sábado, 8 de agosto de 2020

Glycaemic control targets after traumatic brain injury: a systematic review and meta-analysis

 Jeroen Hemanides, Mark P. Plummer, Mark Finnis, Adam M. Deane, Jonathan P. Coles and David K. Menon


Critical Care 2018, 22:11

https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC5775599/


O controle glicêmico dos pacientes criticamente enfermos continua sendo alvo de discussão em terapia intensiva. A pesquisadora Greet Van den Berghe, nos anos 2000, publicou uma série de estudos em que demonstrava que o controle glicêmico intensivo se associava à redução importante da mortalidade, especialmente em pacientes cirúrgicos. Já o grande estudo NICE-SUGAR, publicado em 2009, com mais de 6.000 pacientes, encontrou associação entre controle glicêmico intensivo e aumento de mortalidade em pacientes críticos clínicos e cirúrgicos. Dessa forma, ainda se questiona qual o alvo glicêmico ideal para esta população. Dentro dos pacientes internados em Unidades de Terapia Intensiva (UTIs), um grupo que ganha especial atenção é daqueles que sofreram traumatismo cranioencefálico (TCE). 

Esta revisão sistemática com metanálise comparou o que denominou de tratamento glicêmico intensivo (alvo de glicemia abaixo de 126 mg/dL) com tratamento glicêmico convencional (alvo de glicemia mais liberal, acima de 126 mg/dL) em pacientes acima de 16 anos que sofreram TCE. Foram incluídos 10 ensaios clínicos randomizados, com pouco mais de 500 pacientes em cada grupo. Os desfechos primários incluíam mortalidade, incapacidade neurológica, hipoglicemia e ocorrência de infecções. Não houve diferença estatística entre os grupos em termos de mortalidade na UTI, no hospital, em 30 e em 90 dias. Com relação à incapacidade neurológica, apesar de diferentes escalas de funcionalidade terem sido utilizadas, também não houve diferença de desfecho entre os grupos. Notoriamente, o grupo submetido a controle glicêmico intensivo apresentou maior incidência de hipoglicemia severa, definida como glicemia abaixo de 40 mg/dl, quando comparado ao tratamento convencional. A heterogeneidade de definições acerca de infecção nos diferentes estudos impossibilitou a realização de metanálise com relação a este desfecho, mas a maioria dos estudos também não encontrou diferença entre os grupos. No Clube de Revista, foram discutidos os seguintes pontos:

  • Entre os pontos fortes do estudo, destacam-se a estratégia de busca bem definida, população bem especificada, busca por dados não publicados e em todos os idiomas. O protocolo de pesquisa também seguiu a recomendação PRISMA;

  • Em termos de vieses dos estudos, a maior crítica se dá pela ausência de cegamento dos participantes e dos pesquisadores;

  • Com relação ao desenho dos estudos, somente três deles foram realizados exclusivamente em pacientes com TCE, sendo que os demais estudos forneceram dados de subgrupos;

  • Outra crítica se refere à ausência de análise dos pacientes de acordo com a existência prévia de diabetes, já que se sabe que a tolerância desses pacientes à hiperglicemia de stress durante a doença crítica é maior quando comparada a pacientes com bom controle metabólico previamente à internação;

  • Nota-se também a existência de uma heterogeneidade clínica na classificação e no tempo de avaliação dos desfechos neurológicos dos pacientes, possivelmente com tal desfecho avaliado de forma ainda precoce (média de 3 meses);

  • Havia também diferenças de métodos de monitorização da glicemia entre os estudos, podendo haver dificuldade de captar hipo ou hiperglicemia quando a monitorização não era realizada de forma contínua. 


Pílula do Clube: Essa revisão sistemática com metanálise corrobora os dados previamente conhecidos para pacientes criticamente doentes, não podendo recomendar alvos glicêmicos diferentes para o subgrupo de pacientes com TCE até o momento. Além disso, o controle glicêmico intensivo se associou de à maior ocorrência de hipoglicemia.


Discutido no Clube de Revista de 29/06/2020.


Long-term Effects of Radioiodine in Toxic Multinodular Goiter: Thyroid Volume, Function, and Autoimmunity

 Catarina Roque, Francisco Sousa Santos, Tania Pilli, Gilda Dalmazio, Maria Grazia Castagna, and Furio Pacini


J Clin Endocrinol Metab 2020, 105(7):dgaa214.

https://academic.oup.com/jcem/articleabstract/105/7/dgaa214/5823841?redirectedFrom=fulltext


Dispomos de dados escassos sobre o uso de doses fixas de radioiodo (RAI) no tratamento do bócio multinodular tóxico (BMT) e seus efeitos a longo prazo. Este estudo observacional de uma coorte italiana selecionou 153 adultos com BMT, submetidos ao tratamento com dose fixa de iodo 15mCi, e avaliou os efeitos a longo prazo. Foram avaliados os seguintes desfechos: redução do volume tireoidiano, tempo para redução máxima (nadir) e reganho, função tireoidiana e autoimunidade. 

Quanto ao volume tireoidiano, o tempo de seguimento médio foi de 6,2 ± 2,9 anos. A redução do bócio foi mais significativa no primeiro ano após o iodo (30 ± 17,8%; P<0,001), apresentando queda progressiva nos anos subsequentes, principalmente após o 4º ano. A redução do volume durante o primeiro ano não teve correlação com o volume inicial do bócio (r=0,058). A maioria (60%) dos pacientes atingiu nadir entre o 3-6º ano após RAI (média 3,9 ± 2,2 anos). Houve reganho de volume em 21,8% casos (média 4,4 ± 6,9 mL no 1º ano), porém o volume ao final do seguimento era menor do que o pré-tratamento em todos os pacientes (P=0,005). 

