Thomas H Inge, Anita P Courcoulas, Todd M Jenkins,
Marc P Michalsky, Mary L Brandt, Stavra A Xanthakos, John B Dixon, Carroll M
Harmon, Mike K Chen, Changchun Xie, Mary E Evans, Michael A Helmrath, Teen–LABS
Consortium
N Engl J Med 2019, 380(22):2136-2145.
A
cirurgia bariátrica representa uma alternativa terapêutica efetiva para perda
de peso em pacientes com obesidade e também na melhora de doenças crônicas que
esses pacientes apresentam no contexto pré-cirúrgico. Diversas evidências
sugerem que os pacientes que procuram e são submetidos a procedimentos
bariátricos têm maior prevalência de comorbidades como diabetes, hipertensão,
dislipidemia, disfunção renal e respiratória, limitações para deambular e edema
venoso de membros inferiores quando esses pacientes já se apresentavam obesos
desde a sua adolescência. Assim, o presente estudo propõe analisar desfechos em
5 anos após bypass gástrico em Y de Roux em uma coorte de adolescentes
comparado a uma coorte de adultos submetidos ao mesmo procedimento e que eram
obesos na adolescência. Os autores tinham como hipótese que a realização da
cirurgia bariátrica em pacientes com obesidade severa obteria maiores taxas de
remissão de comorbidades quando realizada precocemente.
O estudo incluiu pacientes de dois
grandes estudos observacionais, prospectivos, multicêntricos que avaliaram
casos consecutivos de cirurgia bariátrica. O estudo Teen-LABS incluiu o total
242 pacientes de idade menor ou igual a 19 anos, em 5 centros diferentes, entre
os anos de 2006 e 2012. Cerca de 70% dessa amostra foi submetida ao
procedimento de bypass gástrico em Y de Roux, sendo incluídos no estudo
apresentado 161 pacientes adolescentes. Já os pacientes adultos foram
selecionados do estudo intitulado LABS, que incluiu pacientes obesos com mais
de 18 anos, em 10 centros, entre os anos de 2006 e 2009. De um total de 2.458
pacientes, 1.738 realizaram bypass gástrico em Y de Roux e 396 desses fechavam
critérios para obesidade quando estavam na idade de 18 anos, o que foi avaliado
por meio de aplicação de questionários, e realizaram o procedimento entre as
idades de 25 e 50 anos. Em ambos os delineamentos os pacientes foram avaliados
na época da cirurgia (até 30 dias antes do procedimento), 6 meses no período
pós-operatório, e após anualmente até fechar cinco anos de acompanhamento.
Foram
determinados como desfechos primários a variação de peso e IMC em 5 anos, a
remissão de diabetes tipo 2 (definida como HbA1c inferior a 6,5% ou glicemia de
jejum inferior a 126 mg/dL na ausência do uso de hipoglicemiantes) e de
hipertensão arterial (pressão arterial sistólica inferior a 140 mmHg e
diastólica inferior a 90 mmHg na ausência do uso de anti-hipertensivos). Foram
também analisados como desfechos secundários a hipoferritinemia (definida como
ferritina sérica inferior a 10 ug/L em mulheres e inferior a 20 ug/L em
homens), hipovitaminose B12 (definida como vitamina B12 sérica inferior a 145
pg/mL) e a ocorrência de novos procedimentos abdominais. Para análise
estatística foram utilizados os modelos mistos linear e de Poisson e, para
calcular a taxa de novos procedimentos abdominais, foi utilizado a regressão de
Poisson sendo a taxa de incidência expressa em número de evento a cada 500
pessoas-ano.
Não houve diferença na porcentagem
de variação de peso entre adolescentes (-26%; intervalo de confiança [IC] 95%,
-29 até -23) e adultos (-29%, IC 95%, -31 até -27) em 5 anos após a cirurgia
bariátrica (P=0,08). Entretanto, os adolescentes apresentaram maior
probabilidade que os adultos de remissão de diabetes tipo 2 (86% vs. 53%; razão
de risco de 1,27; IC 95%, 1,03 a 1,57) e de hipertensão (68% vs. 41%; razão de
risco de 1,51; IC 95%, 1,21 a 1,88). Três adolescentes (1,9%) e sete adultos
(1,8%) morreram no seguimento de 5 anos pós-procedimento. A taxa de incidência
de novos procedimentos abdominais foi maior entre adolescentes que em entre
adultos (19 vs. 10 reoperações por 500 pessoas-ano, P=0,003). Em relação aos
desfechos nutricionais, em dois anos de seguimento os adolescentes apresentaram
menores níveis de ferritina que os adultos (72 de 132 pacientes [48%] vs. 54 de
179 pacientes [29%], P=0,004), assim como menores níveis de 25-hidroxivitamina
D (38%; IC 95%, 28 a 51, vs. 24%, IC 95%, 18 a 32, P=0,02). Não houve uma
incidência expressiva de hipovitaminose B12 ao longo dos dois anos de
seguimento analisados (4% dos pacientes em ambas as coortes). Os seguintes
pontos foram discutidos no Clube:
·
Estudo com limitações atreladas ao delineamento
observacional, mas principalmente pela dificuldade de se ter um grupo controle
quando já existe uma proposta de tratamento cirúrgico estabelecido;
·
Os autores não apresentam, no artigo principal
e nem no apêndice, qual foi o tempo total das comorbidades, principalmente de
diabetes tipo 2;
·
Adolescentes naturalmente apresentam menor
tempo de comorbidades, o que poderia influenciar a facilidade em que esses
pacientes apresentam para remissão;
·
Adolescentes sustentaram menos a perda de peso
do que os adultos ao longo dos 5 anos de seguimento. Essa observação sugere
reganho de peso e necessidade de nova abordagem terapêutica na vida adulta,
porém em um paciente no contexto pós-cirúrgico, submetido a mudanças anatômicas
e nutricionais decorrentes da cirurgia bariátrica;
·
Não se sabe como a cirurgia bariátrica pode
influenciar a vida fértil e o efeito na prole dos pacientes que se submetem ao
procedimento durante a adolescência;
·
Adolescentes apresentaram maior taxa de
reoperação abdominal, o que pode implicar em maior risco de comorbidades
cirúrgicas;
·
Uma discussão mais profunda sobre o impacto
psicológico e no abuso de substâncias que a cirurgia bariátrica pode impor ao
paciente adolescente é necessária, uma vez que essa população vive em processo
dinâmico de desenvolvimento psíquico, anatômico, hormonal e fisiológico.
Pílula
do Clube: Adolescentes apresentam remissão de diabetes
tipo 2 e hipertensão após cinco anos de bypass gástrico em Y de Roux mais
frequentemente que adultos, porém esse mesmo grupo esteve envolvido com maior
necessidade de novos procedimentos abdominais e deficiências nutricionais.
Discutido
no Clube de Revista de 25/05/2020.