quarta-feira, 30 de março de 2022

Factors determining chance of type 2 diabetes remission after Roux- en- Y gastric bypass surgery: a nationwide cohort study in 8057 Swedish patients

 Erik Stenberg,Torsten Olbers, Yang Cao, Magnus Sundbom, Anders Jans, Johan Ottosson, Erik Naslund, Ingmar Näslund

 

BMJ Open Diabetes Res Care 2021, 9(1):e002033.

https://drc.bmj.com/content/9/1/e002033.long 

 

         A cirurgia bariátrica é procedimento de grande sucesso no controle do diabetes (DM). Conhecer fatores que influenciam na chance de remissão da doença é importante para melhor indicar o procedimento. Trata-se de coorte sueca que incluiu dados do registro nacional de cirurgias bariátricas do país realizadas em pacientes com DM, entre 2005 e 2017. O desfecho principal foi a taxa de remissão do diabetes 2 anos após a cirurgia – definido como HbA1C ≤6,0% sem uso de medicações anti-diabéticas; desfechos secundários foram: sexo, peso, circunferência, abdominal, IMC, duração do DM, HbA1c basal, média de medicamentos utilizados, uso de insulina, doenças relacionadas a obesidade, escolaridade, condição financeira, tamanho da cidade de residência, naturalidade sueca ou estrangeira.

         No período avaliado, 8.112 pacientes com DM foram submetidos à cirurgia bariátrica, sendo que 55 foram a óbito antes de completar 2 anos de pós-operatório. Logo, 8.057 pacientes foram incluídos no estudo. Ao final de 2 anos, os dados de peso e IMC estavam disponíveis em 62% dos pacientes e os dados de HbA1c em 79,4%. Demonstrou-se que antes da cirurgia 29% dos pacientes eram tratados incluindo insulina, 49% somente com drogas orais e 22% com mudanças de estilo de vida. Após a cirurgia, estes percentuais passaram a ser de 7%, 16% e 77%, respectivamente. Atingiram a remissão completa 62,2% dos pacientes, sendo que 48,8% dos pacientes que usavam insulina conseguiram ficar sem nenhuma medicação para o diabetes e 88,5% dos pacientes que usavam somente antidiabéticos orais conseguiu ficar sem nenhuma medicação. No entanto, 24,9% dos pacientes que usavam insulina seguiram necessitando de insulina. Foram variáveis que aumentaram a chance de remissão: ser mais jovem, menor tempo de diabetes, menor HbA1c basal, não usar insulina, maior percentual de perda de peso, não ter dislipidemia, morar em cidade de pequeno-médio porte (até 200.000 habitantes), ter nascido na Suécia. As limitações do estudo foram a definição de remissão só com base na ausência de medicamentos; alguns pacientes usando metformina por proteção cardiovascular (subestima taxa de remissão); avaliação com 2 anos de pós-operatório (pode subestimar a taxa de recidiva da doença); ausência de critério laboratorial adicional (peptídeo C, por exemplo); viés de aferição de um banco de registro de dados nacional. No Clube de Revista foram debatidos os seguintes pontos:

  • Foi usado Odds Ratio no estudo, mas por tratar-se de uma coorte poderia ter sido mais adequado o uso de Risk Ratio;

  • Houve grande quantidade de dados faltantes em algumas variáveis, que pode gerar viés significativo. Por outro lado, o desfecho principal teve uma quantidade de perdas aceitável (em torno de 20%);

  • Poderia ter sido usado um fluxograma para apresentação da população estudada;

  • Não foi debatida a validade externa dos dados de um estudo com pacientes provenientes somente da Suécia;

  • O impacto do tempo de DM e uso de insulina na chance de remissão reforça a hipótese da insulinopenia, além da resistência insulínica por si só.

 

Pílula do Clube: idade, uso de insulina, duração e controle do diabetes são fatores associados à chance de remissão do DM após a cirurgia bariátrica. Conhecer as variáveis envolvidas certamente ajuda a selecionar adequadamente os pacientes a serem submetidos à cirurgia bariátrica.

 

Discutido no Clube de Revista de 07/03/2022.

A Randomized, Phase 3 Trial of Naltrexone SR/Bupropion SR on Weight and Obesity-related Risk Factors (COR-II)

 Caroline M. Apovian, Louis Aronne, Domenica Rubino, Christopher Still, Holly Wyatt, Colleen Burns, Dennis Kim, Eduardo Dunayevich


Obesity (Silver Spring) 2013 May;21(5):935-43.

https://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1002/oby.20309


A bupropiona reduz a POMC hipotalâmica, causando redução do apetite e aumento do gasto energético. A naltrexona bloqueia o receptor hipotalâmico que inibe a POMC, aumentando seus níveis circulantes. Bupropiona associada à naltrexona como tratamento da obesidade tem portanto, racional teórico para efeito aditivo dos fármacos no tratamento da obesidade. Neste ensaio clínico randomizado de fase 3, placebo-controlado, foram incluídos pacientes entre 18 e 65 anos, com IMC entre 30 e 45 ou IMC entre 27 e 45 e comorbidades (HAS, dislipidemia). Foram randomizados 1496 pacientes (2:1, intervenção:placebo), seguidos por 56 semanas. Foram excluídos pacientes com diabetes, doença hepática, renal ou vascular grave, mudança de peso maior que 4 kg nos últimos 3 meses e aqueles com história de convulsão ou doença psiquiátrica grave. A intervenção foi bupropiona SR 180 mg + naltrexona SR 16 mg 2 vezes ao dia. Todos os pacientes foram orientados a seguir dieta e atividade física. Os desfechos primários foram o percentual de perda de peso na semana 28 e o percentual de pacientes que atingiram pelo menos 5% de perda de peso. Os desfechos secundários foram: os desfechos primários na 56ª semana, a proporção de pacientes que perderam mais de 10% do peso, mudanças em marcadores cardiometabólicos, a percepção dos pacientes sobre o apetite e questionário de qualidade de vida. Entre a 28ª e a 44ª semana, os pacientes que não atingiram pelo menos 5% de perda de peso foram randomizados novamente para seguir usando a mesma dose ou aumentar a dose de naltrexona SR para 24mg 2 vezes ao dia. O cálculo amostral estimou 1500 pacientes para demonstrar diferenças significativas com 99% de poder. A análise estatística foi por intenção de tratar e os dados perdidos foram imputados de diferentes formas para confirmar a robustez dos dados, sendo a principal o carregamento dos dados da última aferição. 

