quarta-feira, 25 de outubro de 2023

Cardiovascular Safety of Testosterone - Replacement Therapy

 A.M. Lincoff, S. Bhasin, P. Flevaris, L.M. Mitchell, S. Basaria, W.E. Boden, G.R. Cunningham, C.B. Granger, M. Khera, I.M. Thompson, Jr., Q. Wang, K. Wolski, D. Davey, V. Kalahasti, N. Khan, M.G. Miller, M.C. Snabes, A. Chan, E. Dubcenco, X. Li, T. Yi, B. Huang, K.M. Pencina, T.G. Travison, and S.E. Nissen, for the TRAVERSE Study Investigators* 


N Engl J Med 2023; 389:107-117

https://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMoa2215025 


O estudo TRAVERSE foi realizado para determinar os efeitos da terapia de reposição de testosterona na incidência de eventos cardiovasculares maiores em homens de meia-idade e idosos com hipogonadismo e histórico prévio ou alto risco de doença cardiovascular. O objetivo era preencher uma lacuna existente sobre os efeitos cardiovasculares da terapia de reposição de testosterona, já que estudos anteriores forneceram resultados conflitantes. 

Trata-se de um estudo de fase 4, randomizado, duplo-cego, controlado por placebo, de não inferioridade. Foi realizado em 316 locais de ensaios clínicos nos Estados Unidos e foi financiado por um consórcio de fabricantes de testosterona liderados pela AbbVie. Incluiu homens com doença cardiovascular pré-existente ou alto risco cardiovascular, entre 45 e 80 anos de idade. Os critérios de elegibilidade incluíam a presença de um ou mais sintomas de hipogonadismo, como diminuição do desejo sexual, ereções espontâneas reduzidas, fadiga ou diminuição de energia, humor deprimido, redução de pelos corporais ou menor frequência de barbear, e ondas de calor. Além disso, os participantes deveriam ter níveis de testosterona sérica em jejum < 300 ng/dl, obtidos entre as 5h as 11h da manhã. Doença cardiovascular foi definida como evidência clínica ou angiográfica de doença arterial coronariana, doença cerebrovascular ou doença arterial periférica. O aumento do risco cardiovascular foi definido como a presença de três ou mais dos seguintes fatores de risco: hipertensão, dislipidemia, tabagismo atual, DRC estágio 3, diabetes, nível elevado de proteína C reativa de alta sensibilidade, idade ≥ 65 anos, ou um escore de cálcio coronariano > p75 para idade e raça.

Os pacientes foram divididos aleatoriamente em uma proporção de 1:1 para receber gel de testosterona transdérmico a 1,62% diariamente ou um gel de placebo correspondente. A randomização foi estratificada de acordo com a presença ou ausência de doença cardiovascular pré-existente. 

O desfecho primário de segurança foi a primeira ocorrência de qualquer componente do MACE, uma combinação de morte por causas cardiovasculares, infarto não fatal ou acidente vascular cerebral não fatal em uma análise de tempo até o evento. O desfecho secundário foi a primeira ocorrência de qualquer componente do MACE ou revascularização coronariana em uma análise de tempo até o evento. 

5.246 pacientes foram randomizados e 5.204 pacientes foram incluídos na análise completa, 2.601 foram designados para receber testosterona e 2.603 foram designados para receber placebo. A população de segurança incluiu 5.198 pacientes que receberam pelo menos uma dose de testosterona ou placebo (2.596 pacientes no grupo testosterona e 2.602 no grupo placebo). No decorrer do estudo, dados cegos dos primeiros 2.669 pacientes mostraram uma taxa combinada de eventos primários abaixo da taxa projetada de 1,5% ao ano. Por isso, em 31 de maio de 2019, foi descontinuada a inscrição de pacientes qualificados com base em fatores de risco cardiovascular e, posteriormente, inscreveram apenas aqueles com doença cardiovascular preexistente. Ao final do acompanhamento, 372 eventos do desfecho primário ocorreram e 306 foram qualificados para a análise de sensibilidade principal, que inclui os eventos que ocorreram desde a randomização até 365 dias após a última dose, com censura de dados sobre eventos que ocorreram mais de 365 dias após a última dose de testosterona ou placebo.

