sábado, 19 de dezembro de 2020

Life Expectancy after Bariatric Surgery in the Swedish Obese Subjects Study

 Lena M.S. Carlsson, Kajsa Sjoholm, Peter Jacobson, Johanna C. Andersson‑Assarsson, Per‑Arne Svensson, Magdalena Taube,Bjorn Carlsson, and Markku Peltonen.



N Engl J Med 2020;383:1535-43.

https://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMoa2002449



Neste estudo, foi investigada a mortalidade ao longo de mais de 20 anos, e foi feita a estimativa de expectativa de vida de pacientes após a cirurgia bariátrica, naqueles obesos com tratamento convencional vs. população em geral. Trata-se de estudo prospectivo, não randomizado, pareado, observacional, conduzido em 25 departamentos públicos de cirurgia e 480 centros de atenção primária na Suécia. Os pacientes foram recrutados entre setembro de 1987 e janeiro de 2001, por divulgação em mídias sociais. Os critérios de inclusão foram idade entre 37 e 60 anos e IMC (índice de massa corporal, em kg/m²) de pelo menos 34 em homens e pelo menos 38 em mulheres. Os dados coletados foram cruzados com os dados disponíveis no Registro de Endereço da População Sueca e no Registro Sueco de Causa da Morte para obter informações sobre todas as mortes desde o início do estudo até 31 de dezembro de 2018. Os pacientes foram incluídos na análise de acordo com a intervenção que receberam. Para estimar as diferenças na sobrevida em “anos de vida”, uma abordagem paramétrica foi adaptada para calcular o “tempo até a morte”. O modelo de regressão de riscos proporcionais de Gompertz foi escolhido com base nos critérios de informação de Akaike. 

Chegou-se a 2.007 pacientes no grupo que fez cirurgia e 2.040 no grupo controle. Os pacientes do grupo de cirurgia foram submetidos à bandagem gástrica (18%), gastroplastia vertical com bandagem (69%), ou bypass gástrico (13%); já aqueles do grupo controle receberam tratamento convencional para obesidade, não padronizado. A intervenção começou no dia da cirurgia para os indivíduos do grupo de cirurgia e nesse mesmo dia para seus controles correspondentes. Foi utilizada uma coorte de referência, do Swedish Obese Subjects (SOS) reference study, estudo realizado entre 1994 e 1999, através de amostra aleatória de 1.135 pessoas de 37 a 60 anos. Os pacientes do grupo cirurgia eram mais jovens (idade média, 47,2 vs. 48,7 anos), eram menos propensos a ter uma educação universitária, tinham IMC médio mais alto (42,4 vs. 40,1), prevalências mais altas de hipertensão e diabetes, níveis médios de insulina e colesterol total mais elevados. As mudanças no IMC foram pequenas, em média, no grupo de controle; no grupo de cirurgia houve redução de 11 kg/m² no IMC no primeiro ano após a cirurgia, seguido por recuperação parcial do peso e estabilização após 8 anos, quando a média de IMC permaneceu 7 kg/m² menor do que o IMC basal. Durante o acompanhamento, houve 457 mortes no grupo de cirurgia, correspondente a um número de mortes por 1000 pessoas-ano de 10,7 (Intervalo de confiança [IC] 95% 9,7 a 11,7); no grupo controle houve 539 mortes, equivalente a 13,2 mortes por 1000 pessoas-ano (IC95%, 12,1 a 14,3); e apenas 125 mortes na coorte de referência, ou seja, 5,2 mortes por 1000 pessoas-ano (IC95%, 4,4 a 6,2). Em relação ao grupo controle, a mortalidade foi mais baixa no grupo cirurgia (Hazard Ratio [HR] 0,77; IC95% 0,68 a 0,87; P<0,001) e também na coorte de referência (HR 0,44; IC95% 0,31 a 0,48; P<0,001). Após ajuste para fatores de risco de linha de base, houve diferença entre o risco de mortalidade geral: 30% menor no grupo de cirurgia em relação ao controle (HR 0,70; IC95% 0,61 a 0,81), e 62% menor na coorte de referência em relação ao grupo controle ( HR 0,38; IC95% 0,31 a 0,47). A expectativa de vida média foi 3,0 anos (IC95% 1,8 a 4,2) a mais no grupo de cirurgia em relação ao grupo controle (P<0,001), e 8,5 anos (IC95%, 6,4 a 10,5) a mais na coorte de referência em relação ao grupo controle (P<0,001), ambos após ajustes. Assim, no grupo de cirurgia, a expectativa de vida média foi 5,5 anos (IC95% 3,4 a 7,6) mais curto do que na coorte de referência (P<0,001). As causas mais comuns de morte foram doenças cardiovasculares (388 mortes) e câncer (301 mortes). Para mortes por doença cardiovascular, em relação ao grupo controle, o risco foi 30% menor no grupo cirurgia (HR 0,70; IC95% 0,57 a 0,85); e para mortes causadas por câncer, o risco foi 23% menor (HR 0,77; IC95% 0,61 a 0,96). Pontos discutidos no clube de revista: 