Houve 45,7% de descontinuação do tratamento no grupo placebo, sendo o principal motivo a não-perda de peso e 46,7% de perdas no grupo intervenção, sendo o principal motivo os efeitos colaterais (52% destes). Os resultados (intenção de tratar) demonstraram menor perda de peso no grupo intervenção (-6,5% vs. -1,9%), sendo ainda maior quando as análises foram por protocolo (-7,8% vs. 2,4%). O percentual de pacientes do grupo intervenção que perdeu pelo menos 5%, 10% e 15% do peso foi, respectivamente: 55,6% vs.17,5% ; 27,3% vs. 7,0% e 10,2% vs. 1,8% (intenção de tratar). O subgrupo que foi randomizado novamente para dose maior de naltrexona não teve perda de peso maior do que a dose habitual (-1,1% vs. -1,3%). Houve melhora em parâmetros metabólicos como circunferência abdominal, triglicerídeos, LDL, HDL, resistência insulínica, proteína C reativa e indicadores de qualidade de vida. A pressão arterial não foi diferente entre os grupos. Os principais efeitos adversos foram náusea (29,2% vs. 6,9%), constipação (19,1% vs. 7,1%) e cefaleia (17,5% vs. 8,7%). No clube de Revista foram debatidos os seguintes pontos:

  • O estudo fornece outras análises estatísticas baseadas em diferentes métodos de imputação, que possibilitam interpretação dos resultados em diferentes cenários (como naqueles que efetivamente conseguiram concluir o tratamento, um cenário mais otimista para avaliar os reais resultados em quem tolera a medicação), ou imputando os dados perdidos com os valores de baseline (um cenário mais pessimista em que se consideraria que a descontinuação da medicação levaria a reganho de todo o peso perdido);

  • A grande limitação do estudo é a alta taxa de perdas (46%), que pode levar a alguns vieses nos resultados;

  • Existem alguns estudos usando bupropiona SR isolada que demonstraram resultados semelhantes, sendo questionado o real impacto da combinação com naltrexona.

 

Pílula do Clube: este estudo foi útil ao que se propôs e demonstrou superioridade da combinação bupropiona SR + naltrexona SR para o tratamento da obesidade, sendo uma alternativa para o tratamento desta doença, agora aprovada pela ANVISA para uso no Brasil.


Discutido no Clube de Revista de 24/01/2022.

Effect of Weekly Subcutaneous Semaglutide vs Daily Liraglutide on Body Weight in Adults With Overweight or Obesity Without Diabetes: The STEP 8 Randomized Clinical Trial

 Domenica M. Rubino, Frank L. Greenway, Usman Khalid, Patrick M. O’Neil, Julio Rosenstock, Rasmus Sorrig, Thomas A. Wadden, AWizert, W. Timothy Garvey, for the STEP 8 Investigators


JAMA 2022, 327(2):138-150.

https://jamanetwork.com/journals/jama/article-abstract/2787907


A semaglutida e a liraglutida são análogos do GLP1 que diferem entre si por modificações moleculares que conferem uma meia vida mais curta à liraglutida (13-15h) e mais longa à semaglutida (165 horas). Em estudo de fase 2, semaglutida 2,8 mg/semana aumentou significativamente a perda ponderal comparado a liraglutida 3 mg/dia. Nesse contexto, o objetivo deste estudo foi avaliar o efeito na perda de peso em adultos com sobrepeso ou obesidade sem diabetes de semaglutida 2,4 mg semanal versus liraglutida 3mg diária associados a dieta e exercícios físicos. Este foi o primeiro estudo de fase 3 comparando semaglutida e liraglutida, foi randomizado e realizado em 68 estados dos EUA de setembro de 2019 a maio de 2021. Os critérios de inclusão eram idade ≥ 18 anos, uma ou mais tentativas não bem sucedidas de perda de peso com dieta, IMC ≥ 30 ou ≥ 27 com comorbidade relacionada ao sobrepeso (hipertensão, dislipidemia, SAHOS ou doença cardiovascular). Já os principais critérios de exclusão eram diabetes, HbA1c ≥ 6,5%, mudanças de peso de mais de 5 kg nos últimos 90 dias antes do screening.

   A randomização foi 3:1:3:1: semaglutida 2,4 mg 1x/semana, placebo 1x/semana, liraglutida 3 mg 1x/dia, placebo 1x/dia. Os pacientes foram submetidos a uma dieta com déficit calórico de 500 kcal em relação ao basal e realizavam atividade físicas de ≥ 150 minutos/semana. A intervenção foi de 68 semanas com um seguimento de 7 semanas. Durante o estudo, os participantes tinham consultas a cada 4-6 semanas com profissional de saúde qualificado. A dose inicial de semaglutida foi de 0,25 mg com aumento semanal durante 16 semanas até atingir a dose de 2,4 mg e para a liraglutida a dose inicial foi de 0,6 mg com aumento dentro de 4 semanas até atingir a dose de 3 mg. O desfecho primário foi a mudança na % de peso na semana 68 comparado ao basal e os desfechos secundários foram a avaliação da perda ponderal dividida em 10% ou mais, 15% ou mais e 20% ou mais, a mudança absoluta no peso, a circunferência abdominal, pressão arterial, perfil lipídico, proteína C reativa, HbA1c, glicose de jejum, insulina em jejum, status glicêmico e descontinuação do tratamento. Foi avaliado desfecho exploratório previamente especificado quanto a perda ponderal de 5% ou mais. As mudanças no peso dos pacientes no grupo placebo e mudanças na frequência cardíaca foram avaliadas por análise “post hoc” e os eventos adversos foram avaliados na semana 75.

