sábado, 28 de novembro de 2020

Cardiovascular and Renal Outcomes with Empagliflozin in Heart Failure

 M. Packer, S.D. Anker, J. Butler, G. Filippatos, S.J. Pocock, P. Carson, J. Januzzi, S. Verma, H. Tsutsui, M. Brueckmann, W. Jamal, K. Kimura, J. Schnee, C. Zeller, D. Cotton, E. Bocchi, M. Bohm, D.-J. Choi, V. Chopra, E. Chuquiure, N. Giannetti, S. Janssens, J. Zhang, J.R. Gonzalez Juanatey, S. Kaul, H.-P. Brunner‑La Rocca, B. Merkely, S.J. Nicholls, S. Perrone, I. Pina, P. Ponikowski, N. Sattar, M. Senni, M.-F. Seronde, J. Spinar, I. Squire, S. Taddei, C. Wanner, and F. Zannad, for the EMPEROR-Reduced Trial Investigators*


N Engl J Med 2020; 383:1413-1424

https://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMoa2022190


Os inibidores da SGLT2 reduzem o risco de hospitalização por insuficiência cardíaca e eventos renais adversos em pacientes com diabetes do tipo 2. Mais recentemente, no estudo DAPA-HF, foi demonstrado este benefício com a dapagliflozina em pacientes independentemente da presença ou não de diabetes. O atual estudo, EMPEROR-Reduced, é um estudo randomizado, duplo-cego, placebo controlado, multicêntrico, realizado com objetivo de avaliar os efeitos da empagliflozina na morbidade e mortalidade de pacientes com insuficiência cardíaca com fração de ejeção reduzida (ICFEr), com ou sem diabetes do tipo 2.

Foram incluídos pacientes ≥ 18 anos de idade com ICFEr (fração de ejeção ≤ 40%) e classe funcional II, III ou IV, já em tratamento apropriado para IC. Como havia desejo de incluir pacientes com risco aumentado para eventos graves relacionados à IC (15% ao ano), o número de pacientes com fração de ejeção > 30% foi limitado pela necessidade de hospitalização por IC nos últimos 12 meses ou por nível mais elevado de NT-proBNP. Foram excluídos pacientes com outras doenças cardiovasculares ou tratamentos que aumentassem a imprevisibilidade no curso clínico dos pacientes, independente da IC; condição cardiovascular não tratada ou subtratada que pudesse interferir na tolerabilidade da medicação do estudo e comorbidade significativa. Após um período de rastreamento, foram randomizados 3.730 pacientes para receber empagliflozina 10 mg ao dia ou placebo (1:1). A randomização foi realizada por sistema de resposta interativo que usava permuta em blocos e estratificava de acordo com região geográfica, diabetes e taxa de filtração glomerular (TFG < 60 ou ≥ 60 ml/min). As visitas eram realizadas a cada 2-3 meses para avaliar desfechos e eventos adversos. O desfecho primário foi um composto de morte cardiovascular ou hospitalização por IC, analisado como o tempo do primeiro evento. Desfechos secundários que faziam parte de um teste hierárquico junto ao desfecho primário incluíam ocorrência de todas hospitalizações por IC e taxa de declínio da TFG. A análise estatística foi por intenção de tratar. Havia sido planejada análise interina de eficácia após a ocorrência de 500 eventos do desfecho primário, com a possibilidade de cessar prematuramente o estudo se benefício da empagliflozina fosse significativo (alfa unicaudal 0,001) em relação ao desfecho primário e morte cardiovascular isolada. 

        O desfecho primário ocorreu em 361 de 1863 pacientes (19,4%) no grupo da empagliflozina e em 462 de 1867 pacientes (24,7%) no grupo placebo (HR 0,75; IC 95%, 0,65-0,86; p<0,001). O benefício foi independente da presença ou não de diabetes. O número de hospitalizações por IC foi menor no grupo tratamento (HR 0,70; IC 95%, 0,58-0,85; p<0,001). A taxa de declínio da TFG foi menor no grupo empagliflozina em relação ao placebo (-0,55 vs. -2,28 ml/min ao ano; p<0,001). Metade dos pacientes tinham diabetes, 73% fração de ejeção ventricular ≤ 30%, 79% NT-proBNP ≥ 1000 pg/ml, 48% TFG < 60 ml/min. Dentre os eventos adversos, infecções não complicadas do trato genital foram mais frequentes com a empagliflozina. Os seguintes pontos foram discutidos no Clube da Revista:

  • Não houve diferença entre os níveis tensionais do grupo placebo e tratamento, sendo improvável que este mecanismo justifique o benefício visto em relação à insuficiência cardíaca;

  • O benefício visto com as gliflozinas já havia sido demonstrado em pacientes diabéticos, no entanto, o atual estudo incluiu também esta população. Aventou-se a dificuldade em atingir n suficiente sem inclusão dos pacientes diabéticos;

  • Em algumas análises de subgrupo (ex.: etnia) é difícil realizar inferências 

devido ao n restrito.