  • Uma limitação do presente estudo é que a intervenção de cirurgia bariátrica não foi randomizada, os pacientes escolheram seu tratamento, fato explicado por considerações éticas na década de 1980, relacionadas à alta mortalidade pós-operatória deste tipo de cirurgia;

  • As características do grupo cirurgia foram em geral de maior gravidade (maior IMC, maiores taxas de hipertensão, diabetes, tabagismo, colesterol), o que nos leva a crer que em um estudo randomizado, com grupos mais equilibrados, o benefício seria maior;

  • Por ser um estudo com longo período de seguimento (um ponto forte), foram utilizadas técnicas cirúrgicas que raramente são usadas hoje (uma limitação);

  • Não foram claramente descritas neste estudo as perdas de pacientes ou como foram contabilizados os casos de mudanças de intervenção;

  • O aumento nas taxas de suicídio que vem sendo descrito em estudos e corroborado neste, mostra a importância de uma avaliação psiquiátrica bem feita no pré-operatório, capaz de identificar necessidade de tratamento psiquiátrico prolongado no pós operatório ou até mesmo de contraindicar a cirurgia.


Pílula do Clube: a expectativa de vida entre pacientes com obesidade que receberam tratamento convencional foi de aproximadamente 8 anos mais curta do que na população em geral, e esta diferença foi diminuída pela cirurgia bariátrica, que resultou em um aumento de 3 anos de vida em relação ao cuidado usual.


Discutido no Clube de Revista de 23/11/2020.


Phase 3 Trial of a Small-volume Subcutaneous 6-Month Duration Leuprolide Acetate Treatment for Central Precocious Puberty

 Karen O. Klein, Analía Freire, Mirta Graciela Gryngarten, Gad B. Kletter, Matthew Benson, Bradley S. Miller, Tala S. Dajani, Erica A. Eugster, and Nelly Mauras


J Clin Endocrinol Metab 2020, 105(10):e3660-e3671.

https://academic.oup.com/jcem/article/105/10/e3660/5879679


A puberdade precoce ocorre quando há presença dos caracteres sexuais secundários antes dos 8 anos nas meninas e  antes dos 9 anos nos meninos. Pode ser classificada como central (PPC) ou periférica, sendo a primeira causada por maturação precoce do eixo hipotálamo-hipófise-gonadal (HHG) e a qual tem como tratamento padrão-ouro os análogos do GnRH (GnRHa). No entanto, a maioria das formulações dos GnRHa são medicações de uso intramuscular (IM), como a leuprorrelina e triptorrelina. Sendo assim, o presente estudo de fase 3, multicêntrico, aberto e de braço único teve como objetivo avaliar a eficácia, farmacocinética e segurança da leuprorrelina subcutânea semestral e de dose pequena. A amostra alvo para o recrutamento era de 60 crianças, sendo que todas elas deveriam ter diagnóstico de PPC sem tratamento prévio, incluindo meninas entre 2 a 8 anos de idade e meninos entre 2 a 9 anos de idade. Elas deveriam preencher os 3 critérios para serem diagnosticadas com puberdade precoce central: achados clínicos, avanço de idade óssea (IO) de pelo menos 1 ano acima da idade cronológica (IC) e teste de estímulo com GnRHa com resultado de LH 30 minutos após maior que 5 Ui/L. O tratamento proposto eram duas doses de acetato de leuprorrelina - 45 mg/0,375ml – SC, na região abdominal, aplicados no dia 0 e semana 24. Para reconstituição da medicação, a caixa continha duas seringas, uma delas contendo o polímero e outra a leuprorrelina, sendo o tempo de reconstituição de 45 segundos e o tempo para aplicação da medicação era de até 30 minutos após a reconstituição. Os pacientes foram seguidos até a semana 48.  