Quanto à função tireoidiana, a taxa de cura ao final do seguimento de 5,7 ± 2,6 anos foi de 89% (61,6% eutireoidismo e 27,4% hipotireoidismo). O tempo médio para o aparecimento do hipotireoidismo foi de 2,7 ± 2,4 anos, com uma incidência anual 4,6% nos primeiros 5 anos e 1,4% após. Durante os 3 primeiros anos de tratamento, a taxa de pacientes com hipertireoidismo reduziu 50% por ano, mostrando que 82% dos pacientes que estavam hipertireoideos ao final do 6º mês ficaram curados ao final do 3º ano. Quanto aos anticorpos, foi observado que a positivação do TRAB está associada a um aumento na recidiva de hipertireoidismo (P=0,004). Durante o Clube de Revista foram discutidos os pontos a seguir:

  • A seleção da amostra, cálculo amostral e perdas não foram bem descritos no estudo;

  • Pacientes em uso prévio de metimazol tinham o medicamento suspenso 20 dias antes do RAI e não há menção de uma justificativa para tal conduta. Este tempo maior do que o necessário e recomendado poderia colocar em maior risco pacientes idosos ou com comorbidades (estudo também não avaliou comorbidades da população);

  • Os dados sobre o assunto são escassos e, apesar das limitações deste estudo, ele nos traz informações úteis sobre a redução de volume e taxas de cura a longo prazo nos pacientes com BMT;

  • Considerando os potenciais efeitos adversos da tireoidectomia (hipoparatireoidismo e disfonia por lesão laríngeo recorrente) e os resultados encontrados, o iodo deve ser considerado sempre que possível no manejo dos pacientes com BMT.


Pílula do Clube: a dose fixa de 15 mCi para tratamento do BMT parece ser segura e efetiva, com altos índices de cura do hipertireoidismo e manutenção da perda de volume tireoidiano a longo prazo.


Discutido no Clube de Revista de 22/06/2020.


Diagnostic Accuracy of Computed Tomography to Exclude Pheochromocytoma: A Systematic Review, Meta-Analysis, and Cost Analysis

 Edward Buitenwerf, Annika M A Berends, Antoinette D I van Asselt, Tijmen Korteweg, Marcel J W Greuter, Nic J M Veeger, Thera P Links, Robin P F Dullaart, Michiel N Kerstens 


Mayo Clin Proc 2019, 94(10):2040-2052.

https://www.mayoclinicproceedings.org/article/S0025-6196(19)30394-5/fulltext

 

O incidentaloma adrenal é definido como uma massa ou nódulo adrenal detectado em estudos de imagem que foram realizados por outros motivos que não suspeita de doença adrenal. Segundo os guidelines atuais, sugere-se que todos os pacientes diagnosticados com incidentaloma adrenal realizem tomografia computadorizada (TC) sem contraste e exames laboratoriais a fim de descartar a possibilidade de se tratar de um nódulo maligno e /ou com função secretória. Faz parte desta avaliação a realização de rastreamento para feocromocitoma, usualmente através da dosagem de metanefrinas séricas ou urinárias, exames que possuem uma série de desvantagens, incluindo desconforto para o paciente e especificidade variável conforme diversos fatores pré-analíticos. Considerando estudo publicado em 2018 na Revista Europeia de Endocrinologia, em que somente um dos 222 feocromocitomas avaliados apresentava densidade inferior ou igual a 10 HU na TC sem contraste, os autores sugerem então, que talvez o rastreamento de rotina para feocromocitoma seja desnecessário nos pacientes cujo nódulo apresenta densidade inferior ou igual a 10 HU na TC sem contraste.

O objetivo da revisão sistemática foi avaliar a acurácia diagnóstica da TC sem contraste para excluir o diagnóstico de feocromocitoma em pacientes com incidentaloma adrenal, através da estimativa do teste índice (index test), que neste estudo é a sensibilidade diagnóstica. O objetivo da análise de custo é calcular a diferença de custos laboratoriais entre a estratégia vigente e a estratégia sugerida (testar as metanefrinas somente nos pacientes com densidade acima de 10 HU na TC sem contraste). 

Foi realizada a busca nas bases de dados MEDLINE e Embase utilizando os termos de busca pheochromocytoma, adrenal incidentaloma, computed tomography, e attenuation, a fim de encontrar artigos em inglês, alemão, francês e holandês que reportaram valores de atenuação de feocromocitomas na TC sem contraste. Foram excluídas publicações com menos de 5 feocromocitomas. Todas as publicações foram revisadas independentemente por 2 avaliadores, submetidas a avaliação de qualidade através da ferramenta QUADAS-2 (para estudos diagnósticos), e foram extraídas informações como desenho do estudo, protocolo de TC, protocolo da medida da atenuação, valores de atenuação sem contraste e características demográficas dos participantes. O risco de viés de publicação foi avaliado através de gráfico de funnel plot, e a heterogeneidade entre os estudos foi calculada pelos testes Q de Cochran e Higgins I².  A sensibilidade foi calculada como a proporção combinada entre os estudos de feocromocitomas com atenuação > 10 HU na TC sem contraste, e o valor preditivo negativo (VPN) foi estimado para diferentes valores de especificidade, assumindo a prevalência de feocromocitoma de 5,6% e a sensibilidade estimada pelo próprio estudo. Foi realizada estimativa do número necessário para testar (number needed to screen - NNS), correspondente ao número de incidentalomas adrenais com atenuação 10 HU que precisam ser testados para diagnosticar 1 feocromocitoma. A análise de custo foi realizada calculando o custo total por paciente para cada estratégia diagnóstica, conforme detalhado em um fluxograma. O modelo de cálculo matemático assumiu prevalência de feocromocitoma de 5,6%, prevalência de 10% de incidentalomas nas TCs sem contraste, frequência de atenuação inferior ou igual a 10 HU dentre os incidentalomas de 69% e sensibilidade e especificidade das metanefrinas séricas de 98,6 e 95,1%, respectivamente. Foram incluídos os custos de retestagem das metanefrinas, realizadas em 38% dos pacientes com metanefrinas acima do normal. Os valores em dólares para tomografia e para a dosagem de metanefrinas séricas foram de 221 e de 89, respectivamente.

