Simon P. Mooijaar, Robert S. Du Puy, David J. Stott,
Patricia M. Kearney, Nicolas Rodondi, RudiG. J. Westendorp, Wendy P. J. den
Elzen, Iris Postmus, Rosalinde K. E.
Poortvliet, Diana van Heemst, Barbara C. van Munster, Robin P. Peeters, Ian
Ford, Sharon Kean, Claudia-Martina Messow, Manuel R. Blum, Tinh-HaiCollet, Torquil Watt, Olaf M.
Dekkers, J. Wouter Jukema, Johannes W. A. Smit, Peter Langhorne, Jacobijn
Gussekloo.
JAMA 2019, Oct 30:1-11.
Em
2017, foi publicado um ensaio clínico randomizado (TRUST) que avaliou o efeito
do tratamento com Levotiroxina nos sintomas relacionados à tireoide de
pacientes com ≥ 65 anos e com hipotireoidismo subclínico, não sendo observada diferença
entre o grupo intervenção e o grupo placebo. Nesse estudo, foi incluído um
número reduzido de pacientes com ≥ 80 anos e, portanto, não é claro se o
tratamento do hipotireoidismo subclínico traria algum benefício na redução de
sintomas e na qualidade de vida dessa população. O presente estudo tem como
objetivo avaliar a associação do tratamento do hipotireoidismo subclínico com a
qualidade de vida relacionada à tireoide em adultos com 80 anos ou mais, e
é resultado da combinação dos dados de dois ensaios clínicos randomizados,
duplo-cegos e controlados por placebo: (1) estudo IEMO (Institute
for Evidence-Based Medicine in Old Age), ainda não publicado, e (2) subgrupo de participantes
do TRUST, previamente citado. Foram incluídos adultos com ≥ 80 anos, TSH
entre 4,6 e 19,9 mIU/L e valores de T4L normais, ambos confirmados em três
medidas no período de 3 anos. Foram excluídos pacientes em uso de medicações
capazes de interferir na função tireoidiana (levotiroxina, antitireoidiano,
amiodarona, lítio), com cirurgia recente na tireoide ou submetidos a Iodoterapia
e portadores de comorbidade grave, como demência, hospitalização recente,
doença terminal, insuficiência cardíaca classe IV e evento cardíaco recente. Os
desfechos primários foram a mudança, em relação ao basal, nos escores de
sintomas de hipotireoidismo e de fadiga, provenientes do questionário ThyPRO, aos
12 meses de intervenção. Os desfechos secundários, avaliados aos 12 meses e na
última visita, incluíam mudança no TSH, nos escores de qualidade de vida
(EuroQol-5D, EuroQol-VAS), nos escores de atividade de vida diária (Barthel), no
grau de dependência, no desempenho físico (handgrip) e cognitivo, assim como variações no peso, no IMC
e na pressão arterial. Também foram avaliados eventos cardiovasculares fatais e
não-fatais, morte por qualquer causa e os eventos adversos de maior interesse:
fibrilação atrial, insuficiência cardíaca, fraturas e desenvolvimento de
hipotireoidismo. A análise foi por intenção de tratar e, como foram realizadas
duas comparações primárias, valores de P < 0,025 foram considerados com
significância estatística.
Foram
elegíveis para randomização 105 participantes do IEMO e 146 do TRUST. Do total
de 251 pacientes, 112 foram randomizados para o grupo Levotiroxina e 139 para o
grupo placebo. A média de idade dos participantes foi de 84,6 anos, 118 (47%)
eram do sexo feminino e quase a totalidade era autodeclarada da raça branca;
além disso, apresentavam TSH discretamente elevado (valor médio em torno de 6,4
mIU/L e mediano de 5,7 mIU/L), e a maioria vivia de forma independente
(>90%). Quanto às características basais, os grupos eram semelhantes entre
si, exceto pela presença de maior percentual de cardiopatia isquêmica no grupo
placebo em comparação ao grupo da Levotiroxina. Em 12 meses de tratamento, houve
queda do TSH de 6,2 para 5,4 mIU/L no grupo placebo e de 6,5 para 3,69 no grupo
da Levotiroxina (diferença média entre os grupos de -1,9 mIU/L; IC95%, -0,49 a
-1,45; P < 0,001). No mesmo período, o escore de sintomas de hipotireodismo
variou de 21,7 para 19,2 e de 19,8 para 17,4 no grupo da Levotiroxina e no
grupo placebo, respectivamente (diferença ajustada de 1,3 [IC95%, -2,7 a 5,2];
P = 0,53); no escore de fadiga, foi observada variação de 25,5 para 28,2 no
grupo que recebeu a Levotiroxina, e de 25,1 para 28,7 no grupo placebo (diferença
ajustada de -0,1 [IC95%, -4,5 a 4,3]; P = 0,96). Quanto aos desfechos
secundários, foi observado maior IMC (diferença média entre os grupos de 0,38
[IC95%, 0,08-0,68]; P = 0,01) e maior circunferência da cintura (diferença
média entre os grupos de 1,52 cm [IC95%, 0,019-2,95]; P = 0,04) nos pacientes
que usaram Levotiroxina em comparação ao placebo. Não foi observada diferença
estatística entre os grupos nos demais escores que avaliaram qualidade de vida,
atividades de vida diária, desempenho físico e cognitivo, tanto aos 12 meses
quanto na última visita, e o tratamento com Levotiroxina não foi associado ao
aumento de eventos cardiovasculares, de mortalidade e de outros eventos de
maior interesse (acima descritos). No Clube de Revista, foram discutidos os
seguintes pontos:
·
Os achados do presente estudo são provenientes
da combinação de dados de dois ensaios clínicos que, embora com metodologia
muito semelhante e resultados coerentes, não tornam dispensável a realização de
uma revisão sistemática/metanálise do assunto;
·
A população é predominantemente composta por
idosos independentes e com poucos sintomas, dificultando a percepção do impacto
do tratamento na qualidade de vida;
·
O status imunológico dos pacientes não foi
avaliado, o que permitiria identificar pacientes com maior risco de evolução
para hipotireoidismo;
·
A diferença encontrada no IMC e na
circunferência da cintura foi pequena e atribuída ao elevado número de
comparações.
Pílula
do clube: Em adultos com 80 anos ou mais, o tratamento do
hipotireoidismo subclínico com Levotiroxina, em comparação ao placebo, não foi
significativamente associado à melhora dos sintomas de hipotireoidismo e de
fadiga.
Discutido no Clube de Revista de 11/11/2019.
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