Claudia R. L. Cardoso, Juliana V. Melo, Guilherme C. Salles, Nathalie
C. Leite e Gil F. Salles
Diabetologia. 2018 Nov;61(11):2266-2276
O
índice tornozelo-braquial (ITB) é usado para diagnóstico de doença arterial
periférica, mas seu uso como marcador prognóstico em pacientes com diabetes
tipo 2 (DM2) é controverso. O presente estudo avaliou o valor prognóstico do
ITB para a ocorrência de complicações microvasculares e macrovasculares e
mortalidade por todas as causas em pacientes com DM2. Por meio de uma coorte
prospectiva, 668 pacientes foram arrolados e avaliados de 2004 a dezembro de
2017. Foram incluídos adultos com até 80 anos, com DM2 e complicações micro ou
macrovasculares, ou dois fatores de risco modificáveis. Todos os pacientes tiveram
o ITB avaliado, foram coletados exames e feita MAPA24h. O desfecho primário foi
o desenvolvimento de qualquer complicação micro ou macrovascular.
Do
total de pacientes, 156 participantes (23,4%) tiveram ITB ≤ 0,9, e ao comparar
os pacientes com ITB ≤ 0,9 com os com ITB > 0,9, os com ITB menor eram mais idosos,
com IMC menor, mais fumantes (tanto ativos, como no passado), com maior tempo
de diabetes e maior uso de estatinas, e apresentavam maior taxa de complicações
micro e macrovasculares. Pacientes com ITB ≤ 0,9 tiveram mais complicações
macrovasculares (eventos cardiovasculares totais, eventos cardiovasculares
maiores, mortalidade cardiovascular e mortalidade por todas as causas) do que o
outro grupo (P<0,001). Não tiveram diferença em relação à retinopatia e
albuminúria, e tiveram maior declínio da função renal e maior incidência/piora
da neuropatia periférica. Quando o ITB foi avaliado tanto como variável
categórica (≤ 0,9 vs. > 0,9), quanto como variável contínua
(decréscimo de 0,1), com ajustes para idade e sexo, e com ajustes para
múltiplas variáveis, as alterações macrovasculares mantiveram-se maiores nos
pacientes com ITB mais baixo, exceto na mortalidade não cardiovascular, que não
mostrou significância estatística: mortalidade cardiovascular em paciente com
ITB ≤ 0,9, com análise multivariada teve HR 2,71 (IC95% 1,37 a 5,36; P <
0,01), e manteve-se também o aumento de risco em paciente com menor ITB e
neuropatia periférica. Indivíduos com < 65 anos com ITB ≤ 0,9 tiveram risco
2,5 vezes maior (IC95% 1,4-4,6; P=0,003) de ter um MACE (evento cardiovascular
maior), enquanto mais velhos tiveram risco 1,1 vezes maior (IC95% 0,6-2,1; P=0,76)
em análises ajustadas (P para interação = 0,007). Ao se avaliar a C
statistic e o índice IDI, o primeiro não teve significância estatística, e
o segundo mostrou aumento na discriminação de risco apenas para eventos
macrovasculares (não mostrou significância ao se avaliar a neuropatia
periférica). No Clube de Revista, os
seguintes pontos foram discutidos:
- O estudo tem as limitações
inerentes a uma coorte: nenhuma relação causal ou inferência
fisiopatológica pode ser feita, mas apenas especulada. Viéses de
confusão devido a fatores não medidos ou desconhecidos não podem ser
descartados;
- Foram avaliados apenas
indivíduos de meia-idade e idosos com DM2 de longa data, que foram
acompanhados em hospital universitário de atendimento terciário.
Resultados podem não ser generalizáveis para indivíduos mais jovens com
DM2 de início recente ou que estejam sendo tratados na atenção primária;
- Faltaram dados referentes ao
recrutamento dos pacientes, não sendo descritas as perdas;
- Questionou-se a exclusão de
pacientes já com diagnóstico de doença arterial periférica (sem amputação
ou ulceração), os mesmos poderiam ter sido incluídos, e eventualmente até
reforçado o resultado final;
- Estudo até com aplicabilidade
viável na rotina médica, porém com pouco acréscimo no tratamento final do
paciente, visto que estudos recentes têm questionado o uso do AAS no
tratamento de paciente na prevenção primária.
Pílula do Clube: Este estudo
prospectivo, com seguimento mediano de 10 anos, fornece evidências de que um
ITB ≤0,9 está associado a risco aumentado de desfechos cardiovasculares,
mortalidade e desenvolvimento ou piora da neuropatia periférica; e que o ITB
melhora a discriminação de risco para desfechos cardiovasculares.
Discutido no Clube de Revista de 05/11/2018.
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