Dentre as 2.957 publicações encontradas, após remoção de duplicatas, resumos e aplicação de critérios de elegibilidade, restaram 31 estudos, que, segundo os autores, apresentaram baixo risco de viés de publicação, baixo risco de viés de seleção e qualidade adequada segundo a ferramenta QUADAS-2. Apesar disso, apenas 23% dos estudos apresentavam padronização dos parâmetros de aquisição e reconstrução das TCs, 45% descreveram adequadamente a região de interesse de aferição da atenuação (ROI) e somente 32% dos estudos informou voltagem da TC de 120 kV, este último parâmetro de particular interesse, pois se sabe que a voltagem interfere diretamente nos valores de atenuação obtidos. Não foi observada heterogeneidade entre os estudos. Dentre os 1.167 feocromocitomas com valores de atenuação na TC sem contraste, apenas 6 apresentaram atenuação inferior ou igual a 10 HU, 3 deles devido a componente intralesional cístico, necrótico ou hemorrágico. A sensibilidade (proporção combinada de pacientes com atenuação > 10 HU) foi de 0,990 (IC 95%, 0,984 - 0,995), com valores muito semelhantes também em análises de subgrupos. O VPN, caracterizado pela proporção de verdadeiros negativos entre todos os indivíduos com teste negativo, foi estimado para diferentes valores de especificidade, sempre muito próximo a 100%. O NNS calculado foi de 1.232. Na análise de custo, inclusive nas análises por sensibilidade probabilística, a diferença de custo calculada entre as duas estratégias foi de 63 dólares por paciente. Os seguintes pontos foram discutidos no Clube da Revista:

  • A voltagem da TC influencia diretamente nos valores de atenuação aferidos, e somente 38% das publicações informava este parâmetro, questionando-se assim a confiabilidade das aferições;

  • É imprescindível adequada aferição da atenuação nas TCs, para reduzir erros e evitar que áreas de necrose, liquefação ou hemorragia sejam erroneamente incluídas na região de interesse, como aconteceu em 3 dos casos incluídos;

  • Os resultados obtidos foram muito sólidos, com sensibilidade da TC com atenuação superior a 10 HU de 99%, superior inclusive à sensibilidade das metanefrinas séricas que consta na literatura;

  • A estratégia proposta possui vantagens como: reduzir o desconforto para os pacientes e reduzir os custos para o sistema público de saúde, considerando que são necessários testar metanefrinas de 1.232 pacientes com TC ≤ 10 HU para diagnosticar 1 feocromocitoma.

 

Pílula do Clube: incidentalomas adrenais com atenuação 10 HU têm valor preditivo negativo para feocromocitoma muito próximo a 100% (independente da especificidade), que, associado a baixa probabilidade pré-teste desta patologia (prevalência de somente 5,6%), resulta em baixíssima probabilidade pós-teste do diagnóstico de feocromocitoma nestes pacientes.

 

Discutido no Clube de Revista de 15/06/2020.


Use of sodium-glucose co-transporter 2 inhibitors and risk of serious renal events: Scandinavian cohort study

Bjorn Pasternak, Viktor Wintzell, Mads Melbye, Bjorn Eliasson, Ann-Marie Svensson, Stefan Franzen, Soffia Gudbjornsdottir, Kristian Hveem, Christian Jonasson, Henrik Svanstrom, Peter Ueda


BMJ 2020, 369:m1186

https://www.bmj.com/content/369/bmj.m1186.long


Atualmente se sabe que o diabetes tipo 2 (DM2) é a principal causa de falência renal. Os inibidores de SGLT2 (iSGLT2) são uma classe de hipoglicemiantes que também atuam na redução da pressão arterial, do peso e da albuminúria. Grandes ensaios clínicos mostraram que esta classe de fármacos tem efeitos benéficos nos desfechos renais. No estudo CREDENCE, pacientes DM2 com doença renal crônica (DRC) tiveram menor taxa de desfecho renal composto (falência renal, dobrar nível de creatinina e morte por causa renal) ao receber canagliflozina versus placebo (HR 0,66, intervalo de confiança [IC] 95%, 0,53 a 0,81). O mesmo aconteceu com pacientes DM2 com alto risco cardiovascular que receberam canagliflozina no programa CANVAS (HR 0,58  IC95% 0,50 a 0,67) e empagliflozina no ensaio EMPAREG OUTCOME (HR 0,61  IC95% 0,53 a 0,70). Estes dados fornecem evidências sobre o efeito nefroprotetor dos iSGLT2, mas na prática clinica diária, onde há maior heterogeneidade de pacientes, este efeito ainda é incerto.