Quanto aos resultados, 338 pacientes foram randomizados com média de idade de 49 e desvio padrão de 13 anos sendo que destes 265 eram mulheres (78,4%) com média de peso de 104,5 kg e desvio padrão de 23,8 kg além de IMC médio de 37,6 com desvio padrão de 6,8 kg/m². Trezentos e dezenove pacientes completaram o estudo e 271 (80,2%) completaram o tratamento. A média da mudança de peso em relação ao basal foi de -15,5% com semaglutida versus 6,4% com liraglutida (diferença de -9,4 pontos percentuais [IC95%, -12  a -6,8]; P <0,001). A mudança de peso no placebo foi de -1,9%. Os pacientes também obtiveram melhor desfecho na perda ponderal de 10% ou mais, 15% ou mais e 20% ou mais no grupo semaglutida versus liraglutida (70,9% versus 25,6% [OR, 6,3 {IC95%, 3,5 – 11,2}], 55,6% versus 12% [OR, 7,9 {IC95%, 4,1 – 15,4}] e 38,5% versus 6% [OR 8,2 {IC95%, 3,5 – 19,1}] respectivamente; todos com P<0,001). As proporções de pacientes que descontinuaram o tratamento por qualquer razão foi de 13,5% no grupo semaglutida e 27,6% no grupo liraglutida. Eventos adversos gastrointestinais ocorreram em 84,1% com semaglutida e 82,7% com liraglutida. No Clube de Revista foram discutidos os seguintes pontos:

  • A diferença nas doses permitia que os pacientes soubessem de qual grupo de tratamento ativo poderiam estar participando, o que pode ter levado a um viés importante;

  • A diferença de conduta no contexto de má tolerância (para semaglutida era utilizada menor dose enquanto para liraglutida o medicamento era descontinuado e reescalonado) pode ter contribuído para uma menor perda ponderal no grupo liraglutida considerando um tempo de tratamento mais curto;

  • As múltiplas imputações utilizadas nos dados faltantes podem ter gerado viés, mas os dados faltantes foram poucos e as análises de sensibilidade confirmaram a robustez da análise primária;

  • A maior proporção de descontinuidade de tratamento no grupo liraglutida pode estar associado a menor meia vida desta, pois caso a dose não seja aplicada a perda do efeito pode predispor o paciente à suspensão do uso.


Pílula do Clube: o uso de semaglutida subcutânea uma vez por semana comparada com liraglutida diária subcutânea (ambas associadas a dieta e exercícios) resultou em perda ponderal significativamente maior em 68 semanas.


Discutido no Clube de Revista de 17/01/2022.

Evolocumab in Pediatric Heterozygous Familial Hypercholesterolemia

 Raul D. Santos, Andrea Ruzza, G. Kees Hovingh, Albert Wiegman, François Mach, Christopher E. Kurtz, Andrew Hamer, Ian Bridges, Andrea Bartuli, Jean Bergeron, Tamás Szamosi, Saikat Santra, B.Chir., et al., for the HAUSER-RCT Investigators*


N Engl J Med 2020; 383:1317-1327

https://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMoa2019910

 

A hipercolesterolemia familiar é uma condição genética caracterizada por uma concentração plasmática elevada de colesterol LDL, que inicia no nascimento e tem um risco aumentado de doença cardiovascular aterosclerótica prematura. É causada por variantes em genes que codificam proteínas envolvidas na eliminação de partículas de LDL: maioria apresenta mutações no gene que codifica o receptor de LDL, mas também é causada por mutações nos genes que codificam a apolipoproteína B e PCSK9. As estatinas são a terapia farmacológica padrão, podendo ser acrescentada ezetimiba quando não for atingido alvo LDL (alvo LDL < 100-130 mg/dL). Apesar do tratamento adequado, em alguns pacientes com hipercolesterolemia familiar os níveis de colesterol LDL ainda não são atingidos. O evolocumabe é um anticorpo monoclonal humano que se liga a PCSK9 e a inibe, impedindo que seja degradado o receptor LDL, aumentando a disponibilidade do receptor LDL e, portanto, reduzindo os níveis colesterol LDL. O objetivo do estudo foi avaliar a eficácia e a segurança do evolocumabe como uma terapia complementar ao tratamento apropriado com estatinas, com ou sem ezetimiba, em pacientes pediátricos com hipercolesterolemia familiar nos quais as metas de colesterol LDL não foram alcançadas.