Pílula do Clube: em pacientes com ICFEr, o benefício da empagliflozina no desfecho primário se dá predominantemente pela redução do risco de hospitalização por IC e é independente da presença ou não de diabetes.


Discutido no Clube de Revista de 09/11/2020.


Once-Weekly Insulin for Type 2 Diabetes without Previous Insulin Treatment

 Julio Rosenstock, Harpreet S. Bajaj, Andrej Janež, Robert Silver, Kamilla Begtrup, Melissa V. Hansen, Ting Jia, and Ronald Goldenberg, for the NN1436-4383 Investigators*


N Engl J Med 2020 Sep 22. Online ahead of print.

https://www.nejm.org/doi/10.1056/NEJMoa2022474


A icodec é um análogo de insulina de longa duração administrada uma vez por semana, com concentração máxima em 16 horas e meia vida aproximada de 1 semana. Este estudo de fase 2, randomizado, duplo cego, double dummy, controlado por placebo, foi desenvolvido para avaliar a eficácia e segurança da icodec comparada à glargina uma vez ao dia em paciente com DM2 que não haviam sido tratados previamente com insulina e que estavam inadequadamente tratados com metformina associada ou não aos inibidores de DDP-4.

Os pacientes foram designados aleatoriamente numa proporção 1:1 para receber icodec subcutânea 1 vez por semana associada a placebo 1 vez ao dia ou glargina subcutânea 1 vez ao dia associada a placebo 1 vez por semana. O estudo incluiu um período de 2 semanas de screening seguido por período de 26 semanas de tratamento e período de seguimento de mais 5 semanas para glargina e 6 semanas para icodec. Foram incluídos pacientes de 18 a 75 anos, com DM2 há pelo menos 180 dias, em tratamento com metformina associada ou não ao inibidores de DDP-4, cujo nível de HbA1c era 7,0-9,5% e que haviam recebido insulina previamente apenas por curtos períodos (até 14 dias) ou durante a gestação. A dose de início de tratamento com icodec foi de 70 U uma vez por semana e a de glargina 10 U 1 vez ao dia. Após randomização as doses de insulina foram ajustadas para alcançar alvo glicêmico entre 70-180 mg/L antes do café da manhã. O desfecho 1o era a mudança da HbA1c basal até a 26a semana. Os desfechos  2os eram: mudança na glicemia, peso corporal, média do perfil de glicose aferida pelo próprio paciente em 9 pontos desde o início do tratamento até a  26a semana e a dose média semanal de insulina nas últimas 2 semanas de tratamento. Também foi avaliado o tempo de manutenção entre as faixas glicêmicas de 70 a 140 mg/dL, através do monitoramento pelo FreeStyle Libre Pro durante as últimas 2 semanas de tratamento. Os desfechos de segurança incluíam eventos adversos graves, eventos cardiovasculares, hipersensibilidade de reação local e  hipoglicemias gerais e noturnas. O tamanho amostral foi determinado para um intervalo de confiança de 95% para diferença entre os grupos, esperando-se desvio padrão de 1%. O estudo não teve poder de detectar diferenças entre os grupos em nenhum desfecho e a análise foi por intenção de tratar.

