momento dos eventos de insuficiência cardíaca, diferenças de pelo menos 15, 10 e 5 pontos na mudança no KCCQ-CSS e uma diferença de pelo menos 30m no teste de na caminhada de 6 minutos). A média de mudança na distância de caminhada de 6 minutos foi de 21,5 m no grupo semaglutida e 1,2 m no grupo placebo (IC 95% 8.6 a 32.1; p <0,001); os participantes do grupo semaglutida tiveram uma redução de 43,5% no nível de PCR em comparação com uma redução de 7,3% com placebo. Já na análise do desfecho composto hierárquico, o tratamento com semaglutida resultou em mais vitórias do que o placebo, com uma taxa de vitória estratificada de 1,72 (IC 95%, 1,37 a 2,15; p <0,001). 

O tratamento com semaglutida levou a menos eventos adversos graves do que o placebo (13.3% vs 26.7%, p <0,001), sendo que essa diferença se deu às custas do menor número de eventos de distúrbios cardíacos no grupo semaglutida. Houve uma frequência semelhante de descontinuação devido a eventos adversos graves: 6 participantes em cada grupo, a maioria pela presença de sintomas gastrointestinais. Já o número de participantes que descontinuaram o tratamento devido a algum evento adverso foi 35 no grupo semaglutida e 14 no grupo placebo. Durante o estudo, 7 participantes morreram: 3 no grupo da semaglutida e 4 no grupo do placebo, sendo que uma morte julgada no grupo placebo foi cardiovascular e as outras causas foram julgadas como não cardiovasculares (3 em cada grupo). 

Citam-se algumas limitações: baixo número de participantes não-brancos, o que pode limitar a generalização dos resultados; ensaio foi elaborado para avaliar os efeitos da semaglutida sobre os sintomas, limitações físicas e função de exercício e não tinha poder adequado para avaliar eventos clínicos; duração do acompanhamento limitada por 1 ano, sendo que a durabilidade dos efeitos observados além de 1 ano não pode ser determinada; ausência de dados específicos de hemoglobina glicada; baixa porcentagem de participantes em uso de inibidores do SGLT2. No Clube de Revista foram discutidos os seguintes pontos:

  • Importância da perda de peso em pacientes com ICFEp com vistas a melhora de sintomas e de qualidade de vida;

  • Dificuldade em separar o impacto de aGLP1 por mecanismos intrínsecos cardiometabólicos vs impacto pela perda de peso;

  • Perfil de pacientes com ICFEp, geralmente com mais obesidade e sobrepeso; 

  • Relevância de avaliar sintomas relatados pelo paciente como desfecho clínico em estudos;

  • Diferença entre perda de peso intencional e não intencional em pacientes com ICFEp em termos prognósticos. 


Pílula do Clube: em pacientes com insuficiência cardíaca com fração de ejeção preservada e obesidade, o tratamento com semaglutida uma vez por semana na dose de 2,4 mg levou a maiores reduções nos sintomas relacionados à insuficiência cardíaca e nas limitações físicas, maiores melhorias na função do exercício e maior peso perda do que o placebo.


Discutido no Clube de Revista de 20/11/2023.

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