Trata-se de um ensaio clínico randomizado de fase 3, multicêntrico, controlado por placebo. O estudo consistiu em um período de triagem com duração máxima de 8 semanas, seguido por fase tratamento duplo-cego de 24 semanas, na qual os pacientes foram designados aleatoriamente em uma proporção de 2:1 para receber injeções subcutâneas mensais de evolocumabe 420 mg ou placebo. Foram incluídos pacientes com diagnóstico de hipercolesterolemia familiar heterozigótica, com idade de 10 a 17 anos, recebendo dieta com baixo teor de gordura e terapia hipolipemiante estável por pelo menos 4 semanas antes da triagem, com colesterol LDL ≥ 130 mg/dL e triglicerídeos ≤ 400 mg/dL. Os pacientes com hipercolesterolemia familiar homozigótica, que realizaram aférese lipídica nas últimas 12 semanas, com diagnóstico de DM1, DM2 recém-diagnosticado, DM2 com hemoglobina glicada > 8,5% ou tolerância à glicose diminuída, TSH < limite inferior do normal ou > 1,5 vezes o limite superior normal, níveis T4 livre fora da faixa normal, TFG <30 ml/min/1,73m2, TGO/TGP > 2X limite superior normal, pacientes do sexo feminino grávidas ou amamentando, CK > 3X o limite superior do normal, infecção ativa ou disfunção hematológica, renal, metabólica, gastrointestinal ou endócrina importante, uso de inibidor de PCSK9 e sensibilidade conhecida quaisquer substâncias administradas foram excluídos. Como desfecho primário foi avaliado a mudança percentual no nível de colesterol LDL desde o início até semana 24, como desfechos secundários a mudança percentual média no LDL desde início até as semanas 22 e 24, mudança absoluta no LDL desde início até a semana 24, alterações percentuais não-HDL, apolipoproteína B, proporção colesterol total / colesterol HDL, proporção  apolipoproteína B / apolipoproteína A1 desde início até a semana 24. Análise de segurança incluiu a incidência de eventos adversos, avaliação laboratorial (níveis de hormônios e vitamina A, D, E e K e desenvolvimento  anticorpos anti-evolocumabe), função cognitiva, crescimento e desenvolvimento puberal, espessura íntima-média da carótida para progressão da aterosclerose e alterações ECG.

Foram recrutados pacientes de março 2016 a maio 2019, com um total de 158 pacientes randomizados, 105 para o grupo evolocumabe e 53 para o grupo placebo, sendo que um paciente do grupo evolocumabe foi retirado o consentimento e não recebeu a intervenção. Foram analisados 104 pacientes do grupo evolocumabe e 53 pacientes do grupo placebo. 4 pacientes do grupo evolocumabe descontinuaram tratamento com o medicamento: 1 apresentou artropatia relacionado ao tratamento, 2 solicitaram a descontinuação e 1 faltou uma consulta agendada em que dose final teria sido administrada. O nível médio de colesterol LDL na linha de base foi de 184,3 ± 45,6 mg/dL. Na semana 24, a alteração percentual média no nível de colesterol LDL foi de −44,5% no grupo evolocumabe e −6,2% no grupo placebo grupo. A alteração absoluta média no nível de colesterol LDL desde o início até a semana 24 foi de -77,5 mg/dL no evolocumabe grupo e −9,0 mg/dL no grupo placebo. Nas semanas 22 e 24, a variação percentual média da linha de base no nível de colesterol LDL foi de −48,0% no grupo evolocumabe e −5,9% no grupo placebo. A mudança no percentual da linha de base até a semana 24 do colesterol não HDL no grupo evolocumabe  foi de -41,2% , apolipoproteína B -34,9%, proporção colesterol total / colesterol HDL -35%, proporção apolipoproteína B / apolipoproteína A1 -37% e no grupo placebo -6,1%, -2,4%, -4,7% e -0,6%, respectivamente. Na semana 24, um nível de colesterol LDL < 130 mg/dL foi alcançado em 71 de 96 pacientes (74%) no grupo de evolocumabe e em 10 de 44 pacientes (23%) no grupo de placebo. Em relação a análise de segurança, na semana 24 as alterações de desenvolvimento puberal, variáveis ​​de crescimento, ​​laboratoriais, alterações da linha de base na espessura da íntima-média da carótida, avaliação cognitiva e ECG foram semelhantes nos 2 grupos. Os seguintes pontos foram discutidos do clube:

  • Houve redução importante do colesterol LDL após 24 semanas de tratamento no grupo evolocumabe, como também tiveram benefícios significativos em relação a outras variáveis lipídicas nessa população pediátrica;

  • Não houve efeitos adversos que contra indicassem o uso do medicamento. Entretanto no tempo proposto não é possível avaliar a longo prazo os efeitos relacionados ao crescimento e desenvolvimento desses pacientes;

  • Ainda não se sabe se o acréscimo de evolocumabe irá reduzir o risco futuro de doença cardiovascular aterosclerótica prematura.


Pílula do Clube: o evolocumabe mensal forneceu redução substancial do LDL em 24 semanas quando adicionado à terapia de redução de lipídios em pacientes pediátricos com hipercolesterolemia familiar heterozigótica. A segurança e eficácia a longo prazo de evolocumabe no tratamento da hipercolesterolemia familiar em pacientes pediátricos exigirão mais estudos.


Discutido no Clube de 10/01/2022.

Once-weekly cagrilintide for weight management in people with overweight and obesity: a multicentre, randomised, double-blind, placebo-controlled and active-controlled, dose-finding phase 2 trial

 Lau DCW, Erichsen L, Francisco AM, Satylganova A, le Roux CW, McGowan B, Pedersen SD, Pietiläinen KH, Rubino D, Batterham RL

 

Lancet. 2021 Dec 11;398(10317):2160-2172

https://www.thelancet.com/journals/lancet/article/PIIS0140-6736(21)01751-7/fulltext

 

Esse ensaio clínico randomizado, duplo-cego e controlado por placebo e medicamento ativo trata do uso de cagrilintide, um análogo de amilina de longa-ação, para controle de obesidade e sobrepeso. A amilina é um hormônio co-secretado com a insulina pela célula beta pancreática, contribuindo para o controle glicêmico através da lentificação do esvaziamento gástrico e regulação de saciedade à nível do sistema nervoso central.

Nesse estudo, injeções subcutâneas de cagrilintide em doses variáveis foram comparadas com posologias semelhantes de placebo e com aplicação diária de liraglutida 3,0 mg, em adultos não-diabéticos com IMC acima de 30 ou acima de 27 caso apresentassem dislipidemia ou hipertensão como comorbidades. Os pacientes fizeram uso do medicamento por 26 semanas e o desfecho primário foi o percentual de perda de peso ao final do tratamento, utilizando estimativas de eficácia por imputação múltipla (trial product estimand e treatment policy estimand), conforme preconizado por agências reguladoras para intervenções visando perda de peso. 