Dos 385 pacientes submetidos ao screening, 247 foram randomizados (125 para icodec e 122 para glargina), número similar de pacientes em cada grupo completou a 26a semana sem ter descontinuado o tratamento (96,8% icodec e 94,3% glargina). As características demográficas no basal foram semelhantes nos dois grupos com exceção a uma maior duração do diabetes no grupo icodec. A HbA1c foi de 8,09 (+- 0,7%) para 6,69% na semana 26 (- 1,33 pontos percentuais) no grupo icodec e de 7,96% (+-0,65%) para 6,87% (-1,15 pontos percentuais), uma diferença de -0,18 pontos percentuais (IC95%, -0,38 até 0,02; P=0,08) no grupo glargina. A porcentagem de pacientes que alcançaram nível de HbA1c  7,0% na semana 26 foi de 72% no grupo icodec e 68% no grupo glargina. A glicemia média medida pelo paciente foi menor no grupo icodec do que no grupo glargina em todos os momentos. Uma maior redução da glicose aferida em 9 pontos pelo paciente entre o basal até a 26a semana, uma menor dose necessária de insulina e um maior período mantido entre as faixas de glicose entre 70 e 140 mg/dL durante as últimas 2 semanas de tratamento foi observada no grupo icodec. A mudança do basal para a 26a semana da glicemia e o peso foi similar nos grupos. Em relação a segurança, 50% dos pacientes em cada grupo de tratamento tiveram efeitos adversos, sendo 2 eventos graves reportados em 2 pacientes recebendo icodec e 12 eventos graves reportados em 3 pacientes do grupo glargina. A incidência observada de hipoglicemia de nível 1 foi de 53,6% no grupo icodec e 37,7% no grupo glargina. Nos dois grupos a incidência de hipoglicemias nível 2 e 3 foi baixa (16% e 9,8%, respectivamente). 

No clube de revista foram discutidos os seguintes pontos:

  • O estudo é descrito pelos autores como sendo de fase 2, no entanto durante a leitura o conceito fica pouco claro, pois assemelha-se muito a um estudo de fase 3, apesar de não se tratar de um estudo de superioridade e não ter tamanho amostral suficiente para ser definido como tal;

  • Também não fica claro para os leitores se é um estudo de equivalência ou de não inferioridade;

  • Apesar de a discussão do artigo trazer que a icodec 1 vez por semana resultou em um controle glicêmico semelhante ao da glargina 1 vez ao dia sem eventos hipoglicêmicos relevantes, em debate conjunto discordamos dos autores por considerarem hipoglicemia nível 1 (entre 54-70 mg/dL) como leve, além disso consideramos que o número de hipoglicemias nível 1 foi substancialmente maior no grupo icodec em comparação ao grupo glargina;


  • A discussão do artigo também traz que os usuários de icodec permaneceram maior tempo entre as faixas glicêmicas entre 70-140 mg/dL, porém esta diferença entre os grupos não se confirma pela análise estatística. Além disso, estas aferições ocorreram apenas nas 2 semanas finais do estudo, reduzindo ainda mais a validade desta informação;

  • Os autores afirmam que a icodec  1 vez por semana aumenta a satisfação, adesão e persistência ao tratamento, porém consideramos esta informação pouco consistente, pois não se baseou na impressão dos pacientes incluídos no estudo (por meio de questionários, por exemplo).


Pílula do Clube: neste estudo inicial, com as limitações apontadas acima, a icodec semanal pareceu ter potencial na redução da glicemia e HbA1c quando comparada a insulina glargina. Entretanto, ainda restam dúvidas principalmente relacionadas ao perfil de segurança da nova droga e o seu lugar no manejo do diabetes ainda permanece em aberto.


Discutido no clube de revista no dia 26/10/2020


Dapagliflozin in Patients with Chronic Kidney Disease

 Hiddo J.L. Heerspink, Bergur V. Stefánsson, Ricardo Correa-Rotter, Glenn M. Chertow, Tom Greene, Fan-Fan Hou, Johannes F.E. Mann, John J.V. McMurray, Magnus Lindberg, Peter Rossing, C. David Sjöström, Roberto D. Toto, et al., for the DAPA-CKD Trial Committees and Investigators


The New England Journal of Medicine 2020; 383:1436-1446
https://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMoa2024816


Os inibidores do SGLT2 atuam no túbulo proximal bloqueando a reabsorção da glicose filtrada, acarretando melhora no controle glicêmico, redução de eventos cardiovasculares, internação por insuficiência cardíaca, morte cardiovascular e progressão de doença renal. Os estudos previamente realizados foram em pacientes com diabetes mellitus tipo 2 e/ou doença cardiovascular. O DAPACKD é um estudo com o objetivo de avaliar a eficácia a longo prazo da dapagliflozina em pacientes com doença renal crônica, com ou sem diabetes.