Este é um estudo de coorte baseado em registros de dados nacionais da Suécia, Dinamarca e Noruega para avaliar se o uso de iSGLT2 versus um comparador ativo (inibidor de dipeptilpeptidase4 - iDPP4) mostraria associação com redução de risco de eventos renais graves. Foi usado delineamento de novo usuário e comparador ativo para diminuir risco de confundidores por indicação, gravidade da doença e características clínicas não medidas. Os iDPP4 são drogas usadas em situações clínicas semelhantes, como hipoglicemiantes de 2ª e 3ª linha e não demonstraram até então mudança em desfechos renais com seu uso. Foram incluídos pacientes de 35 a 84 anos dos três países no momento em que se deu a primeira prescrição de iSGLT2 ou iDPP4. Foram excluídos os pacientes que tinham recebido uma das drogas do estudo nos dois anos anteriores, sem contato com especialista no ano anterior, histórico de doença renal ou outra doença terminal, abuso de drogas, doenças pancreáticas graves, hospitalização nos últimos 30 dias. Foi usada regressão logística para estimar a probabilidade de iniciar uma droga ou outra, condicionada ao status de 57 covariáveis na entrada ao estudo, dentre elas características sociodemográficas, comorbidades, outros medicamentos em uso e hospitalizações recentes, formando um escore de propensão.  Foram pareados novos usuários de iSGLT2 e iDPP4 em taxa de 1:1. O desfecho primário foi a composição de terapia de substituição renal, morte por causas renais e internação por causas renais, conforme análise de registros médicos e de atestados de óbito. Desfechos secundários foram cada componente do desfecho primário. Os pacientes foram acompanhados da entrada na coorte até que ocorresse um desfecho, morte, emigração, três anos completos ou o final do estudo. A exposição foi analisada por intenção de tratar.  

Ao todo, 38.273 novos usuários de iSGLT2 e 107.854 novos usuários de iDPP4 preencheram critérios de elegibilidade. Após pareamento, as coortes incluíram 29.887 novos usuários de iSGLT2 e o mesmo número de iDPP4. As covariáveis nos dois grupos foram bem balanceadas (<10% de diferença). Apenas 3,3% tinham história de DRC e 18,6% de doença cardiovascular maior. O tempo médio de seguimento para usuários de iSGLT2 foi de 1,4 anos e para iDPP4 foi de 2 anos. A maioria dos pacientes usou dapagliflozina entre os iSGLT2 (66,1%) e sitagliptina entre os iDPP4 (64,8%). O uso de iSGLT2 em comparação com iDPP4 foi associado a uma redução significativa de eventos renais graves: taxa de incidência 2,6 eventos por 1000 pessoas/ano vs. 6,2 eventos por 1000 pessoa/ano (HR 0,42 IC95% 0,34 a 0,53). Na análise dos desfechos secundários, o uso de iSGLT2 comparado com iDPP4 foi associado om um risco significativamente menor de terapia de substituição renal (taxa de incidência 0,8 vs. 2,5 por 1.000 pessoas/ano; HR 0,32 IC95% 0,22 a 0,47) e de internação hospitalar por eventos renais (2,0 vs. 4,9 por 1.000 pessoas/ano; HR 0,41 IC95% 0,32 a 0,52), mas não a morte por causas renais (0,2 vs. 0,2 por 1000 pessoas/ano; HR 0,77 IC95% 0,26 a 2,23). Na análise por subgrupos, as taxas de risco foram menores para pacientes com histórico de doença cardiovascular do que para aqueles sem (0,30 vs. 0,52; P=0,022) e para aqueles com histórico de doença renal crônica versus aqueles sem (0,18 vs. 0,52; P <0,001).  Os seguintes pontos foram discutidos no Clube de Revista:

  • Por ser um estudo de vida real, traz a vantagem de analisar pacientes não selecionados de maneira rigorosa, representando melhor a complexidade da prática clinica diária; mas pelo mesmo motivo (não-seleção) não é capaz de eliminar completamente os fatores de confusão;

  • Limitações atreladas ao delineamento observacional, em que a exposição ao fármaco foi definida a partir de registros de prescrição, não sendo possível diferenciar pacientes aderentes ou não ao tratamento;

  • Não houve uma descrição clara sobre o uso prévio ou durante o estudo de outros fármacos hipoglicemiantes e de anti-hipertensivos pelos pacientes, que podem ser confundidores significativos;

  • Por ter sido conduzido na região da Escandinávia, a generalização para outras populações é desconhecida.


Pílula do Clube: o uso de iSGTL2 quando comparado ao uso de iDPP4 parece diminuir a taxa de eventos renais em cenário clínico mais próximo da vida real e em magnitude semelhante àquela observada nos ensaios clínicos randomizados que testaram esses fármacos.


Discutido no Clube de Revista de 08/06/2020.

sábado, 20 de junho de 2020

Five-Year Outcomes of Gastric Bypass in Adolescents as Compared with Adults


Thomas H Inge, Anita P Courcoulas, Todd M Jenkins, Marc P Michalsky, Mary L Brandt, Stavra A Xanthakos, John B Dixon, Carroll M Harmon, Mike K Chen, Changchun Xie, Mary E Evans, Michael A Helmrath, Teen–LABS Consortium

N Engl J Med 2019, 380(22):2136-2145.