Os resultados demonstraram superioridade do medicamento em relação ao placebo em todas as doses, com a diferença no percentual de perda de peso variando entre 3% a 7,8%. Entretanto, doses semanais de 0,3 mg e 0,6 mg foram inferiores a liraglutida; doses de 1,2 mg e 2,4 mg foram equivalentes e a dose de 4,5 mg foi superior. Efeitos colaterais foram semelhantes em relação à liraglutida. Entre os pontos discutidos no Clube constaram:

  • A similaridades das avaliações do tipo trial product estimand e treatment policy estimand com as análises por protocolo e por intenção de tratar, respectivamente;

  • Foi observada aparente ausência de platô de perda de peso ao final do estudo no grupo em uso da medicação, o que pode sinalizar um benefício mais duradouro do tratamento;

  • Há necessidade de cautela na interpretação do achado de superioridade em relação à liraglutida devido ao não-cegamento e ausência de correção para múltiplas hipóteses na comparação com o medicamento ativo;

  • Diferenças entre significância estatística e significância clínica de desfechos secundários;

  • Participação da indústria farmacêutica em todas as fases do estudo;

  • Diferenças e perspectivas futuras em relação a pramlintide, um análogo de amilina de curta-duração associado à perda de peso e redução da dose diária de insulina em pacientes com DM1 e DM2, porém com posologia inconveniente.

 

Pílula do Clube: neste estudo de fase 2, cagrilintide demonstrou superioridade ao placebo no controle da obesidade e sobrepeso em pacientes não-diabéticos em todas as doses testadas. Em doses elevadas, pode apresentar superioridade à liraglutida, com perfil semelhante de efeitos colaterais. A classe de medicamentos possui perspectivas futuras interessantes, porém com necessidade de estudos adicionais.

 

Discutido no Clube de Revista de 03/01/2022.

Weekly Lonapegsomatropin in Treatment-Naïve Children With Growth Hormone Deficiency: The Phase 3 heiGHt Trial

 Paul S Thornton, Aristides K Maniatis, Elena Aghajanova, Elena Chertok, Elpis Vlachopapadopoulou, Zhengning Lin, Wenjie Song, Eva Dam Christoffersen, Vibeke Miller Breinholt, Tatiana Kovalenko, Elene Giorgadze, Maria Korpal-Szczyrska, Paul L Hofman, David B Karpf, Aimee D Shu, Michael Beckert

 

J Clin Endocrinol Metab 2021, 106(11):3184-3195.

 https://academic.oup.com/jcem/article/106/11/3184/6323258?login=false


Embora o tratamento com somatropina diária seja seguro e forneça às crianças com deficiência de GH o potencial de atingir a estatura normal de um adulto, a frequência de injeção diária é onerosa, levando muitas vezes ao abandono. A lonapegsomatropina é um pró-fármaco de longa ação, aplicado uma vez por semana, para tratamento da deficiência do GH. Consiste na somatropina, um carreador de metioxi polietileno glicol inerte e um ligante TransCon (liga temporariamente a somatropina e o carreador). O carreador tem um efeito de proteção que minimiza a excreção renal e a depuração mediada pelo receptor. Após a autoclivagem do ligante em condições fisiológicas, a lonapegsomatropina libera, previsivelmente, somatropina dentro dos níveis terapêuticos ao longo de uma semana. A somatropina é liberada com sequência e tamanho idênticos ao GH endógeno e a terapia diária é projetada para manter o mesmo modo de ação, distribuição e sinalização intracelular que o GH endógeno. O objetivo do estudo foi avaliar a eficácia, a segurança e a tolerabilidade da lonapegsomatropina semanal versus somatropina diária por 52 semanas em crianças pré-púberes com deficiência do GH.

O desfecho primário foi a velocidade crescimento anual (cm/ano) após 52 semanas de tratamento e os desfechos secundários foram velocidade crescimento anual, escore desvio padrão para altura, IGF-1, escore desvio padrão para IGF-1, IGFBP-3, escore desvio padrão para  IGFBP-3 e idade óssea nos tempos pré-definidos ao longo das 52 semanas. Os desfechos de segurança incluíram a incidência de eventos adversos, tolerabilidade local, parâmetros laboratoriais e imunogenicidade. Trata-se de ensaio clínico randomizado, multicêntrico, de fase 3, aberto, ativamente controlado. O estudo incluiu meninos de 3 a 12 anos e meninas 3 a 11 anos sem tratamento prévio com deficiência do GH, no estágio 1 de Tanner, com escore desvio padrão de altura ≤ -2, IGF-1 ≤ -1, IMC dentro de ± 2 e idade óssea  ≥6 meses de atraso da idade cronológica.  Os pacientes com exposição prévia a terapias com GH ou IGF-1, história de malignidade (permitido se clinicamente curados), baixa estatura idiopática, pequeno para idade gestacional ou outras causas de baixa estatura não relacionadas à deficiência do GH, diagnóstico prévio/tratamento para outras condições que poderiam afetar crescimento e desnutrição foram excluídos. 