Os pacientes foram recrutados entre 2 de fevereiro de 2017 e 12 de junho de 2020 em 386 locais em 21 países. O estudo foi patrocinado pela Astra-Zeneca e os critérios de inclusão foram: pacientes adultos (≥ 18 anos) com taxa de filtração glomerular estimada entre 25 e 75 ml/min/1,73m2, taxa albumina urinária sobre creatinina urinária ≥200 e ≤5000 mg/g, uso de dose estável e máxima tolerada de iECA ou BRA por pelo menos 4 semanas antes do screening. Após randomização estratificada para diabetes mellitus tipo 2 e albuminúria, 2152 participantes receberam dapagliflozina 10 mg ao dia e 2152 receberam placebo. Os grupos eram semelhantes nas características do baseline. O desfecho primário era composto por piora ≥50% na eTFG (confirmada por 2a amostra de creatinina 28 dias após), ocorrência de doença renal terminal (diálise ≥28 dias, transplante renal ou eTFG <15 confirmada) e morte por causa renal ou cardiovascular.

Em março de 2020 o comitê de monitoramento independente recomendou que o estudo fosse interrompido pelo claro benefício da dapagliflozina demonstrado na análise de 408 eventos ocorridos. O desfecho primário ocorreu em 197 participantes (9,2%) no grupo dapagliflozina e 312 (14,5%) participantes no grupo placebo (HR 0.61, 95% CI, 0.51-0.72; P<0.001) com NNT 19. As principais considerações discutidas no Clube foram:

  • O desfecho primário composto não parece adequado visto que incluiu desfechos duros (doença renal terminal) e alteração na função renal que não tem importâncias comparáveis;

  • Da mesma forma, o desfecho secundário renal incluía alteração na função renal e morte por causa renal, sendo também não comparáveis;

  • A comparação contra placebo não é ideal já que pode superestimar o efeito da intervenção;

  • Informações sobre o controle pressórico de ambos os grupos não estão disponíveis e são fundamentais pois impactam nos desfechos analisados;

  • Assim como em estudos anteriores com essa classe de medicamento, houve uma queda inicial da taxa estimada de filtração que, posteriormente, é inferior à redução apresentada pelo grupo placebo;

  • Boa parte dos pacientes incluídos no estudo eram portadores de diabetes.



Pílula do Clube: o uso de dapaglifozina em pacientes com DRC parece diminuir eventos renais e cardiovasculares, com poucos eventos adversos. O impacto desta intervenção em pacientes sem diabetes, sobre desfechos duros e em comparação com outras intervenções (em especial anti-hipertensivos) ainda segue em aberto pelas limitações apontadas acima.


Discutido no Clube de Revista de 19/10/2020.


Weight Loss in Underserved Patients — A Cluster-Randomized Trial

 Peter T. Katzmarzyk, Corby K. Martin, Robert L. Newton, John W. Apolzan, Connie L. Arnold, Terry C. Davis, Eboni G. Price-Haywood, Kara D. Denstel, Emily F. Mire, Tina K. Thethi, Phillip J. Brantley, William D. Johnson,

Vivian Fonseca, Jonathan Gugel, Kathleen B. Kennedy, Carl J. Lavie,
Daniel F. Sarpong, and Benjamin Springgate.


N Engl J Med 2020;383:909-18.

https://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMoa2007448


O tratamento da obesidade em em populações em desvantagem socioeconômica na atenção primária carece de evidências. O PROPEL é um ensaio clínico randomizado por cluster para testar a eficácia de um tratamento de alta intensidade baseado em mudanças de estilo de vida, realizado em 18 clínicas de atenção primária com alta proporção de pacientes com baixa renda. As clínicas foram randomizadas para um programa de cuidado usual ou a intervenção. No programa intensivo, os pacientes faziam sessões semanais comandadas por coachs de saúde nos primeiros 6 meses, seguidas por mensais nos 18 meses seguintes. Eram incluídos pacientes de 20 a 75 anos e IMC entre 30 e 50 kg/m2. Participação atual em algum programa de perda de peso, uso de medicamento para perda de peso, cirurgia bariátrica e perda de peso recente eram os principais critérios de exclusão. Foram incluídos 803 pacientes: 452 no grupo intervenção e 351 no controle. O grupo intervenção tinha como meta perda de 10% do peso, com plano de ação com dieta e atividade física. Os médicos dessas clínicas recebiam treinamento por videoconferência e discutiam os casos com o grupo dos autores. No grupo do cuidado usual, os pacientes recebiam 6 boletins informativos com orientações de saúde e os médicos ganhavam  um panfleto com abordagem atual dos Centros de Serviços Medicare e Medicaid para reembolso de tratamento de obesidade. O desfecho primário era a porcentagem de variação de peso em 24 meses. Desfechos secundários incluíam mudança do peso em kg, mudança na circunferência da cintura, fatores de risco cardiovascular (pressão arterial, perfil lipídico, glicemia) e aspectos de qualidade de vida avaliados por questionários. A amostra total foi calculada com um poder de 97% para detectar uma diferença de 3,5% do peso em 24 meses. Foram pré-especificadas 3 análises de subgrupo: negro x outra etnia, idade (21-42 anos, 43-56 anos, 57-74 anos) e recebimento do material ≥80% x <80%. Mais de 80% dos pacientes completou o estudo, em ambos os grupos. A análise foi por intenção de tratar. 