As avaliações feitas pelo estudo foram através do teste de estímulo com GnRHa, em que era aplicado acetato de leuprorrelina, SC, 20 mcg/Kg ou 500 mcg e após 30 minutos realizada coleta de LH, FSH, estradiol e testosterona. O teste foi realizado no rastreamtno para detecção de PPC, em que o resultado era considerado positivo quando LH > ou igual a 5Ui/L. Já para avaliação do bloqueio, o teste foi realizado nas semanas 12, 24, 36 e 48 e era considerado como bloqueio efetivo os pacientes que apresentavam LH 30 minutos após <4 Ui/L. Além disso, foram coletadas amostras basais (sem teste de estímulo) nas semanas 4, 20 e 44. A IO foi avaliada através de Rx da mão e punho esquerdos pelo método Greulich and Pyle (com avaliador cegado) e foi realizado no rastreamento e nas semanas 24 e 48. A medida da altura foi feita por estadiômetro no screening, basal e nas semanas 4, 12, 24, 36, 44 e 48. O estágio puberal foi avaliado pelo método de Tanner no screening e nas semanas 12, 24, 36 e 48.

De uma amostra inicial de 114 crianças, 50 foram excluídas (a maioria devido ao teste de estímulo com GnRHa ter sido negativo). A população considerada para avaliação de segurança foi então 64 crianças e todas receberam pelo menos 1 dose do medicamento, sendo que 2 dessas crianças descontinuaram o tratamento (1 por ter tido crises convulsivas no passado e a outra por não ter avanço da IO). Sendo assim, foram incluídas no grupo de intenção de tratar 62 crianças – sendo que 3 dessas foram descontinuadas do estudo (1 por desejo dos pais pelo volume de sangue que era preciso para as coletas, 1 por ter recebido esteróide e 1 por apresentar progressão da puberdade na semana 14). Desta forma 59 crianças receberam o tratamento completo. A idade média era de 7,5 anos, sendo a maior parte meninas (96,8%) caucasianas (51,6%). A estatura média era de 136,6 cm com uma VC média de 8,9 cm/ano, IMC médio de 18,2 Kg/m2, avanço de IO de 3,2 anos e a maioria já tinha estágio puberal de Tanner 3 (73%). Em relação a concentração sérica hormonal, desde a semana 12 pelo menos 85% da população estudada manteve LH <4 Ui/L, além de medida de LH basal <0,6 Ui/L. O estudo também mostrou que a principal medida de LH pós-teste no início era de 23,5 Ui/L e declinou 3 Ui/L na semana 24 e 2,3 Ui/L na semana 48. A VC teve queda em pelo menos metade das crianças do estudo - a principal medida era de 8,9 cm/ano no basal, caiu para 5,4 cm/ano na semana 24 e se manteve em torno de 6 cm/ano na semana 48. A IO teve queda na taxa de avanço; a principal medida no screening era de avanço de 3 anos em relação à IC; 2,8 anos de avanço de na semana 24 (P<0,01); 2,7 anos da semana 48 (P<0,01). Os sinais puberais estabilizaram/regrediram em 55 das 57 meninas, tendo uma redução das mamas em 46% e estabilização em 51%. Nos meninos houve redução da aparência genital do estágio 3 para 2. Quanto ao IMC até a semana 24 houve aumento para 18,8 (P<0,01); mas entre as semanas 24 a 48 não teve aumento significativo (P=0,16). Quanto à farmacocinética, a medicação se manteve em dose estável e se picos desde a semana 4 até a 48. Em relação aos efeitos adversos o mais comum foi a dor local (31%) e não houve nenhum relato de abscesso estéril. No Clube foram discutidos os seguintes pontos:

  • O estudo teve algumas limitações como o tempo de coleta de LH após o teste de estímulo ter sido coletado depois de 30 minutas da aplicação da medicação. Como esta pode fazer pico em 1 hora, talvez tenham sido perdidos alguns pacientes por esse tempo mais precoce da coleta;

  • O número de meninos incluídos no estudo foi pequeno (n=2), porém isso reflete a prevalência maior de PPC em meninas;

  • Não há dados sobre a causa da PPC e não houve uma comparação entre o uso da leuprorrelina IM versus SC;

  • Considerando o longo período em que as vezes é necessário tratar as crianças com PPC, considera-se que o período de avaliação foi curto;

  • Como fatores positivos vale lembrar o baixo risco de reações no local da injeção, sendo considerada uma medicação segura.


Pílulas do clube: Apesar de algumas limitações, o presente estudo mostra que a leuprorrelina administrada de forma SC e semestral é segura, não causa abscesso estéril e é efetiva, pois houve supressão do eixo HHG, além de desaceleração da VC, redução no avanço da IO e regressão/estabilização do estágio puberal em mais de 85% das crianças.


Discutido no Clube de Revista de 16/11/2020.


Semaglutide and Cardiovascular Outcomes in Obesity without Diabetes

  A. Michael Lincoff, Kirstine Brown‐Frandsen, Helen M. Colhoun, John Deanfield, Scott S. Emerson, Sille Esbjerg, Søren Hardt‐Lindberg, G. K...