A cirurgia bariátrica representa uma alternativa terapêutica efetiva para perda de peso em pacientes com obesidade e também na melhora de doenças crônicas que esses pacientes apresentam no contexto pré-cirúrgico. Diversas evidências sugerem que os pacientes que procuram e são submetidos a procedimentos bariátricos têm maior prevalência de comorbidades como diabetes, hipertensão, dislipidemia, disfunção renal e respiratória, limitações para deambular e edema venoso de membros inferiores quando esses pacientes já se apresentavam obesos desde a sua adolescência. Assim, o presente estudo propõe analisar desfechos em 5 anos após bypass gástrico em Y de Roux em uma coorte de adolescentes comparado a uma coorte de adultos submetidos ao mesmo procedimento e que eram obesos na adolescência. Os autores tinham como hipótese que a realização da cirurgia bariátrica em pacientes com obesidade severa obteria maiores taxas de remissão de comorbidades quando realizada precocemente.
            O estudo incluiu pacientes de dois grandes estudos observacionais, prospectivos, multicêntricos que avaliaram casos consecutivos de cirurgia bariátrica. O estudo Teen-LABS incluiu o total 242 pacientes de idade menor ou igual a 19 anos, em 5 centros diferentes, entre os anos de 2006 e 2012. Cerca de 70% dessa amostra foi submetida ao procedimento de bypass gástrico em Y de Roux, sendo incluídos no estudo apresentado 161 pacientes adolescentes. Já os pacientes adultos foram selecionados do estudo intitulado LABS, que incluiu pacientes obesos com mais de 18 anos, em 10 centros, entre os anos de 2006 e 2009. De um total de 2.458 pacientes, 1.738 realizaram bypass gástrico em Y de Roux e 396 desses fechavam critérios para obesidade quando estavam na idade de 18 anos, o que foi avaliado por meio de aplicação de questionários, e realizaram o procedimento entre as idades de 25 e 50 anos. Em ambos os delineamentos os pacientes foram avaliados na época da cirurgia (até 30 dias antes do procedimento), 6 meses no período pós-operatório, e após anualmente até fechar cinco anos de acompanhamento.
Foram determinados como desfechos primários a variação de peso e IMC em 5 anos, a remissão de diabetes tipo 2 (definida como HbA1c inferior a 6,5% ou glicemia de jejum inferior a 126 mg/dL na ausência do uso de hipoglicemiantes) e de hipertensão arterial (pressão arterial sistólica inferior a 140 mmHg e diastólica inferior a 90 mmHg na ausência do uso de anti-hipertensivos). Foram também analisados como desfechos secundários a hipoferritinemia (definida como ferritina sérica inferior a 10 ug/L em mulheres e inferior a 20 ug/L em homens), hipovitaminose B12 (definida como vitamina B12 sérica inferior a 145 pg/mL) e a ocorrência de novos procedimentos abdominais. Para análise estatística foram utilizados os modelos mistos linear e de Poisson e, para calcular a taxa de novos procedimentos abdominais, foi utilizado a regressão de Poisson sendo a taxa de incidência expressa em número de evento a cada 500 pessoas-ano.
            Não houve diferença na porcentagem de variação de peso entre adolescentes (-26%; intervalo de confiança [IC] 95%, -29 até -23) e adultos (-29%, IC 95%, -31 até -27) em 5 anos após a cirurgia bariátrica (P=0,08). Entretanto, os adolescentes apresentaram maior probabilidade que os adultos de remissão de diabetes tipo 2 (86% vs. 53%; razão de risco de 1,27; IC 95%, 1,03 a 1,57) e de hipertensão (68% vs. 41%; razão de risco de 1,51; IC 95%, 1,21 a 1,88). Três adolescentes (1,9%) e sete adultos (1,8%) morreram no seguimento de 5 anos pós-procedimento. A taxa de incidência de novos procedimentos abdominais foi maior entre adolescentes que em entre adultos (19 vs. 10 reoperações por 500 pessoas-ano, P=0,003). Em relação aos desfechos nutricionais, em dois anos de seguimento os adolescentes apresentaram menores níveis de ferritina que os adultos (72 de 132 pacientes [48%] vs. 54 de 179 pacientes [29%], P=0,004), assim como menores níveis de 25-hidroxivitamina D (38%; IC 95%, 28 a 51, vs. 24%, IC 95%, 18 a 32, P=0,02). Não houve uma incidência expressiva de hipovitaminose B12 ao longo dos dois anos de seguimento analisados (4% dos pacientes em ambas as coortes). Os seguintes pontos foram discutidos no Clube:
·         Estudo com limitações atreladas ao delineamento observacional, mas principalmente pela dificuldade de se ter um grupo controle quando já existe uma proposta de tratamento cirúrgico estabelecido;
·         Os autores não apresentam, no artigo principal e nem no apêndice, qual foi o tempo total das comorbidades, principalmente de diabetes tipo 2;
·         Adolescentes naturalmente apresentam menor tempo de comorbidades, o que poderia influenciar a facilidade em que esses pacientes apresentam para remissão;
·         Adolescentes sustentaram menos a perda de peso do que os adultos ao longo dos 5 anos de seguimento. Essa observação sugere reganho de peso e necessidade de nova abordagem terapêutica na vida adulta, porém em um paciente no contexto pós-cirúrgico, submetido a mudanças anatômicas e nutricionais decorrentes da cirurgia bariátrica;
·         Não se sabe como a cirurgia bariátrica pode influenciar a vida fértil e o efeito na prole dos pacientes que se submetem ao procedimento durante a adolescência;
·         Adolescentes apresentaram maior taxa de reoperação abdominal, o que pode implicar em maior risco de comorbidades cirúrgicas;
·         Uma discussão mais profunda sobre o impacto psicológico e no abuso de substâncias que a cirurgia bariátrica pode impor ao paciente adolescente é necessária, uma vez que essa população vive em processo dinâmico de desenvolvimento psíquico, anatômico, hormonal e fisiológico.

Pílula do Clube: Adolescentes apresentam remissão de diabetes tipo 2 e hipertensão após cinco anos de bypass gástrico em Y de Roux mais frequentemente que adultos, porém esse mesmo grupo esteve envolvido com maior necessidade de novos procedimentos abdominais e deficiências nutricionais.

Discutido no Clube de Revista de 25/05/2020.

domingo, 31 de maio de 2020

Six-Month Randomized, Multicenter Trial of Closed-Loop Control in Type 1 Diabetes


S.A. Brown, B.P. Kovatchev, D. Raghinaru, J.W. Lum, B.A. Buckingham, Y.C. Kudva, L.M. Laffel, C.J. Levy, J.E. Pinsker, R.P. Wadwa, E. Dassau, F.J. Doyle III, S.M. Anderson, M.M. Church, V. Dadlani, L. Ekhlaspour, G.P. Forlenza, E. Isganaitis, D.W. Lam, C. Kollman, and R.W. Beck, for the iDCL Trial Research Group

N Engl J Med 2019, 381:1707-17.