A maior parte dos pacientes era de etnia negra (67,2%) e do sexo feminino (84,4%). A porcentagem de perda de peso em 24 meses foi maior no grupo intervenção: -4,99% (IC95% -6,02 a -3,96) vs. -0,48% (IC95% -1,57 a 0,61) no grupo controle, com uma média de diferença entre grupos de -4,51% (IC95% -5,93 a -3,1) (P<0,001). Os negros perderam menos peso. No grupo intervenção, a perda de peso foi semelhante entre homens e mulheres. Pacientes mais velhos perderam mais peso. Em 24 meses, 51% dos pacientes do grupo intervenção mantiveram sua perda de 5% do peso. Não houve diferença nos fatores de risco cardiovasculares em relação ao basal em ambos os grupos. Entre as vantagens desse estudo estão a diversidade da amostra, aumentando a validade externa, e a presença de um coach de saúde. Como pontos negativos, há o possível viés que poderia ser causado pelas perdas e a predominância expressiva de mulheres. Os seguintes pontos foram discutidos no Clube:

  • A perda de 5% do peso foi significativa e provavelmente pode trazer algum benefício; 

  • O estudo é composto por um combo de tratamento no grupo intervenção e não se sabe qual ou quais partes deste combo realmente fizeram a diferença;

  • A perda de peso do grupo intervenção é comparável à redução que ocorre com uso de medicamentos;

  • A maior perda de peso em pacientes mais velhos pode se dever a maior motivação e disponibilidade de tempo para aderir às medidas; 

  • Medidas de composição corporal trariam resultados mais detalhados, porém encareceriam o estudo e não são tão reproduzíveis na prática diária; 

  • É possível aplicar um programa semelhante no Brasil; 

  • A presença do coach em saúde é interessante e descentraliza o tratamento da figura do médico.


Pílula do Clube: Os resultados do PROPEL, estudo bem conduzido, indicam que é possível perda de peso em população desfavorecida em nível de atenção primária com um programa intensivo de tratamento focado em mudanças de estilo de vida.


Discutido no Clube de Revista de 05/10/2020.

Progression to type 2 diabetes in women with a known history of gestational diabetes: systematic review and meta-analysis

 Elpida Vounzoulaki, Kamlesh Khunti, Sophia C Abner, Bee K Tan, Melanie J Davies, Clare L Gillies


BMJ 2020; 369:m1361

https://www.bmj.com/content/369/bmj.m1361

 

O diabetes gestacional (DMG) é definido como o diabetes cujo diagnóstico inicial ocorre no segundo ou terceiro trimestre da gestação, não claramente relacionado com condição de base. Estudos previamente publicados demonstraram risco aumentado de progressão para diabetes tipo 2 (DM2) nas pacientes diagnosticadas com diabetes gestacional, e os guidelines mais recentes recomendam rastreamento ao longo de toda a vida dessas pacientes, pelo menos a cada 3 anos. Entretanto, na última década, houve significativa mudança na demografia das gestantes, com taxas crescentes de obesidade e idade materna avançada. Ocorreram também mudanças nos critérios diagnósticos de diabetes gestacional e foram publicados novos estudos com maior tempo de seguimento e com maior diversidade étnica. Assim, evidências atualizadas, que contemplassem as mudanças ocorridas, tornaram-se necessárias. 

