Gowachirapant
S, Jaiswal N, Melse-Boonstra A, Galetti V, Stinca S, Mackenzie I, Thomas S,
Thomas T, Winichagoon P, Srinivasan K, Zimmermann MB.
Lancet Diabetes Endocrinol 2017, 5(11):853-863.
Trata-se
de ensaio clínico randomizado, duplo-cego e controlado por placebo desenvolvido
na Índia e Tailândia, em hospitais que atendiam predominantemente população de
classe média, com objetivo de avaliar a eficácia e segurança da suplementação
de iodo em gestantes com deficiência de iodo leve sobre o neurodesenvolvimento
infantil. Foram incluídas gestantes na sua primeira consulta pré-natal, com
feto único, idade gestacional (IG) de até 14 semanas, sem doenças de tireoide
ou doenças sistêmicas, randomizadas para receber 200 mcg/dia de iodo (tablete
de iodeto de potássio) ou placebo até o dia do parto. Este estudo foi
inicialmente projetado para avaliar as crianças até 2 anos após o parto, depois
estendido até 5-6 anos. A justificativa da mudança foi que a avaliação
cognitiva em idade escolar é mais ampla e melhor preditora da inteligência na
idade adulta.
Foram incluídas 832 gestantes,
idade média de 28 anos, IG inicial de 10,7 semanas, concentração urinária de
iodo (CUI) média em amostra de 131 mcg/L (deficiência leve, segundo a OMS),
sendo que 94% usavam sal iodado no domicílio.
As gestantes indianas tinham CUI maior (188 vs. 112 mcg/L). A taxa média de adesão à suplementação foi de 87%. Ao
longo do estudo, ocorreram muitas perdas (602 gestantes foram avaliadas no
parto) - os principais motivos foram retirada do consentimento e mudança de
cidade. As crianças foram avaliadas através de escalas de desenvolvimento
neurológico com 6 semanas, 1 ano, 2 anos e entre 5-6 anos. O desfecho primário
foi o escore de QI (performance e verbal) pelo Wechsler Preschool and Primary Scale of Intelligence Third Edition
(WPSSI-III) e o escore composto de função executiva global pelo Bayley Scales of Infant Development Third
Edition (BRIEF-P) entre 5-6 anos. Os desfechos secundários foram: resposta
auditiva, peso, altura, CUI, TSH e T4 entre 5-6 anos.
Não houve diferença nos
desfechos primários entre os dois grupos, assim como nas outras escalas
utilizadas para avaliar o desenvolvimento neurológico das crianças. A presença
de escore anormal na escala de WPPSI-III não diferiu entre os grupos. Não houve
diferença nos desfechos secundários, na frequência de partos pré-termo, baixo
peso ao nascer, e na função tireóidea materna. As crianças dos dois grupos
tiveram CUI considerada suficiente. Não houve diferença na frequência de
eventos adversos. Identificaram-se 2 casos de hipotireoidismo declarado no
grupo do iodo no primeiro trimestre (ambos ficaram eutireoideos nos trimestres
seguintes) e 8 casos de hipertireoidismo no primeiro trimestre (6 no grupo iodo
e 2 no placebo), com nenhum caso nos trimestres seguintes.
As principais limitações do
estudo foram o início da suplementação tardiamente no primeiro trimestre
(considerando a importância dos hormônios tireoidianos maternos nas primeiras
semanas de IG), avaliação CUI em amostra para avaliar a suficiência de iodo em
nível individual, alta taxa de abandono (mas sem diferença significativa entre
o grupo que permaneceu vs. saiu), e aumento
da CUI no grupo placebo para a faixa normal a partir do segundo trimestre. Durante
o Clube de Revista, foram discutidos os seguintes pontos:
·
Alta taxa de abandono: 832 gestantes incluídas,
apenas 330 crianças avaliadas para o desfecho primário;
·
Não houve descrição se alguma gestante recebeu
tratamento para hiper ou hipotireoidismo pelo médico assistente durante o
pré-natal;
·
Não houve descrição dos efeitos adversos
considerados sérios (morte ou admissão hospitalar);
·
O aumento da CUI do grupo placebo pode ter sido
causado pelo aumento da ingestão de iodo na dieta ou até mesmo suplementação,
já que as gestantes foram instruídas da importância de iodo na gestação.
Pílula
do clube: A suplementação de 200 mcg/dia de iodo em gestantes com
deficiência leve de iodo foi segura, mas não trouxe benefício no
neurodesenvolvimento infantil. Esse resultado foi compatível com a recomendação
da OMS de que a suplementação de iodo não é justificada em mulheres que residem
em países com programa efetivo de iodização do sal.