         O pâncreas artificial (SlimX2-Control-IQ), tecnologia recentemente aprovada no tratamento do diabetes, consiste em uma bomba de insulina, que libera este hormônio de forma automatizada, dito sistema em alça fechada. Informações provenientes da monitorização contínua de glicose (CGM) por sensor são enviadas a um dispositivo e analisadas por um algoritmo, que calcula as doses de insulina fornecidas pela bomba.
O International Diabetes Closed Loop (iDCL) trial, um estudo randomizado, aberto, realizado em 6 centros dos Estados Unidos, comparou o pâncreas artificial com uma bomba de insulina associada ao uso de CGM (grupo controle) em pacientes diabéticos tipo 1. Foi avaliado como desfecho primário a diferença na porcentagem de tempo no alvo (glicemia 70-180 mg/dL) ao final de 26 semanas entre os dois grupos. Desfechos secundários incluíam porcentagem de tempo > 180 mg/dL, concentração média de glicose, HbA1c em 26 semanas, porcentagem de tempo < 70 mg/dL e < 54 mg/dL. O estudo foi financiado pela Tandem Diabetes Care e pelo National Institute of Diabetes and Digestive and Kidney Diseases. Foram incluídos pacientes ≥14 anos de idade, em tratamento com múltiplas doses de insulina ou em uso de bomba de insulina, sem restrição de níveis de HbA1c. Excluídos aqueles em uso de medicações antidiabéticas, exceto metformina, com diáteses hemorrágicas ou qualquer outra condição que o investigador considerasse de risco. Foram considerados elegíveis 170 pacientes, sendo realizado um período de run-in que variava de 2-8 semanas, de acordo com o uso prévio de bomba ou CGM, para coleta de dados e treinamento dos pacientes. Visitas de seguimento ocorreram em 2, 6, 13 e 26 semanas e contatos telefônicos em 1, 4, 9, 17 e 21 semanas, momentos em que foi realizado o download de dados dos aparelhos de monitorização. A HbA1c foi avaliada no rastreamento, randomização, 13 e 26 semanas. Houve uma falha no software em março de 2019, que foi suspenso por medida de segurança, afetando 33 pacientes por um período de 4 semanas, em que a bomba foi utilizada em sistema aberto. A análise dos dados foi por intenção de tratar e as diferenças entre os grupos foram ajustadas para o nível basal da variável, idade, uso prévio de CGM, bomba de insulina e centro clínico. Foi solicitada a comunicação de eventos adversos durante o estudo.
Entre 12 de julho de 2018 e 09 de outubro de 2018, foram randomizados 168 indivíduos (2:1), sendo alocados 112 para o grupo intervenção e 56 para o grupo controle. Os grupos eram balanceados, sendo que 50% eram mulheres, maioria caucasianos, ≥18 anos, 79% usavam bomba de insulina e 86% CGM. Não houve perda de seguimento nem descontinuação de tratamento em ambos grupos. Quanto ao desfecho primário, a porcentagem média de tempo no alvo, aumentou de 61±17% do basal para 71±12% em 6 meses no pâncreas artificial e permaneceu inalterada em 59±14% no grupo controle (IC95%, 9 - 14; P<0,001), o que corresponde a uma diferença média de 2,6 horas/dia a mais no alvo. Esse benefício foi evidenciado já no primeiro mês e consistente ao longo do período do estudo, bem como foi visto no período diurno e noturno da monitorização. Houve diferença favorecendo o grupo intervenção em todos os desfechos secundários. Após 6 meses, a diferença média (pâncreas artificial – controle) na porcentagem de tempo em que os níveis de glicose ficavam < 70 mg/dL foi -0,88 (IC95% -1,19 a -0,57; P<0,001) e de HbA1c -0,33 pontos percentuais (IC95% -0,53 a -0,13; P=0,001). Não houve hipoglicemias severas em ambos grupos; mais eventos adversos reportados no grupo intervenção, com um episódio de cetoacidose diabética por falha no dispositivo de infusão.  Não houve diferença nas doses de insulina entre os grupos. Os seguintes pontos foram discutidos no Clube da Revista:
·         Os pacientes do estudo eram extremamente selecionados, a maioria já fazia uso de bomba de insulina e CGM, estavam familiarizados com esta tecnologia e encontravam-se vinculados a entidades de excelência, questionando-se assim a validade externa;
·         Houve mais eventos adversos no grupo intervenção e descritos múltiplos problemas com o sistema (bomba e software). Ocorreu um período de 4 semanas de suspensão do software por falha, em que pacientes permaneceram em alça aberta;
·         Grupo controle não possuía função de suspensão da infusão de insulina se hipoglicemia, o que poderia explicar a diferença encontrada entre os grupos neste parâmetro;
·         Os autores descrevem que as diferenças encontradas se mantinham quando feita análise de subgrupos, porém com o n do estudo fica difícil realizar tal inferição.

Pílula do Clube: No período de 6 meses, o percentual de tempo no alvo foi 11% maior no pâncreas artificial em comparação ao grupo controle, bem como houve menos episódios de hipoglicemia e melhora da hemoglobina glicada nesse grupo. No entanto, as possíveis falhas demonstradas no sistema e a aplicabilidade desses resultados são limitações importantes.

Discutido no Clube de Revista de 11/05/2020.