Foram recrutados pacientes de dezembro de 2016 a janeiro de 2019, e incluídos 161 pacientes, que foram randomizados 2:1 para o grupo lonapegsomatropina 1x/semana (0,24 mg/kg/sem) ou somatropina diária (0,034 mg/kg/dia; 0,1 UI/kg/dia) por via subcutânea durante 52 semanas (completaram o estudo 105 pacientes no grupo lonapegsomatropina e 56 no grupo somatropina diária). As características de base dos pacientes eram semelhantes nos dois grupos. A velocidade de crescimento anual e mudança do escore de desvio padrão da altura foi maior no grupo da lonapegsomatropina na semana 52. A média estimada de escore de desvio padrão de IGF-1 aumentou em ambos os grupos em relação à linha de base e ao longo do tempo, entretanto o grupo lonapegsomatropina atingiu um intervalo de IGF-1 de 0 a 2 mais cedo, com uma média mais alta quando comparado com a somatropina diária. A idade óssea avançou de forma semelhante nos dois grupos. Os níveis médios de glicose em jejum e hemoglobina glicada observados foram no geral estáveis ​​ao longo do tempo e foram mantidos dentro da faixa normal para ambos os grupos ao longo do ensaio. O escore de desvio padrão do IMC médio observado permaneceu dentro da faixa normal. As taxas médias de adesão foram de 99,6% para lonapegsomatropina e 98,6% para somatropina diária. Não houve efeitos adversos graves relacionados ao medicamento do estudo e nenhum evento adverso levou à descontinuação do tratamento. Reduções de dose ocorreram em 2 pacientes do grupo lonapegsomatropina devido a níveis elevados IGF-1 (assintomáticos) e em 1 paciente do grupo somatropina diária devido a edema facial.  Os seguintes pontos foram discutidos do Clube:

  • A análise foi de não inferioridade, entretanto não foram descritos na tabela esses resultados;

  • A lonapegsomatropina demonstrou não ser inferior ao tratamento padrão com somatropina diária, levando a crescimento adequado, mantendo relação IO/IC semelhante, com perfil de segurança e tolerabilidade semelhante;

  • As doses de ambos os medicamentos foram fixadas para comparação e não se teve ajustes conforme sensibilidade individual ao GH e no efeito do tratamento direcionado;

  • Necessário seguimento desses pacientes em longo prazo para avaliar efeitos no crescimento 

Pílula do Clube: a lonapegsomatropina levou a um crescimento adequado quando comparado à terapia com somatropina diária, sem aumento de efeitos adversos, podendo se tratar de uma futura opção no tratamento dos pacientes com deficiência de GH. 


Discutido no Clube de Revista de 13/12/2021.


One Year of GH Treatment for Growth Failure in Children with Anorexia Nervosa: A Randomized Placebo-Controlled Trial

 Juliane Léger, Anne Fjellestad-Paulsen, Anne Bargiacchi, Justine Pages, Didier Chevenne, Marianne Alison, Corinne Alberti and Sophie Guilmin-Crepon.


J Clin Endocrinol Metab 2021, 106(7):e2535-e2546.

https://academic.oup.com/jcem/article-abstract/106/7/e2535/6189807?redirectedFrom=fulltext


A anorexia nervosa (AN) é um distúrbio psiquiátrico grave caracterizado por privação nutricional crônica, intenso medo de ganhar peso e alteração da imagem corporal. Quando ocorre em crianças e adolescentes cursa com atraso puberal, baixa velocidade de crescimento (VC) e déficit mineral ósseo. O catch-up de crescimento nessa população é variável, sendo que 1/3 das meninas com AN terão baixa estatura na vida adulta. Sendo assim, o presente ensaio clínico randomizado, duplo cego, tem como objetivo avaliar a segurança do GH e seu efeito em crianças com AN.

No período de março de 2013 a março de 2017, 34 pacientes foram acompanhados para elegibilidade no estudo e após o fornecimento das informações sobre o mesmo, 14 pacientes foram incluídos. Os critérios de inclusão foram: diagnóstico estabelecido de AN; VC muito baixa (<2 cm/ano) por pelo menos 18 meses mesmo com melhora do status nutricional e estabilização clínica; idade cronológica entre 8 a 16 anos independente do sexo; estadio puberal de Tanner menor ou igual a II; idade óssea (IO) em meninas menor ou igual a 12 anos e meninos menor ou igual a 14 anos de idade. Já os critérios de exclusão foram: presença de outras doenças crônicas conhecidas e pacientes que receberam algum tratamento prévio que pudesse afetar o crescimento ou maturação óssea. Os pacientes foram divididos em dois grupos: um grupo recebeu GH subcutâneo (SC) diário na dose de 0,05 mg/Kg/dia e o outro recebeu injeção SC diária de placebo durante um ano. A randomização foi realizada com estratificação para sexo e IO. O desfecho primário do estudo foi a mudança na estatura basal comparada com o período de 12 meses e a avaliação da eficácia foi a mudança nos níveis de IGF-1 e IGF-BP3 em relação ao basal. 

O acompanhamento dos pacientes foi feito através de avaliação física, biológica e psiquiátrica que foram realizadas no basal, a cada 3 meses e depois de 1 ano. Para controle do uso dos medicamentos foram feitos questionários nas consultas e calendário de uso, além de serem recolhidas todas as embalagens (usadas ou não). As doses foram ajustadas conforme o peso do paciente e em relação ao controle do IGF-1, se apresentassem nível acima de 2,5 desvio-padrão (DP) para sexo, idade e estadio puberal em 2 medidas consecutivas, a dose foi reduzida em 10%. Foi realizada avaliação psiquiátrica pelas escalas de Impressão Clínica Global de Severidade e de Melhora (CGI-S e CGI-I) no basal e no mês 12. O tamanho amostral de 10 pacientes por grupo foi calculado para garantir um poder de 90% para detectar uma diferença esperada no ganho de altura após 1 ano entre os dois grupos de 4 cm e um DP de 2,5 com um limiar de significância de 0,05 e a análise foi por intenção de tratar. O paciente foi considerado respondedor quando a VC foi maior que 5 cm/ano ao final do tratamento. O grupo dos pacientes que recebeu GH teve um total de 8 pacientes e do grupo placebo 6 pacientes.