O estudo incluiu 2.847 pacientes com doença cardiovascular preexistente e 2.357 pacientes com risco cardiovascular elevado. A mediana do nível basal de testosterona sérica foi de 227 ng/dL. As durações médias (±DP) de tratamento e acompanhamento, respectivamente, foram 21,8±14,2 e 33,1±12 meses no grupo testosterona e 21,6±14 e 32,9±12,1 meses no grupo placebo. Um total de 61,4% dos pacientes do grupo testosterona descontinuou a reposição e 61,7% dos pacientes do grupo placebo descontinuaram o placebo. Um total de 1.082 pacientes (20,8%) retirou-se do estudo antes do início das consultas de final de estudo, e outros 947 pacientes (18,2%) não compareceram à consulta de final de estudo após essa data. 

Um evento do desfecho primário ocorreu em 182 pacientes (7%) no grupo de testosterona e em 190 pacientes (7,3%) no grupo de placebo (taxa de risco, 0,96; IC 95% 0,78 a 1,17; P<0,001 para não inferioridade). Na análise de sensibilidade principal, um evento primário de segurança ocorreu em 154 pacientes (5,9%) no grupo de testosterona e em 152 pacientes (5,8%) no grupo placebo (taxa de risco, 1,02; IC 95% 0,81 a 1,27; P<0,001 para não inferioridade). Ocorreu uma maior incidência de embolia pulmonar no grupo da testosterona do que no grupo placebo (0,9% vs. 0,5%).

Não houve diferença em relação a incidência de diagnóstico de câncer de próstata, apesar do grupo da testosterona ter tido um aumento maior dos níveis de PSA (0,20±0,61 ng/ml vs. 0,08±0,90 ng/ml; P<0,001). Arritmias não fatais que necessitaram de intervenção ocorreram em 134 pacientes (5,2%) no grupo testosterona e em 87 pacientes (3,3%) no grupo placebo (P=0,001); fibrilação atrial ocorreu em 91 pacientes (3,5%) no grupo testosterona e 63 pacientes (2,4%) no grupo placebo (P = 0,02), e lesão renal aguda ocorreu em 60 pacientes (2,3%) no grupo testosterona e 40 pacientes (1,5%) no grupo placebo (P =0,04). Os seguintes pontos foram discutidos no Clube:

  • Pontos fortes: desenho prospectivo, duplo-cego e multicêntrico; grande tamanho da amostra; eventos do desfecho primário escolhidos foram significativos clinicamente;

  • Limitações apontadas: financiado por um consórcio de farmacêuticas fabricantes de testosterona; critérios de inclusão discutíveis, os sintomas atribuíveis ao hipogonadismo foram muito amplos e inespecíficos, o que possivelmente levou a inclusão de pacientes com sintomas que não eram atribuídos a esta patologia. Grande proporção de descontinuidade do tratamento em ambos os grupos;

  • Considerando que grande parte dos pacientes era obeso, deveria ter sido descrito o cálculo da testosterona livre e dosagem de SHBG, já que, nestes casos, poderia tratar-se de um hipogonadismo funcional onde a reposição de testosterona não é o tratamento de escolha;

  • Além das limitações já mencionadas, temos dúvidas em relação à análise dos resultados com base na população de segurança, em vez da análise por protocolo, o que seria mais apropriado para um estudo de não inferioridade.


Pílula do Clube: Levando em consideração as limitações mencionadas e a descontinuação considerável do tratamento, não podemos afirmar com segurança, com base neste estudo, que a reposição de testosterona seja segura do ponto de vista cardiovascular para esse grupo de pacientes. 


Discutido no Clube de Revista de 26/06/2023.

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