Teprotumumab for the Treatment of Active Thyroid Eye Disease


R.S. Douglas, G.J. Kahaly, A. Patel, S. Sile, E.H.Z. Thompson, R. Perdok, J.C. Fleming, B.T. Fowler, C. Marcocci, M. Marinò, A. Antonelli, R. Dailey, G.J. Harris, A. Eckstein, J. Schiffman, R. Tang, C. Nelson, M. Salvi,  S. Wester, J.W. Sherman, T. Vescio, R.J. Holt, and T.J. Smith

N Engl J Med 2020, 382(4):341-352.

Trata-se de ensaio clínico randomizado, duplo-cego, multicêntrico, que avaliou a eficácia e a segurança do teprotumumabe, em comparação ao placebo, no tratamento da oftalmopatia associada à doença de Graves em atividade em 24 semanas. Foram incluídos adultos (18-80 anos) com oftalmopatia moderada a severa, em atividade e sem tratamento prévio, que apresentassem 1 das características a seguir: retração palpebral ≥ 2 mm, envolvimento moderado a severo de partes moles, proptose ≥ 3 mm acima da normalidade para raça e sexo, diplopia periódica ou constante, CAS (Clinical Activity Score) ≥ 4 e início dos sintomas dentro dos 9 meses antes do recrutamento. Pacientes com acometimento do nervo óptico, portadores de doença inflamatória intestinal, de diátese hemorrágica, de malignidade, de HIV e/ou hepatites virais foram excluídos.
Após recrutamento, os pacientes foram randomizados (1:1) para receber teprotumumabe ou placebo uma vez a cada três semanas durante 21 semanas, totalizando 8 infusões. A dose administrada de teprotumumabe foi de 10 mg/Kg na primeira infusão e de 20 mg/Kg nas infusões subsequentes. A última avaliação clínica foi realizada na 24ª semana. Os pacientes, os investigadores e a equipe foram cegados, e a exoftalmometria foi realizada com o mesmo exoftalmômetro de Hertel e pelo mesmo avaliador em cada centro.
O desfecho primário foi a resposta da proptose, caracterizada por redução da proptose em ≥ 2 mm em relação ao basal, sem que houvesse aumento de ≥ 2 mm no olho contralateral, em 24 semanas. Os desfechos secundários incluíam resposta geral (redução de ≥ 2 pontos no CAS e de ≥ 2 mm na proptose), redução do CAS para 0 ou 1, variação na proptose (mm), no grau de diplopia (conforme Gorman Diplopia Score) e na escala de qualidade de vida (GO-QOL). Foram avaliados desfechos de segurança com destaque para eventos adversos de maior interesse, como reações relacionadas à infusão, hiperglicemia, espasmo muscular, diarreia e alterações auditivas. Em um único centro nos EUA, 6 pacientes foram submetidos a exame de imagem da órbita antes e depois do tratamento com objetivo de avaliar o efeito nos tecidos extraorbitários. A análise foi por intenção de tratar.
Foram randomizados 83 pacientes, 41 para o grupo do teprotumumabe e 42 para o grupo placebo; destes, 39 e 40 completaram o estudo, respectivamente. Quanto às características basais, os grupos eram semelhantes, com média de idade de 50 anos, sendo a maioria do sexo feminino (70%), da raça branca (87%) e não fumante (80%); apresentavam proptose de aproximadamente 23 mm, CAS de 5,0 e função tireoidiana com valores médios dentro da normalidade.
Na 24ª semana, a resposta da proptose foi observada em 83% e 10% dos pacientes que receberam teprotumumabe e placebo, respectivamente (diferença de 73 [59 a 88], IC95%, P < 0,001). A significância estatística foi mantida na análise por protocolo. Todos os desfechos secundários foram melhores no grupo do teprotumumabe em relação ao placebo, incluindo a resposta geral (78% vs. 7%, P < 0,001), o CAS de 0 ou 1 (59% vs. 21%), a proptose (-2,82 vs. -0,54 mm, P < 0,001), a diplopia (68% vs. 29%, P < 0,001) e a escala GO-QOL (13,79 vs. 4,43 pontos, P < 0,001). Com exceção da escala GO-QOL, a melhora de todos dos desfechos foi observada logo no início do tratamento, na 6ª semana, sustentando-se até a 24ª semana. Nos pacientes que foram avaliados com exame de imagem (N = 6), houve redução tanto do volume total da musculatura extraocular (35%) quanto do volume de tecido adiposo (17%).  Os eventos adversos foram, em sua maioria, de intensidade leve a moderada, e os especial interesse ocorreram em < 5% dos pacientes de cada grupo. No grupo do teprotumumabe, dois pacientes apresentaram evento adverso grave e somente um dos eventos foi atribuído à medicação (reação durante a infusão), levando à descontinuação do tratamento. No Clube de Revista, foram discutidos os seguintes pontos:
·         Embora os resultados sejam robustos, ressalta-se a necessidade de comparação da droga com glicocorticoide que, além de ser o tratamento de primeira linha, tem custo expressivamente menor;
·         É necessária a avaliação do tratamento em longo prazo, com ênfase na durabilidade do efeito e nos eventos adversos;
·         O benefício do teprotumumabe em pacientes com orbitopatia leve em atividade ainda não foi estudado.

Pílula do Clube: O teprotumumabe, em concordância com estudo prévio de fase II, foi superior ao placebo na redução da proptose e na melhora do CAS, da diplopia e da qualidade de vida de pacientes com doença de Graves e oftalmopatia moderada a severa em atividade, com efeito rápido e sustentado no período de 24 semanas. No entanto, são necessários estudos que o comparem com o tratamento de primeira linha dessa condição.