Os pacientes do estudo (8 meninas e 6 meninos) tinham em média 13,7 anos de idade na inclusão e uma duração mediana da doença de 2,6 anos; 6 pacientes eram pré-púberes e 8 haviam entrado na puberdade e estavam no estágio 2 de Tanner. A VC era baixa no basal dos dois grupos com média de 1 cm/ano. No grupo do GH ela aumentou significativamente nos primeiros 6 meses para 4,95 cm (P=0,045), mas ao final dos 12 meses essa diferença não foi significativa, que foi de 9,65 cm (P=0,08). No grupo placebo, a mudança na VC foi de 2,5 cm em 6 meses e 3,85 cm após 12 meses. A porcentagem de pacientes com VC maior que 5 cm/ano durante o período do estudo foi maior no grupo GH do que no grupo placebo (100% vs. 50% - P=0,05). Dentre os pacientes tratados, 63% apresentaram progressão puberal durante o período de estudo e do grupo placebo 83% apresentaram progressão, destacando melhorias em sua condição, como também ligeiro aumento do IMC em ambos os grupos. Os níveis séricos de IGF-1 e IGF-BP3 estavam baixos em ambos os grupos no basal e, como esperado, os valores de DP aumentaram no grupo GH, sem alteração significativa no grupo placebo. Não houve alteração significativa em relação à avaliação mineral óssea entre os grupos.

No início do estudo, os 2 grupos tinham pontuações CGI-S semelhantes, exceto 1 dos pacientes no grupo placebo (taxa CGI-S = 2) considerado como tendo doença grave, com uma pontuação ≥ 4. Aos 12 meses, 50% e 33% dos pacientes foram considerados como tendo doença não grave (pontuação ≤ 3), com diminuição de pelo menos 2 pontos na escala observada em 63% e 17% paciente nos grupos GH e placebo, respectivamente. Além disso, houve uma correlação positiva entre a melhora no escore CGI-S e o ganho de altura (P<0,0001). Com base na pontuação de melhoria CGI avaliada em 12 meses, uma melhora geral positiva na doença (pontuação ≤ 3) foi observada em todos os pacientes tratados com GH, mas 2 dos 6 pacientes no grupo de placebo (33%) apresentaram um agravamento da doença (pontuação ≥ 4). Os eventos adversos ocorreram em números semelhantes nos 2 grupos, foram leves ou não fatais e não levaram à interrupção do tratamento. O tratamento com GH foi bem tolerado e nenhum dos pacientes interrompeu o tratamento precocemente. No Clube foram discutidos os seguintes pontos:

  • O estudo teve um N muito pequeno, podendo ser um confundidor nos resultados;

  • Estadio puberal e melhorias no transtorno são confundidores potenciais;

  • O desenho do estudo poderia ter sido mais rigoroso para incluir mais pacientes, mas se sabe que a AN é uma condição mais rara e complexa em crianças.


Pílula do Clube: O estudo foi realizado com um número muito pequeno de pacientes e apesar do GH ter demonstrado melhora significativa na VC nos primeiros 6 meses, não podemos ter certeza se realmente seria uma intervenção efetiva em longo prazo.


Discutido no Clube de Revista de 06/12/2021.

Effect of TSH Suppression Therapy on Bone Mineral Density in Differentiated Thyroid Cancer: A Systematic Review and Meta-analysis

 Eu Jeong  Ku, Won  Sang  Yoo, Eun  Kyung Lee, Hwa  Young  Ahn Seung Hoon Woo, Jun Hwa Hong, Hyun Kyung Chung and Jin-Woo Park


J Clin Endocrinol Metab 2021, 106(12):3655-3667

https://academic.oup.com/jcem/article-lookup/doi/10.1210/clinem/dgab539


A supressão do TSH como terapia adjuvante do carcinoma diferenciado de tireoide (CDT) é amplamente utilizada. Este estudo visou avaliar o impacto desta medida na densidade mineral óssea dos pacientes. Trata-se de uma revisão sistemática e metanálise que incluiu coortes prospectivas, retrospectivas e estudos de caso-controle com pacientes com TSH suprimido pós-tireoidectomia por CDT, comparando-os a controles saudáveis. Foram excluídos da metanálise: estudos sem informação de DMO; comparação com controles não-saudáveis; método de DMO diferente de DXA (dual-energy X-ray absorptiometry); trabalhos de congressos; tireoidectomia por outros motivos que não CDT; estudos sem controle de outras doenças (ex: hipoparatireoidismo); ausência de definição clara da terapia de supressão do TSH; outros desenhos de estudo e artigos repetidos. O desfecho estudado foi a densidade mineral óssea em três segmentos corporais (coluna lombar, colo do fêmur e fêmur total).

Ao final da revisão sistemática, 17 estudos foram elegíveis para metanálise, com um total de 1824 pacientes. A análise foi dividida em mulheres pré-menopausa, mulheres pós-menopausa e homens. Houve redução da massa óssea na coluna lombar das mulheres em pós-menopausa (-0,03; -0,05, -0,02; P<0,01). Houve aumento da massa óssea na coluna lombar de mulheres em pré-menopausa (0,04; 0,02, 0,06; P<0,01) e no colo do fêmur em mulheres pré-menopausa (0,02; 0,01, 0,04; P=0,009). Não houve diferença entre os homens.

O estudo tem inúmeras limitações, dentre as quais o fato de uma metanálise e algumas coortes grandes não terem sido incluídas por falta de alguns dados; o fato de os estudos serem observacionais ou transversais; o fato de possíveis variáveis de confusão não terem sido controladas e o desfecho usado ter sido a densitometria óssea e não a incidência de fraturas ou outro desfecho duro. No Clube de Revista foram debatidas as limitações do estudo e mais alguns pontos:

  • A heterogeneidade dos estudos reduz a acurácia de seus resultados;

  • Não foi encontrado registro adequado do estudo e, portanto, coloca-se em dúvida seu planejamento e condução;

  • Resultados em mulheres pré e pós-menopausa podem se dever a outros fatores que não a terapia de supressão do TSH.