O objetivo da revisão sistemática com metanálise foi estimar as taxas de progressão para DM2 de mulheres que tiveram DMG, em comparação com as pacientes normoglicêmicas. Além disso, questionaram-se quais fatores poderiam determinar essa progressão. O estudo foi conduzido de acordo com os guidelines PRISMA e MOOSE, e foi registrado adequadamente no sistema PROSPERO. Foi realizada a busca independente por dois autores nas bases de dados Medline e Embase, utilizando os termos de busca gestational diabetes e type 2 diabetes, a fim de encontrar artigos publicados em inglês a partir de 2000. Foram incluídos estudos de coorte prospectivos e retrospectivos, cujo seguimento pós-parto fosse de pelo menos 12 meses, com grupos de pacientes DMG e controle, e que apresentassem descrição do número de diagnósticos de DMG e DM2. As publicações foram submetidas à avaliação de qualidade através da escala de Newcastle-Ottawa (estudos não randomizados). O viés de publicação foi estimado através de funnel plots com uso dos testes de Begg’s e Egger’s e a heterogeneidade entre os estudos foi calculada pelo teste Higgins I².  O risco cumulativo de progressão para DM2 foi calculado através de meta-regressão por idade, IMC, ano de publicação e duração do seguimento, e foram realizadas análises de sensibilidade para explorar o efeito de cada estudo no resultado final.

Dentre as 7.571 publicações encontradas, após remoção de duplicatas, resumos e aplicação de critérios de elegibilidade, restaram 20 estudos, todos observacionais, grande parte conduzida em países europeus, entretanto também da América do Sul, Estados Unidos, Oriente Médio, Austrália, Canadá e Coreia do Sul. A etnia foi categorizada em branca, não branca e mista, sendo que estudos cuja população compreendia > 80% da mesma etnia foram definidos como brancos ou não brancos. No caso de informação faltante, a etnia era definida com base na etnia predominante no país do estudo. O tempo de seguimento variou de 1 a 25 anos. Segundo a escala de Newcastle-Ottawa, a grande maioria dos estudos apresentou avaliação de qualidade com pontuação satisfatória.

A metanálise incluiu um n total de 1.332.373 pacientes, sendo 67.956 pacientes com DMG e 1.264.417 pacientes de grupo controle. O risco relativo combinado para DM2 foi quase 10 vezes maior nas mulheres com DMG do que nas pacientes controles (RR 9,51 IC95% 7,14 a 12,67, P<0,001). Devido à significativa heterogeneidade entre os estudos, foram realizadas análises de subgrupos de acordo com etnia e duração de seguimento, que não resultaram diferenças significativas. Apesar disso, evidenciaram aparente maior risco relativo nos grupos com tempo de seguimento de 1 a 5 anos, pelo menos em parte devido à baixa incidência de DM2 nos braços controle destes estudos de menor duração. Os modelos de meta-regressão e as análises de sensibilidade não demonstraram resultados significativos. Os seguintes pontos foram discutidos no Clube da Revista:

  • Os resultados da revisão sistemática e metanálise são consistentes com a literatura prévia, e sugerem que mulheres com história de DMG estão cerca de 10 vezes mais propensas a desenvolver DM2, em comparação com as normoglicêmicas;

  • A presença de DMG poderia potencialmente servir como um preditor para desenvolvimento futuro de DM2;

  • Dentre as limitações, destaca-se a exclusão de estudos não publicados em inglês, ausência de análise de subgrupos de acordo com história familiar de DM2 ou paridade (informação faltante nos estudos), bem como a inadequada classificação da etnia das pacientes em diversos estudos, requerendo generalização;

  • Diferentemente do que sugeriram estudos prévios, a incidência cumulativa de DM2 aumentou ao longo do tempo de seguimento, sem platô a partir do quinto ano;

  • Novos estudos deveriam avaliar estratégias para melhorar a adesão ao rastreamento e a custo-efetividade destas estratégias preventivas.

 

Pílula do Clube: pacientes com DMG apresentam significativo aumento de risco de progressão para DM2, de cerca de 10 vezes. Apesar das recomendações atuais, as taxas de rastreamento nestas pacientes seguem insuficientes, suscitando a necessidade urgente de políticas e ações para promover o adequado seguimento desta população.

 

Discutido no Clube de Revista de 28/09/2020.


Semaglutide and Cardiovascular Outcomes in Obesity without Diabetes

  A. Michael Lincoff, Kirstine Brown‐Frandsen, Helen M. Colhoun, John Deanfield, Scott S. Emerson, Sille Esbjerg, Søren Hardt‐Lindberg, G. K...