sábado, 12 de junho de 2021

A Pragmatic, Randomized Clinical Trial of Gestacional Diabetes Screening

 Teresa A. Hillier, Kathryn L. Pedula, Keith K. Ogasawara, Kimberly K. Vesco, Caryn E.S. Oshiro, Suzanne L. Lubarsky, and Jan Van Marter.


    N Engl J Med 2021, 384:895-904

https://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMoa2026028


O diabetes mellitus gestacional (DMG) é uma das complicações mais comuns da gravidez e está associado a riscos maternos e fetais. Não há consenso científico sobre a melhor forma de diagnosticar o DMG: a abordagem em uma etapa é a preferida pela American Diabetes Association, já a American College of Obstetricians and Gynecologists recomenda o uso de abordagem em duas etapas. Cada uma delas tem suas vantagens e desvantagens. O atual ensaio clínico randomizado e pragmático teve como objetivo comparar a abordagem de uma etapa com a abordagem de duas etapas para rastreamento e diagnóstico de diabetes gestacional com relação aos resultados maternos e neonatais.

Eram passíveis de inclusão no estudo mulheres grávidas das regiões Kaiser Permanente Northwest (KPNH) e Hawaii (KPH). Foram incluídas todas as mulheres grávidas que iniciaram cuidados pré-natal na KPNW e KPH durante o período do estudo e não tinham diabetes pré-existente. Foram excluídas aquelas que tiveram aborto espontâneo, gestação múltipla, idade materna < 18 anos, bariátrica anterior, cirurgia, ou mudança de plano de saúde. As participantes foram alocadas numa proporção 1:1, para triagem em uma ou duas etapas em sua primeira consulta pré-natal com uso de um sistema de prontuário eletrônico. O provedor foi notificado dessa designação no prontuário eletrônico quando o rastreamento do DMG estava indicado (entre as semanas 24 e 28) e tanto o provedor quanto a paciente poderiam optar pelo não utilização do método proposto na randomização aleatória. Devido ao desenho pragmático do ensaio, os provedores estavam cientes das atribuições do grupo de ensaio. Já os investigadores estavam cientes apenas sobre os dados de adesão geral, até que todas as mulheres tivessem se submetido à randomização.

O teste de abordagem em uma etapa consistia na administração de glicose 75g em jejum e aferição de glicemia após 2 horas e o diagnóstico de DMG se dava caso a glicose de jejum fosse ≥ 92 mg/dL, ≥ 180 mg/dL em 1h e ≥ 153 mg/dL em 2h. Já a abordagem em duas etapas, contemplava um teste inicial no qual era administrada uma carga de glicose oral de 50g sem necessidade de jejum e aferição glicemia dentro de 1h. Mulheres com nível de glicose ≥ 200 mg/dL neste primeiro teste tinham como diagnóstico DMG sem necessidade de testes adicionais. Já aquelas que tinham testes entre 140 – 200 mg/dL na Kaiser Permanente Hawaii e 130 – 200 mg/dL na Kaiser Permanente Northwest eram submetidas a um segundo teste em que era administrada uma carga de glicose oral de 100g em jejum e verificada glicemia após 3 horas e o diagnóstico de DMG se dava se o nível de glicose em jejum fosse ≥ 95 mg/dL, ≥ 180 mg/dL em 1h, ≥ 155 mg/dL em 2h e ≥ 140 mg/dL em 3h. Os desfechos primários incluíam diagnóstico de DMG, bebês grandes para a idade gestacional, medida composta de resultados perinatais (natimorto, morte neonatal, distocia de ombro, fratura óssea, paralisia de mão ou braço e lesões nervosas), indicação de cesárea, hipertensão gestacional ou pré-eclâmpsia.

Estimou-se originalmente que uma amostra de 17.626 gestantes forneceria 80% de poder para detectar uma diferença relativa entre os grupos de 20% para todos os desfechos primários a um nível de significância bilateral de 0,05. No entanto, na análise de adesão precoce, verificou-se que uma maior porcentagem de mulheres alocadas para receber triagem em uma etapa inicialmente, recebeu a triagem em duas etapas, deste modo foi necessária uma modificação no protocolo do estudo, estendendo a randomização até que o tamanho da amostra adequado para triagem de uma etapa fosse alcançado, também foi necessário incluir novos cálculos estatísticos para contabilizar a não adesão. 

Após exclusões, a população final do estudo incluiu 23.792 gestantes para rastreamento de DMG, destas 94% completaram o screening. Observou-se uma aderência a abordagem de triagem proposta de 66% para o grupo de abordagem em uma etapa e de 92% para o grupo de abordagem em duas etapas. As características da população em estudo foram semelhantes entre os grupos. A maioria das gestantes eram brancas, com média de idade em torno de 29 anos, IMC aproximado de 27. A porcentagem de obesidade gestacional era de 26,6% no grupo de triagem em uma etapa e 27,7% no grupo de abordagem em duas etapas. Cerca de 30% das mulheres em ambos os grupos eram nulíparas, 8% tinha hipertensão prévia, 5% diabetes gestacional prévia e quase metade das mulheres tiveram ganho de peso excessivo durante a gestação.

Em relação aos desfechos primários, observou-se que no grupo de triagem em uma etapa, houve o dobro de diagnóstico de DMG quando comparado ao grupo de triagem em duas etapas (16,5% versus 8,5%). No entanto, as análises por intenção de tratar não demonstraram diferenças significativas entre os grupos para os demais desfechos primários, mesmo após ajustes DMG e covariáveis relacionadas a adesão e peso materno. Quanto aos desfechos secundários e os desfechos de segurança também não houve diferença significativa entre os grupos. No Clube de Revista foram discutidos os seguintes pontos:

  • O fato de o estudo demonstrar que apesar da abordagem em uma etapa diagnosticar o dobro de gestantes com DMG e ainda assim não haver impacto nos desfechos maternos e fetais, nos levou a pensar que, além de não haver diferença entre os dois métodos de triagem, talvez seja apropriada uma flexibilização dos pontos de corte para o diagnóstico de DMG, uma vez que podemos estar superdiagnosticando esta condição e por conseguinte estar gerando tratamentos e acompanhamentos desnecessários;

  • Questionou-se ainda sobre o verdadeiro impacto de tratar o DMG visto o pequeno impacto em desfechos adversos tanto para mãe quanto ao bebê;

  • Observou-se também que a grande maioria das mulheres em estudo eram do grupo étnico branco, o que foi trazido em discussão é que, por este motivo, os resultados do presente estudo não possam ser extrapolados para demais grupos étnicos, bem como para populações com ampla variabilidade étnica como a brasileira por exemplo, pela possibilidade de resultados distintos dos encontrados.


Pílula do Clube: o presente ensaio clínico randomizado e pragmático demonstrou que o método de triagem em uma etapa diagnosticou DMG duas vezes mais do que a abordagem em duas etapas e que, no entanto, não houve diferença nos desfechos materno e fetais entre os grupos.


Discutido no Clube de Revista em 29/03/2021.

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