Pílula do Clube: este estudo gera a hipótese de que a terapia de supressão do TSH após tireoidectomia por câncer diferenciado de tireoide reduz a massa óssea de mulheres no período pós-menopausa e aumenta a de mulheres no período pré-menopausa. Entretanto, as limitações do estudo devem ser consideradas na análise de seus resultados. 


Discutido no Clube de Revista de 29/11/2021.

Relationship of Consistency in Timing of Exercise Performance and Exercise Levels Among Successful Weight Loss Maintainers

 Leah M. Schumacher, J. Graham Thomas , Hollie A. Raynor, Ryan E. Rhodes, Kevin C. O’Leary, Rena R. Wing, and Dale S. Bond 


Obesity (Silver Spring) 2019, 27(8):1285-1291.

https://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1002/oby.22535


A prática de atividade física regular está associada a manutenção de peso perdido a longo prazo e diversos benefícios à saúde. Apesar disso, muitos pacientes com obesidade têm dificuldade em manter uma rotina de exercícios que seja benéfica a saúde [150min/semana de atividade de  moderada-vigorosa intensidade (MVPA)] ou que promova manutenção da perda de peso (250 min/semana de MVPA). O National Weight Control Registry (NWCR) é uma base de dados dos EUA que avalia características e padrões de comportamento  entre os pacientes com sucesso na manutenção do peso perdido. Sabe-se que estes pacientes são consistentes na performance de comportamento associado ao peso seguindo dieta adequada, pesando-se regularmente e são também altamente ativos realizando MVPA de 40 min/dia. No entanto, a consistência temporal, nível de MVPA, horário, estímulo e automaticidade das atividades físicas é desconhecida. Nesse contexto, o objetivo deste estudo foi avaliar entre os participantes NWCR que reportaram MVPA em diversos dias por semana diferenças na proporção dos pacientes temporalmente consistentes versus inconsistentes, níveis de MVPA entre os temporalmente consistentes versus inconsistentes,  horário específico do dia entre os temporalmente consistentes  versus níveis de MVPA e MVPA versus automaticidade e estímulo aos exercícios (tempo, pessoas, trabalho, rotina, localização e humor).

Foram incluídos no estudo pacientes com idade ≥18 anos e perda de peso ≥ 13,6 kg mantida por ≥ 1 ano que reportassem ≥2 dias/semana de MVPA em medida validada de atividade física e cujas respostas fossem validas em medida de consistência temporal na performance de MVPA. O NWCR tem uma base de dados com mais de 10.000 participantes, os membros registrados foram recrutados desta base de dados já em andamento avisados pela mídia e no site do NWCR. Os pacientes que preenchiam os critérios de inclusão responderam um questionário de base e um questionário uma vez ao ano. Foram considerados elegíveis aqueles que completaram questionário anual desde julho de 2018 (data em que os dados sobre tempo e hábito foram acrescentados). No questionário eram realizadas perguntas de verdadeiro ou falso, número de dias ou então perguntas que permitiam respostas como “1 (não é verdade de jeito nenhum) até 7 (certamente verdade) e “1 (nunca) ou 2 (sempre)” sobre os seguintes dados: status temporal consistente e inconsistente; atividade física (número de dias de MVPA na semana e total de minutos de MVPA na semana); consistência do estímulo e automaticidade do exercício.

Quinhentos e nove participantes do NWCR completaram horário dos exercícios e seus hábitos, 134 foram excluídos e, então, 375 (73,4%) preencheram critérios de inclusão. A maioria dos participantes (68%) reportaram consistência temporal de MVPA. Estes indivíduos reportaram maior frequência de MVPA (4,8 ± 1,6 versus 4,4 ± 1,5 dias/semana; P=0,007) e duração (mediana [IQR]: 350 [200-510] versus 285 [140-460] min/semana; P=0,03) e eles também eram mais propensos a alcançar os níveis de MVPA recomendados nos guidelines  (≥150 min/semana) que os participantes temporalmente inconsistentes em seus exercícios (86,3% versus 74,2%, P=0,004). Dentre os temporalmente consistentes em seus exercícios, 47,8% praticavam os exercícios pela manhã, já os níveis de MVPA não diferiram conforme a hora do dia da performance dos exercícios (P>0,05). No Clube de Revista foram discutidos os seguintes pontos:

  • O fato de tratar-se de estudo observacional carrega consigo vieses inerentes ao desenho, não podendo ser afimada causalidade das associações encontradas;

  • O estudo foi realizado em uma população específica (NWCR), não é possível generalizar tais achados para outras populações. Além disso, os níveis de atividade física foram auto-reportados e podem ser enviesados e superestimados e a avaliação de MVPA por questionário e não acelerômetro dificulta comparar os achados com outros estudos;

  • Os membros do NWCR são altamente consistentes em comportamentos para manutenção do peso perdido e nessa população com hábito já estabelecido talvez o horário do dia seja menos importante. É possível que a atividade física de manhã seja importante para criar o hábito do exercício.


Pílula do Clube: este estudo observacional nos permitiu avaliar os hábitos de uma população bem sucedida na manutenção do peso perdido sugerindo que realizar exercícios no mesmo horário do dia (em especial pela manhã) pode auxiliar a alcançar maiores níveis de atividade física. 


Discutido no Clube de Revista em 22/11/2021.

Semaglutide and Cardiovascular Outcomes in Obesity without Diabetes

  A. Michael Lincoff, Kirstine Brown‐Frandsen, Helen M. Colhoun, John Deanfield, Scott S. Emerson, Sille Esbjerg, Søren Hardt‐Lindberg, G. K...