sábado, 27 de agosto de 2022

Revisitando “Randomized trial of aromatase inhibitors, growth hormone or combination in pubertal boys with idiopathic short stature”

 Nelly Mauras, Judith L Ross, Priscila Gagliardi, Y. Miles Yu, Jobayer Hossain, Joseph Permuy, Ligeia Damaso, Debbie Merinbaum, Ravinder J. Singh, Ximena Gaete, Veronica Mericq

J Clin Endocrinol Metab 2016, 101(12):4984-4993.

https://academic.oup.com/jcem/article-abstract/101/12/4984/2765085/Randomized-Trial-of-Aromatase-Inhibitors-Growth?redirectedFrom=fulltext


Em 18/04/2022 foi discutido o artigo acima, que já havia sido discutido há cerca de 5 anos no clube de revista (link aqui: http://clubederevistaendo.blogspot.com/2017/09/randomized-trial-of-aromatase.html). O estudo ainda é o mais cidado sobre o tema no plataforma Pubmed. 

Este ensaio clínico randomizado, multicêntrico e aberto foi avaliado o impacto dos inibidores de aromatase (IA) vs. hormônio do crescimento (GH) vs. tratamento combinado (TC) no tratamento de baixa estatura idiopática (BEI) em meninos púberes. O objetivo principal não foi apresentado de maneira clara pelos autores.

A definição de BEI utilizada pelo estudo foi de estatura ≤ -2 desvios padrão (DP) para sexo e idade em pacientes de tamanho normal ao nascer em que haviam sido descartadas patologias hormonais, esqueléticas e sistêmicas, e com resposta ao teste do estímulo do GH e/ou IGF-1 normais. A definição na literatura de BEI, além dos aspectos acima descritos, inclui demonstração de proporções corporais normais, bem como ausência de cromossomopatias - fatores esses não avaliados na população

A amostra foi composta por 76 meninos de 12 a 18 anos, com puberdade iniciada e diagnóstico de baixa estatura idiopática, com de crescimento (definido por idade óssea menor que 14 anos e 6 meses) e virgens de tratamento. Não foram explicitados os critérios de não-inclusão. Os pacientes foram captados em 3 centros de atendimento endocrinológico ambulatorial (EUA e Chile). Não há menção de cálculo amostral e de poder estatístico no artigo ou nos materiais suplementares.

Os pacientes foram randomizados 1:1:1 para receber tratamento com GH (dose média de 0,12 UI/Kg/dia) ou IA (anastrazol 1mg ou letrozol 2,5 mg) ou TC por 24 meses. Ao final deste período, os pacientes que ainda tinham potencial de crescimento foram convidados a manter o tratamento por mais 12 meses; destes, 19 completaram o tratamento no total de 36 meses. Setenta e um pacientes foram seguidos até a estatura quase-final. As medicações foram fornecidas em espécie pela indústria. 

As mudanças em DP da altura para sexo e idade dos participantes foram resultados destacados pelo grupo de pesquisadores. Os pacientes apresentavam no início estatura média de 144,8 cm (-2,3 DP). Ao final do período de 24 meses apresentavam altura -1,73 DP no grupo IA, -1,43 no grupo GH e −1,25 no grupo TC. 

O ganho em centímetros foi comparável nos três grupos ao final de 36 meses de tratamento - IA, +23,8 (2,3) cm // GH, +26,7 (2,0) cm // TC +30,7 (1,1) cm. Porém, o tratamento por 36 meses mostrou-se superior ao tratamento por 24 meses em ganho estatural (P < 0,0001 36 vs 24 meses). O ganho em cm em relação à linha de base ao fim de 24 meses foi estatisticamente superior no grupo do TC: IA +18,2 (1,6) cm // GH +20,6 (1,5) cm // AI/GH +22,5 (1,4) cm (P 0,01 entre todos os grupos e 0,002 entre AI e grupos AI/GH). 

Também foi descrita comparação do crescimento da população em estudo vs o crescimento descrito na literatura para pacientes com altura e idade semelhantes a fim de  demonstrar a  importância dos achados do estudo. O crescimento da população analisada foi superior ao esperado (+10cm em 2 anos em pacientes com estatura -2DP) e a altura quase final dos pacientes (altura com 97% do crescimento completado conforme RX de Idade Óssea) foi superior ao -2DP: esperado 161 cm // GH 164,8 cm // IA 164,1 cm // TC 166,9 cm. Apesar da altura quase-final ter sido superior no tratamento combinado, esta diferença não teve significância estatística (P=0,12)

Houve uma comparação entre o grau de supressão hormonal e aumento da testosterona total (T) no grupo que utilizou diferentes IAs (anastrazol vs letrozol). O grupo que usou letrozol apresentou maior elevação de T. Foi destacado durante o Clube de Revista que utilizar dois tipos de IA foi uma escolha controversa em um estudo com tamanho amostral pequeno que não parece ter poder para fazer tal análise de subgrupos. 

Foi realizada análise de segurança dos medicamentos e houve relato de um efeito adverso grave no grupo de TC - escorregamento de epífise femorais capital provavelmente relacionado ao medicamento do estudo (GH) e ao aumento do IMC do sujeito (90º percentil). Demais aspectos foram semelhantes entre os grupos e as medicações foram consideradas seguras pelos pesquisadores.

Não foi determinada alteração na saúde óssea através de avaliação por densitometria óssea após o período de tratamento na população do estudo. O TC pareceu ter efeito superior na composição corporal dos pacientes ao fim do estudo (acúmulo de massa livre de gordura superior em 4 Kg no grupo TC P = 0,015)

O desfecho primário cadastrado no ClinicalTrials.gov - mudança na estatura predita baseada na idade óssea ao final de 24 meses - não aparece descrito no estudo. Demais aspectos são condizentes com o registro. Há inúmeras comparações de crescimento entre os grupos relatadas no artigo, o que torna a confiabilidade nas mesmas duvidosa. Ainda, o estudo não declarou conflitos de interesse apesar da contribuição da indústria farmacêutica. 

O estudo não demonstrou que o uso de GH combinado com IA é superior ao uso das medicações isoladamente quanto à estatura quase-final alcançada em meninos com baixa estatura idiopática em puberdade, mas com potencial de crescimento. Surgiram dúvidas quanto à indicação de tratamento para BEI e se haveria conflito ético na inclusão de grupo controle uma vez que o uso de GH para BEI é liberado pelo FDA desde 2003. A discussão do grupo não foi conclusiva nesse aspecto. O tratamento da BEI parece ter efeito positivo na qualidade de vida conforme artigo publicado pelo mesmo grupo no ano seguinte (disponível em https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/31557127/).


Discutido no Clube de Revista de 18/04/2022.


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