Discutido no Clube de Revista de 27/05/2020.

sábado, 14 de março de 2020

Lower versus Traditional Treatment Threshold for Neonatal Hypoglycemia


van Kempen AAMW, Eskes PF, Nuytemans DHGM, van der Lee JH, Dijksman LM, van Veenendaal NR, van der Hulst FJPCM, Moonen RMJ, Zimmermann LJI, van 't Verlaat EP, van Dongen-van Baal M, Semmekrot BA, Stas HG, van Beek RHT, Vlietman JJ, Dijk PH, Termote JUM, de Jonge RCJ, de Mol AC, Huysman MWA, Kok JH, Offringa M, Boluyt N; HypoEXIT Study Group.

N Engl J Med 2020, 382(6):534-544.

            Trata-se de ensaio clínico randomizado, controlado, multicêntrico, de não inferioridade, realizado na Holanda, que teve como objetivo comparar dois limiares de glicemia para tratamento de hipoglicemia moderada assintomática em recém-nascidos (RNs) saudáveis sobre o desenvolvimento psicomotor aos 18 meses. Os critérios de inclusão eram RNs com IG ≥35 semanas, peso ao nascer ≥2000 g, indicação de rastreio de hipoglicemia (prematuridade, PIG, GIG, mãe com DM), sem outras patologias. Os critérios de exclusão foram: hipoglicemia grave inicial (glicemia ≤35 mg/dL), asfixia perinatal grave, necessidade de suporte de vida, malformações congênitas ou síndromes, necessidade de glicose IV antes da randomização e suspeita de hiperinsulinemia ou erro inato do metabolismo. Os RNs foram divididos em prematuros (IG 35-37 sem), PIG (peso ao nascer <p10), GIG (peso ao nascer >p90) e filhos de mãe com DM e randomizados para o limiar para receber tratamento da hipoglicemia assintomática entre 3-24h de vida em <36 mg/dL (grupo do limiar baixo) vs. <47 mg/dL (grupo do limiar tradicional). O rastreio da hipoglicemia era feito com glicemia capilar antes das refeições nos horários de 3, 6, 9, 12, 18 e 24h de vida. As intervenções para correção da hipoglicemia eram realizadas de acordo com o protocolo de cada hospital, podendo ser alimentação oral suplementar, alimentação por sonda ou administração IV de glicose, individualizando caso a caso. O desfecho primário foi o desenvolvimento psicomotor aos 18 meses avaliado pela escala de Bayley-III-NL, sendo considerada clinicamente significativa diferença de 7,5 pontos entre os grupos (reflete atraso de 1 mês no desenvolvimento). Os desfechos secundários foram: nº de glicemias capilares realizadas, necessidade de alimentação suplementar oral, por sonda ou glicose IV, duração do aleitamento materno, nº de hipoglicemias, duração da internação hospitalar e custos com assistência médica.
            Foram randomizados 348 RNs para o grupo do limiar baixo (93 prematuros, 105 PIGs, 107 GIGs, e 43 filhos de mãe DM) e 341 para o grupo do limiar tradicional (86 prematuros, 99 PIGs, 117 GIGs, e 39 filhos de mãe DM). Não houve diferença na escala de Bayley-III-NL entre os grupos de limiar baixo vs. tradicional, tanto na população geral como em cada subgrupo. O grupo do ponto de corte de 36 mg/dl necessitou de menos medidas de glicemia capilar e intervenções terapêuticas, porém teve maior frequência de hipoglicemias. O NNT para evitar 1 RN da administração intravenosa de glicose foi 7, da alimentação por sonda foi 12 e da suplementação oral foi 5. Não houve diferença na duração da internação hospitalar e dos custos em saúde entre os grupos. Houve 2 eventos adversos graves: um RN com convulsão durante normoglicemia e uma morte por infecção respiratória, ambos no grupo de limiar baixo, considerados não relacionados à intervenção. Durante o Clube de Revista, foram discutidos os seguintes pontos:
·         Os autores não deixaram claro como dividiram os pacientes que se encaixavam em mais de um subgrupo (ex: prematuro e PIG, GIG filho de mãe com DM);
·         Um estudo de não-inferioridade deve idealmente incluir análise por protocolo. Os autores justificaram a ausência desta análise por o manejo da hipoglicemia ser individualizado e de acordo com cada centro, podendo haver desvios da estratégia de tratamento atribuída após randomização;
·         O estudo não atingiu o tamanho de amostra necessário, calculado como 200 pacientes em cada subgrupo (apenas o subgrupo GIG atingiu esse n). No caso dos prematuros e PIGs, os resultados encontrados são válidos pois as diferenças na escala de Bayley-III-NL foram muito pequenas e com intervalos de confiança estreitos. Por outro lado, o n de RNs filhos de mãe com DM foi bem abaixo do esperado, não se podendo tirar conclusões neste subgrupo por falta de poder estatístico;
·         Os resultados não devem ser extrapolados para RNs com hipoglicemia que persiste por >2 dias de vida, IG <35 sem, PN <2000 g ou com outras doenças/quadros agudos (ex: sepse);
·         A avaliação do desenvolvimento foi realizada apenas com 18 meses de vida. No entanto, muitos aspectos cognitivos/sociais/de linguagem emergem após essa idade, fazendo necessário reavaliação desses pacientes com idade maior.

Pílula do Clube: em neonatos saudáveis, com idade gestacional de 35 semanas ou mais e peso ao nascer de pelo menos 2000 g, o ponto de corte de glicemia de 36 mg/dl para manejo de hipoglicemia assintomática parece ser não inferior ao ponto de 47 mg/dl no que diz respeito ao desenvolvimento psicomotor aos 18 meses.

Discutido no Clube de Revista de 09/03/2020.

Semaglutide and Cardiovascular Outcomes in Obesity without Diabetes

  A. Michael Lincoff, Kirstine Brown‐Frandsen, Helen M. Colhoun, John Deanfield, Scott S. Emerson, Sille Esbjerg, Søren Hardt‐Lindberg, G. K...